Crítica | Eternity (2025)

de João Iria

Quem é a tua eternidade? Quem é a pessoa que queres contigo para sempre? Qual foi o momento onde te sentiste mais feliz? O que é que isso diz acerca da tua vida depois desse instante? São estas questões que perseguem os protagonistas da rom-com Eternity, um filme situado no além – composto como um edifício corporativo – onde depois da tua morte tens uma semana para decidires onde queres passar a tua adquirida imortalidade. Larry (Miles Teller) acabou de falecer e enfrenta imediatamente esta dúvida existencial. O melhor seria aguardar pela sua mulher, que tem cancro terminal, para escolherem uma lugar juntos mas quem sabe quando isso vai acontecer? Dias depois, a sua esposa Joan (Elizabeth Olsen) aparece, pronta para tomar uma decisão até reencontar o seu primeiro marido, Luke (Callum Turner) – que esperou 67 anos pela sua chegada. Primeiro amor ou último amor? Com quem escolhes viver a tua eternidade?

Um dos melhores aspectos de Eternity está na forma como o seu argumento inteligentemente nos coloca na posição de cada uma das suas personagens. Assim, conseguimos compreender as suas experiências individuais, seja a de Joan, Luke ou de Larry, sem julgar as suas atitudes inseguras e desconfiadas ou as suas reacções problemáticas perante esta específica situação. Percebemos o espectro das suas emoções, pensamos no que faríamos nos seus respectivos lugares e reflectimos nas nossas vidas, nas nossas escolhas e no que nos levou até onde estamos agora. Naturalmente, gostarmos dos actores também ajuda a gostarmos das suas figuras e a querermos a sua felicidade. Teller e Turner são charmosos, mas o nosso coração pertence ao sorriso de Elizabeth Olsen. É fácil apaixonarmo-nos pela sua Joan, basta ouvir o seu riso. Sinceramente, 67 anos são aceitáveis para podermos voltar a reunir com o seu olhar. No campo secundário, Da’Vine Joy Randolph (sempre excelente) e John Early – a interpretar guias celestiais – roubam o show com disputas divertidas, sem distrair do drama principal, oferecendo uma leveza essencial para navegar neste paraíso duvidoso.

As perguntas filosóficas são cativantes, por vezes mais do que o próprio filme que centra estas ideias num ambiente de rom-com. Sem querer menosprezar o género – afinal, sou apaixonado por comédias românticas – mas existem limitações narrativas, no seu mundo e na sua exploração destes habitantes, com a intenção de conformar esta experiência para o apetite de uma audiência geral. Eternity evita a escuridão temática que suscita do seu universo e recusa deixar as suas personagens lidarem com aspectos tenebrosos deste horror existencial ou com as consequências das suas acções porque precisa de permanecer agradável para os espectadores que apenas procuram um filme agradável. Para ser justo, Eternity é realmente agradável. Tem uma premissa intrigante, actuações carismáticas, poder emocional e uma banda sonora comovente de David Fleming. É uma história bonita sobre o amor que escolhemos, o que fica connosco e as memórias que moldam a nossa pessoa.

Admito que o filme partilhar a sinopse de uma das minhas obras favoritas, After Life (1998) de Hirokazu Koreeda – uma longa-metragem sobre escolheres uma memória do teu passado para viveres a tua eternidade –, pesa no seu impacto. O facto de David Frayne, realizador e co-argumentista, raramente usufruir deste enredo para ser criativo com as suas imagens – os contrastes coloridos atraentes, juntamente com os seus cenários interessantes, acabam por desvanecer no terceiro acto, perdendo a textura nos seus frames e resultando numa iluminação apagada e desprovida de personalidade, como a maioria dos blockbusters actuais nos serviços de streaming –, impede a longa-metragem de ultrapassar as barreiras autoimpostas pela vontade de satisfazer o público. Imagino como seria a eternidade através de mentes artísticas familiares com o subgénero, como Michel Gondry (Eternal Sunshine of the Spotless Mind, 2004), Cameron Crowe (Jerry Maguire, 1996) ou até a recente Raine Allen Miller (Rye Lane, 2023).

O seu “final feliz” é um sintoma desta descuidada visão cinemática. Eternity tem uma conclusão enternecedora contudo desapontante, que podia funcionar numa comédia romântica banal da Netflix, mas com esta premissa singular acaba por sobressair como narrativamente evasiva e por desfazer a sua jornada dramática, principalmente devido ao subtexto conservador espalhado pelo seu plano final. Um momento climático ainda mais frustrante porque existe um desfecho perfeito para este filme, sinalizado em diversas ocasiões, que seria simultaneamente poético, negro, devastador mas profundamente romântico. A sua necessidade de ser um crowdpleaser ergue uma ponte para os nossos corações mas bloqueia a sua passagem para o céu da sétima arte.

Apesar destes aspectos, permanece uma viagem encantadora e envolvente, com um conceito fascinante. David Frayne pode não ter a capacidade (ainda) de elevar a sua escrita para um mundo cinemático, mas nunca deixa a história ficar perdida no vazio, abrindo espaço para o carisma dos actores dominar o palco com intensas emoções, sightgags divertidos e um triângulo amoroso genuinamente mavioso. A realidade é que Eternity não vai ficar comigo para sempre. Mas não precisa. Porque durante a sua visualização, senti-me feliz. É isso que importa.

3.5/5
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