Wolf Man (2025)

de Pedro Ginja

Instinto é a predisposição nata de cada criatura de encadear um conjunto de sequências de acção de forma padronizada, e predefinida. O ser humano, como o único ser racional, consegue, muitas vezes, sobrepor a lógica sobre o instinto, mas acaba sempre refém dos desejos e pulsões animais. Este termo de pulsão, usado por Freud pela primeira vez, e depois rebaptizado como instinto, continua, desde esses primeiros estudos, a ser alvo de um intenso desejo da Humanidade de encontrar explicações.

O cinema, como forma de arte, é mais um dos palcos de investigação e reflexão sobre este tema e os exemplos que o exploram são muitos e variados. Entrando na especificidade do lobo, o fascínio parece transcender de um plano meramente físico para um mais espiritual. Como seria deixar apenas o instinto animal dominar a racionalidade? Render-nos aos nossos desejos mais básicos ignorando as regras e a conduta normal da sociedade. Ou, como tem sido habitual no género de perder o controlo e trucidar todos os que se atravessam no nosso caminho, sem dó nem piedade.

Este Wolf Man de Leigh Whannell parece caminhar entre estes dois mundos, o da discussão do instinto animal e de como ele nos controla e, claro, de deixar uma quantidade substancial de sangue, suor e lágrimas pelo caminho. Consegue-o, em ambos os casos, mas nem sempre mantém a balança equilibrada. No início a aposta é forte na construção de personagens marcantes, facto essencial para um bom filme de terror. Blake, interpretado por Christopher Abbott, é um pai extremoso e carinhoso, em crise profissional e pessoal, mas com claros sinais de traumas passados. Estes traumas têm ligação com a sua infância, passada em ambiente rural no Oregon e que nos é explicada por flashbacks. Com a vida estabelecida na cidade, esta dupla natureza de Blake, parece contida e prestes a explodir, em diversos momentos, mesmo antes da inevitável transformação em lobisomem. Christopher Abbott consegue navegar facilmente entre esta dualidade cidade vs. natureza e racionalidade vs. instinto animal, criando uma personagem fascinante e sempre em conflito permanente, mesmo nos momentos supostamente felizes. Esses momentos são, quase em exclusivo, passados com a sua filha Ginger, interpretada por Matilda Firth. Há uma clara ligação entre ambos e acreditamos neste amor entre pai e filha. Para a mãe, Charlotte, com Julia Garner ao comando, é deixado um papel ingrato, quase uma vilã, incapaz de se ligar à sua família, em particular com a sua filha.

Um evento traumático transporta-os para o meio da natureza e rapidamente coloca de pantanas, o que foi estabelecido com calma e paciência. O lado da acção é exponenciado muito rapidamente, com sequências de violência repentinas quase sem aviso. Quando a viagem parecia estar a construir as personagens da mãe e filha com igual dedicação, toda a atenção passa novamente para Blake e a sua lenta transformação no “monstro”. Este desfasamento acaba por não permitir ao espectador ligar-se às personagens de Matilda Firth e Julia Garner que na parte final do filme parece, inexplicavelmente, mudar a sua personalidade para uma heroína de acção de sangue frio.

A mudança brusca para o género de acção, facto inevitável num filme sobre lobisomens, é potenciado pelo excelente trabalho sonoro e visual no modo como nos mostra, de um modo bastante original, este mundo alternativo de um lobisomem, do seu ponto de vista. A própria transição entre o modo animal e o humano é particularmente impressionante à primeira vista mas acaba por ser usado em demasia e perde-se o impacto desejado. Os efeitos práticos são topo de gama, e usados inteligentemente através close-ups dos braços, pernas ou mãos e, que em conjunto com o já citado design sonoro, revelam uma crueza e naturalidade impressionantes. Os efeitos sobre as unhas são particularmente difíceis de suportar, de tão bons que são.

A banda sonora trabalha em uníssono com o som e reforça este ambiente de terror em que a segunda metade do filme se transforma, com uma boa gestão da tensão sobre o espectador, nunca escolhendo apenas o susto fácil. O problema reside na grande previsibilidade da narrativa, que se torna ainda maior se por acaso já viram o trailer. Uma falha que o cinema actual tende em abusar para chamar o espectador mas que acaba por se tornar contraproducente.

Wolf Man não é especialmente marcante ou distinto na sua abordagem ao mito do lobisomem, mas existem razões suficientes, graças a Christopher Abbott no papel titular, ao excelente trabalho sonoro e da gestão de tensão de qualidade, para lhe dar uma oportunidade de visionamento numa sala de cinema perto de si.

3/5
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