The Naked Gun (2025)

Os ataques terroristas do dia 11 de Setembro mudaram o mundo. Os Estados Unidos, neste caso o World Trade Center de Nova Iorque, foi a principal vítima, todavia, o restante planeta sentiu os efeitos colaterais. Esta longa-metragem de Oliver Stone pretende colocar álcool na ferida, para poder remediar uma nação enquanto inspeciona os danos psicológicos do–peço desculpa. Crítica errada.

Quando a primeira câmara foi criada, assumo que não tenha sido com a intenção de eventualmente capturar um Liam Neeson a disparar peidos e balas, desesperado por ir à casa de banho. Obrigado, Nicéphore Niépce! Pode parecer irónico, contudo, estou a ser genuíno. O mundo precisa da patetice, precisa gravemente de um ambiente comunitário, onde um grupo de desconhecidos é conectado através da comédia. Compreendo que é fácil ridicularizar esta crença, afinal, certos comediantes encaram os seus 5 minutos no palco como dignos de impactar uma audiência a dar as mãos e a cantar o Kumbaya. Apesar desta pretensiosidade, eu continuo a acreditar no poder do humor como uma forma de expressão artística que evoca a ligação humana, capaz de ajudar a crescer individualmente e como uma sociedade, como também a libertar as frustrações de uma vida exaustiva e injusta. Um remédio que parece desaparecido.

Após serem rejeitados dos cinemas, encontrando uma nova casa na internet e recuperando o seu abandonado sucesso no youtube, os spoof movies regressam ao grande ecrã com The Naked Gun, simultaneamente uma adaptação da série Police Squad! (1982) – uma paródia de narrativas criminais televisivas, liderada por Leslie Nielsen –, e uma sequela de legado da franchise cinemática que despoletou dessa obra cancelada, The Naked Gun: From the Files of Police Squad! (1988), criada pela famosa equipa responsável por Airplane! (1980) – Jerry Zucker, Jim Abrahams e David Zucker.

Esta é – como o filho do falecido detective Frank Drebin (Leslie Nielsen) menciona à fotografia do seu pai – uma nova versão, semelhante ao original em espírito mas com uma identidade própria, por outras palavras: mais um típico reboot em Hollywood. No entanto, a sua equipa criativa realmente comprova essa intenção, com Seth Macfarlane (Family Guy, 2000) na produção e Akiva Schaffer (Popstar: Never Stop Never Stopping, 2016) na realização e como co-argumentista, ambos exibindo carreiras claramente influenciadas pelo estilo de humor tresloucado de ZAZ, todavia, com uma diferente execução do seu absurdismo: Macfarlane com amor por referências, pelo ousado e pelo cruzamento do realismo com o invulgar, e Schaffer, sendo um dos membros do trio The Lonely Island, sem vergonhas do ridículo, vincado na estética satírica e na criatividade audiovisual. Surpreendentemente, funciona. The Naked Gun sucede no seu objectivo, não importa se é uma bala disparada num alvo de dardos, é um tiro certeiro. Finalmente, uma boa paródia nos cinemas!

Aliás, o casting perfeito de Liam Neeson é suficiente para descartar todas as dúvidas acerca deste filme. São carreiras que quase rimam, sendo que Leslie Nielsen começou com obras dramáticas, enredos impetuosos e thrillers vibrantes até adquirir uma nova vida como o rosto deste subgénero de spoof movies; a sua marca de entregar performances sérias em narrativas idiotas é comparável às ocasionais participações de Neeson nas criações de Seth Macfarlane – Ted 2 (2015), A Million Ways to Die in the West (2014) –, que sugeriu o celebrado actor como protagonista desta longa-metragem. Liam Neeson é hilariante precisamente porque actua como se estivesse numa sequela de Taken, recusando-se a imitar o icónico Nielsen, brincando, invés, com a sua famosa intensidade presente nos seus últimos blockbusters.

Seguindo a lógica de From the Files of Police Squad!, esta é uma junção de diferentes histórias, desde noirs a obras de acção, num único filme. The Naked Gun segue o polícia Frank Drebin Jr. (Liam Neeson) – acompanhado por uma esquadra repleta de Juniores, todos filhos das personagens originais –, numa perigosa investigação de um homicídio amarrado a um caso maior (P.L.O.T. device) que pode implicar a destruição do planeta e (ver sinopse de Kingsman, 2014). Com a ajuda da irmã da vítima, Beth Davenport, interpretada por Pamela Anderson – outro casting perfeito –, que salta para o circo em slow motion, recordando a audiência do seu talento natural para comédias, Frank luta para descobrir o culpado e salvar o mundo de outra sequela medíocre de Kingsman. Toda esta informação é irrelevante. Sabemos que o enredo é apenas uma desculpa para piadas, usufruindo dos mais recentes clichés como uma tarte de creme, pronta para ser atirada à cara do cinema policial.

O seu coração bate no tom de uma buzina de palhaço. Schaffer não cria exactamente uma evolução do spoof movie, somente actualizando a história para um mundo moderno e seguindo as temáticas comuns das presentes narrativas criminais, muitas protagonizadas por Liam Neeson, ridicularizando a sua dependência na tecnologia e na cansativa jornada do polícia/detective violentamente a lidar com a sua tristeza. A sua estrutura e os seus elementos técnicos continuam colados ao clássico original então, consequentemente como uma paródia, The Naked Gun vive e morre pelo seu humor. Admitidamente, o seu slapstick tem altos e baixos, os seus chistes sexuais são meros trocos de Austin Powers e as menções dos Black Eyed Peas caem mortas no público como a própria banda. Contudo, o incrível humor visual compensa, invadindo as cenas com deliciosos trocadilhos que suplicam por uma segunda visualização – incluindo os créditos finais repletos de inúmeros detalhes hilariantes que passam despercebidos –, e com divertidos instantes repetidos que convertem pequenas piadas em grandiosas: o copo de café sempre na mão dos seus detectives arranca sempre uma gargalhada.

Por outras palavras, como os habituais filmes deste género, é hit and miss. Ainda assim, o estado actual de comédias no cinema faz deste The Naked Gun um homerun. Espera. Eu não percebo nada de baseball. Vou mudar de analogia. Como os habituais filmes deste género, é hit and miss. Ainda assim, o pobre estado actual de comédias no cinema transforma a nova versão de The Naked Gun num filme milionário, a agraciar o público com enormes gorjetas. Quem quer saber se o bolso está furado e a deixar cair moedas, ou se a carteira está ligeiramente gasta e a precisar de ser substituída? A economia está a ser comida por traças. Aceitamos e desfrutamos do que encontramos na nossa conta. Esta metáfora financeiramente desesperada é apropriada para um crítico português de cinema.

Ajuda que o seu argumento nunca para de disparar piadas, portanto, mesmo quando é vítima de pólvora seca, a seguinte bala mortífera recupera imediatamente o seu ritmo, impedindo o filme de fazer amizade com os grilos. A verdade é que The Naked Gun não precisa de salvar o mundo com a gargalhada ou de revolucionar e evoluir o seu subgénero, pois os risos são constantes e o sorriso é permanente. Nesta nossa presente realidade, eu diria que um simples sorriso carrega o maior valor artístico. Presunçoso? É necessário dar um peido no fim desta frase? The Naked Gun é um comprimido necessário; a oportunidade ideal para regressar ao cinema como uma comunidade, unida pelo ridículo. Sejam piadas inteligentes, burras, novas, velhas, criativas, básicas, ou a visão de um Liam Neeson com caganeira, eu sinto-me agradecido. Este é um filme que compreende o conceito de Never Forget, produzindo um tocante memorial às famosas torres e ao coração americano.

3.5/5

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