The Texas Chain Saw Massacre (1974)

de Lara Santos

“My family’s always been in meat.”

O que seria do terror sem ícones como Michael Myers de Halloween (1978), Freddy Krueger de A Nightmare on Elm Street (1984) ou Jason Voorhees de Friday the 13th (1980)? Certamente não seria o êxito que é hoje, e temos de agradecer a The Texas Chain Saw Massacre e ao vilão Leatherface como os pioneiros desta onda de filmes de terror que mudaram o género para sempre.

Com um mísero orçamento de 140 mil dólares, uma câmara de 16mm emprestada e um elenco praticamente desconhecido, Tobe Hooper criou The Texas Chain Saw Massacre, no estival e abrasivo calor de Round Rock, no Texas, fazendo do pouco, o muito.

O clássico do terror segue um grupo de cinco amigos que viaja para o interior do Texas para visitar o túmulo do avô de Sally (Marilyn Burns) e Franklin Hardesty (Paul A. Partain), que acreditam ter sido vandalizado. Após um desvio, os amigos deparam-se com uma sinistra casa, na qual vive Leatherface e a sua lunática família de canibais. Tal como o nome indica, o filme leva-nos numa sufocante e interminável perseguição ao som de uma motosserra, que surgiu como ideia para arma do crime enquanto Hooper estava na seção de materiais de construção de uma loja movimentada, a contemplar sobre como passar rapidamente pela multidão.

Um dos aspetos mais marcantes de The Texas Chain Saw Massacre é a fotografia, edição e construção imagética num todo. O horror e fealdade do enredo não são substantivos que descrevam a aparência do filme, já que a paleta de cores quentes origina imagens fascinantes, além de intensificar a atmosfera tórrida do massacre e do Texas. O começo da história é definido por cenas longas e mais paradas, com shots mais introspetivos, para uma filmagem invulgar, repleta de cortes abruptos e close-ups medonhos que acentuam a desesperança e o delírio das personagens.

A constante filmagem do sol e da lua também contribui para uma beleza característica do filme, funcionando ainda como uma peça importante para a narrativa, dando-lhe uma conotação celestial e astrológica. Pam (Teri McMinn) informa os amigos de que Saturno está em retrógrado, o que, na Astrologia, simboliza um alinhamento desordenado do universo, refletindo que um particular mau dia os aguarda. Assim, esta perspetiva, juntamente com a simbologia espiritual associada às fases da lua e o sol intenso filmado no começo do filme, representam uma desarmonia cósmica que acabou por pressagiar os eventos desastrosos de The Texas Chain Saw Massacre.

Mais do que nunca é necessário ter em consideração o contexto no qual esta obra surgiu. A narrativa não só é baseada nos crimes de Ed Gain, um assassino da década de ’50, como também nasceu de uma profunda desilusão e inconformidade com o contexto político estadunidense dos anos ’70. Hooper foi fortemente inspirado pela cobertura gráfica das notícias neste período em particular, ausente de qualquer sensibilidade. À luz do escândalo de Watergate, da crise do óleo e recessão económica de 1973 e, claro, das atrocidades da guerra no Vietname, The Texas Chain Saw Massacre estabeleceu-se como um grito de revolta, um filme que capturou o horror da época.

Outro aspeto que refuta a condenação de que este clássico é só um filme degradante e incongruente, é a clara e constante crítica à crueldade animal e como tal se manifesta como mais um presságio trágico. A dada altura, o grupo passa por um matadouro de vacas, o que suscita uma grande conversa sobre o tema e, ironicamente, este momento serve como uma excelente reflexão para como, em breve, os amigos irão mimar a posição em que estes animais indefesos se encontram. A dualidade entre o falecimento natural dos animais e a morte brutal com o intuito alimentício, quando comparada com humanos, causa, inevitavelmente, uma aflição agravada, e elucida o horror em The Texas Chain Saw Massacre. Perceber que as personagens são praticamente irrelevantes enquanto pessoas para a história, apenas um meio para um fim corrompido, é apavorante.

No meio de um set de filmagens onde se usaram ossos reais de animais, os atores magoaram-se de facto, e as condições eram deteriorantes graças ao calor insuportável e à carne podre, The Texas Chain Saw Massacre é o terror na sua mais pura forma e solidificou o subgénero slasher, revelando-se até como macabramente engraçado, com várias cenas cómicas na presença de Leatherface e da sua família peculiar e vil.

A atmosfera ressequida e filmagem vanguardista enaltecem o filme, no entanto, o principal terror reside no contexto social em volta do enredo. A nossa sociedade baseia-se em consumir o que percepcionamos como inferior para nos saciar e tirar vantagem dos menos afortunados. Num mundo que perdeu a confiança no governo e, em simultâneo, assistia às notícias fatais sobre a guerra com uma indiferença e apatia arrepiantes, Hooper mostrou que a brutalidade entre os Homens é a maior ameaça de todas. Podemos escapar de monstros, espíritos e vampiros quando desligamos a televisão, mas não conseguimos fugir de nós próprios.

4.5/5
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