Yunan (2025)

de Rafael Félix

O cinema contemplativo, ou slow-cinema se “anglificarmos” a coisa, existe numa corda-bamba muito perigosa entre o que é contemplação e o que é a ausência de movimento narrativo. A subjetividade da interpretação é inevitável, porém há casos mais fáceis que outros de julgar.

Este Yunan, que se foca na viagem de Munir (Georges Khabbaz) – um homem silenciosamente atormentado com sonhos e visões crípticas sobre um conto que a mãe lhe contava na infância – para uma ilha remota sem razões particularmente expressas, é um desses casos.

Muita da realização de Ameer Fakher Eldin foca-se na contenção total de informação. Somos apresentados a Munir enquanto este está a ser examinado aos pulmões – devido às suas constantes crises respiratórias -, que ao que parece estão bem, sugerindo o médico que as suas dificuldades poderão ser do foro mental. Vemo-lo falar, tristemente, ao telefone com a mãe já demente e com dificuldades em reconhecê-lo. Encontramo-lo na cama com a vizinha sem conseguir ser íntimo com ela. Todos estes momentos acontecem com uma economia asfixiante nas palavras, cabendo assim à linguagem visual da câmara de Ronald Plante carregar as angústias de Munir enquanto navega estes deslumbrantes ilhéus à beira de serem inundados.

Só que nem sempre as imagens, ou pelo menos qualquer imagem, chega. Com todo o deslumbrante trabalho fotográfico que apresenta a natureza selvagem desta ilha ou nos períodos em que o filme se fixa na dor do semblante de Munir, Yunan nunca nos permite penetrar esta personagem. A sua contemplação não nos dá material suficiente para sustentar uma relação com os tormentos deste homem. É um filme sobre estar deslocado do mundo, agarrado a um passado e a uma casa que já não se reconhece, mas é demasiado parco em emoções para solicitar à audiência que simplesmente aceite o silêncio da sua personagem central em troca de pouco ou nada. O estoicismo de Khabbaz é cativante, mas insuficiente para um filme que não tem muito para dizer, figurativamente e literalmente.

Nem as suas sequências a tentar misturar a fantasia com a realidade ou a sobrepor o interior da personagem com o meio que a rodeia (esta ilha pode afundar, portanto faça-se as contas com o que Ameer quer dizer) quebram a monotonia em que Yunan se instala, principalmente a caminho de uma fase final que se esforça, nos seus derradeiros momentos, para ser refletida e profunda, mas que, na maior generosidade possível, fica a parecer algo tola e trapalhona. Contemplação pode ser algo belíssimo. A paciência também. Só que há limites para ambas. Limites esses que Yunan lamentavelmente ultrapassa, caindo, com estrondo, da corda.

2/5
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