Crítica | Springsteen: Deliver Me from Nowhere (2025)

Springsteen: Deliver Me from Nowhere é mais um biopic musical que segue, por ordem alfabética, os que foram lançados nos últimos tempos. Num género onde tem sido difícil surpreender, Scott Cooper, realizador e co-argumentista, mantém-se em territórios seguros e aposta na fórmula de A Complete Unknown (2024). Cria um retrato honesto e inesperadamente emotivo de uma das estrelas de rock mais queridas de todos os tempos: Bruce Springsteen.

Baseado no livro escrito por Warren Zane, Deliver Me from Nowhere: The Making of Bruce Springsteen’s Nebraska (2023), descreve os momentos mais negros da vida de Springsteen e a sublimação dessa dor num álbum melancólico que faz um desvio necessário na sua ascensão planetária.

Após o lançamento e digressão de The River (1980-1981), a pressão para aproveitar o embalo gerado pelo seu sucesso começa a aumentar e Bruce, que tem dificuldade em lidar com a ideia de se tornar uma celebridade, decide afastar-se por algum tempo e concentrar-se na música. É nesta sua incursão que nasce Nebraska (1982) e uma das músicas de maior sucesso da carreira do artista – Born in the USA. A divisão entre aquele que é o preço a pagar para alcançar o seu potencial artístico e não largar as suas raízes, torna-se o catalisador para esta história que gira à volta do impacto dos seus traumas na carreira, mas também nas relações pessoais e aquela que tem sido a sua luta contra a depressão.

Os momentos nostálgicos da infância perdida são-nos apresentados de forma muito pouco subtil através de pronunciados flashbacks a preto e branco onde vemos o ambiente de violência e medo onde cresceu nos subúrbios de Nova Jérsia, assombrado por um pai (Stephen Graham) pouco afetivo e com problemas de álcool.

O filme foca-se no muito mais no processo criativo, nos rascunhos e no estúdio caseiro que acaba por improvisar, e menos no palco e nas performances suadas que esperava ver de Jeremy Allen White. A saúde mental de Springsteen é o fio condutor que nos leva não só à bonita relação com o seu manager, Jon Landau, interpretado por Jeremy Strong, mas também pelo caminho para a redenção na relação com o pai num final de puxar à lágrima.

Depois de “Springsteen”, o elenco é o elemento que mais se destaca, com Jeremy Allen White a interpretar o perturbado jovem artista de forma muito convincente mas que, graças ao guarda-roupa, que teve o cuidado de evitar as t-shirts brancas, por pouco, não se confunde com Carmy de The Bear (2022-). Jeremy Strong como Jon Landau entrega, sem falhar, uma excelente prestação, conferindo a esta amizade uma aura de bromance sóbrio, verdadeiro e bom de assistir. Foi interessante ver novamente Stephen Graham como pai, depois de Adolescence (2025), desta vez, num tom completamente diferente, mas onde, mais uma vez, empenha a carga dramática e emocional que a sua personagem exige, desde momentos de crueldade e frieza até um sénior débil e frágil. É apenas atraiçoado pelos prostéticos pois a caracterização utilizada para a sua versão mais velha é tão pronunciada que acaba por parecer que encheu a roupa com almofadas, e para mim foi um grande travão no pico emocional, não fosse eu uma chorona, e seria muito difícil abstrair-me.

Deliver Me from Nowhere falha por não ter uma abordagem mais abrangente à carreira do artista, o que pode fazer com que as expectativas possam sair um pouco furadas para quem não fizer uma pesquisa antes de ir ao cinema. Ainda assim, já admiti que tenho um fraquinho por filmes sobre música e apesar da sua curta amplitude temática e ritmo desacelerado, é muito competente, capaz de satisfazer os fãs e não só.

Para quem não conhece o cantor, para além dos seus hinos de karaoke, este retrato, assim como o álbum Nebraska, que fui ouvir assim que cheguei ao carro, mostra uma versão mais vulnerável escondida por trás do protótipo de ícone americano.

No final, a pergunta que fica no ar é se depois de Bob Dylan, Bob Marley e Bruce Springsteen teremos Paul Mescal a interpretar Bryan Adams, ou está na hora de passar para a próxima letra do abecedário?

3.5/5

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