Woman of the Hour (2024)

de Lara Santos

Woman of the Hour é inspirado num dos mais famosos serial killers que fez parte da lista do FBI dos dez fugitivos mais procurados no início de 1971. Rodney Alcala foi um dos muitos assassinos que assombravam as ruas de Los Angels nos anos ’70 e ’80, desde o “Perseguidor da Noite” ao “Assassino da Autoestrada”, que marcaram uma era aterrorizante para os Estados Unidos da América. Além disso, foi um período definido pelo sexismo e pelo machismo, apesar da segunda onda do feminismo entre os anos ’60 e ’90. Assim, é este o contexto em que Woman of the Hour se insere, um filme que acaba por seguir um caminho simples ao contar uma história que exige maior profundidade.

A estreia de Anna Kendrick como realizadora, segue a própria na interpretação de Sheryl, uma aspirante a atriz que se cruza com Rodney Alcala (Daniel Zovatto), em 1978, num episódio de “The Dating Game” – um famoso programa em formato de blind date, onde, tipicamente, uma mulher solteira fazia perguntas a três candidatos com o intuito de encontrar o seu par ideal. Simultaneamente, o filme alterna entre diferentes anos da década de ’70, seguindo alguns dos diversos crimes que o agora conhecido como The Dating Game Killer cometeu, sendo duas das vítimas Amy (Autumn Best) e Charlie (Kathryn Gallagher).

Woman of the Hour revela-se como uma história leve em comparação com o peso dos eventos reais em que se inspira. Enquanto consegue transmitir de uma forma emotiva a cumplicidade entre mulheres, a misoginia prevalente e a superioridade dos homens, com determinados diálogos excelentes, acaba por não entregar a profundidade emocional e a estrutura narrativa que a história factual merece. O filme brilha em certas cenas soltas mais impactantes, com um silêncio sinistro e planos longos e sombrios, mas, num todo, resulta em algo mais digestível e menos representativo da realidade crua e indigerível.

Um dos pontos mais fracos reside na desorganização narrativa, pelo que, quando não se foca no programa, o filme relega as vítimas de Alcala a flashbaks curtos e cenas apressadas e desordenadas. A sua inclusão podia enriquecer o enredo, contudo, não há um grande desenvolvimento das personagens, o que traz uma sensação de desconexão que agrava a falta de profundidade. A audiência vê a vítima, ela morre, e segue para a cena seguinte, num espaço de poucos minutos. Consequentemente, a narrativa do “The Dating Game” parece independente das outras partes da história, aliado à alternância entre momentos engraçados no programa para atos de violência repentinos, carecendo de consistência. Assim, a falta de tecido conjuntivo entre os eventos dá a impressão de um guião apressado e subdesenvolvido, apesar da sua premissa intrigante.

O maior foco do filme é o programa de televisão em si e o perigo que Sheryl sentiu na presença de Rodney, sem necessariamente aprofundar o caso do assassino, contudo, a sua aparição no “The Dating Game” foi apenas um breve interlúdio e uma agulha no palheiro quando se olha para todo o seu cadastro. De qualquer forma, é esse acontecimento em específico que ocupa um grande espaço na cultura pop como “apelativo”. Não descorando do impacto que a participação de Rodney teve no programa, nem o quão traumático foi para Sheryl descobrir a verdade mais tarde, mas, e também como forma de comover mais a audiência e fazer jus ao caso verídico, poderia ter sido mais relevante ter mais tempo de ecrã das vítimas mortais de Alcala, que tiveram um maior impacto na história, e não tanto da Sheryl. A infeliz realidade é que as mulheres do momento nesta situação, na verdade, foram Amy, que possibilitou colocar o assassino por detrás das barras, ou Charlie, entre outras possíveis centenas.

Contrastando, um aspeto reconfortante em Woman of the Hour é a sua abordagem feminina num tema delicado como este, com certos diálogos e escolhas visuais que remanescem a tal. Optar por ocultar cenas gráficas desnecessárias é aliviante e mostra como é possível utilizar outros métodos para transmitir a mensagem pretendida. No que tange as atuações, são cativantes mas não marcantes. Daniel Zovatto destaca-se ao captar a essência macabra de Alcala e ajuda muito a instalar a sensação de temor e intensidade que falta no filme como um todo. Nicolette Robinson, no papel de Laura, uma personagem fictícia que assistiu às gravações do programa ao vivo, foi uma adição intrigante para expor a indiferença da polícia no caso, pelo que a interpretação da atriz foi convincente e emocional.

Em última análise, Woman of the Hour tem o seu mérito, especialmente como estreia de realização de Anna Kendrick. Um filme visualmente apelativo, que aborda uma história instigante, estimula a reflexão sobre as dinâmicas de poder entre homens e mulheres e pode, de facto, ser muito catártico para várias pessoas, além de ter uma visão feminina necessária para o true crime. No entanto, e de certo modo, falha em capturar a gravidade e as nuances do caso real, optando por uma abordagem mais simplificada.

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