Wicked (2024)

de Mercês Castelo-Branco

“Are people born wicked? Or do they have wickedness thrust upon them?”

Chegou finalmente a altura por que muitos theatre kids esperavam: a estreia da primeira parte de Wicked! Wicked, antes de tudo, é um livro de George Maguire de 1995, com o nome de Wicked: The Life and Times of the Wicked Witch of the West, que posteriormente foi adaptado para musical, em 2003, por um dos grandes compositores da nossa era: Stephen Schwartz (quem ainda não viu o filme de animação The Prince of Egypt (1998), aconselho vivamente, a música é de outro mundo). Nesta adaptação do musical para o cinema, é Jon M. Chu quem toma rédeas do mesmo. Chu já tinha realizado anteriormente outras adaptações de musicais, como In the Heights (2020) de Lin-Manuel Miranda, onde conseguimos notar já no seu estilo uma exuberância e ambição por planos de grandes dimensões, grandes coreografias e pouca utilização de CGI, recorrendo mais a efeitos práticos. A forma como a cor e o movimento são utilizados nesse filme já nos dá uma pequena ideia da sua versão de Wicked, mas, ainda assim, somos impressionados de início ao fim.

Wicked conta a história de origem da Wicked Witch of the West, que no filme The Wizard of Oz (1939) aparece como uma bruxa malvada. Wicked vem de modo a tentar contextualizar os seus motivos e trazer ao de cima o lado mais compassivo do espectador; ver as coisas de outra perspectiva. Neste musical, a história não só anda à volta de Elphaba (a personagem que se torna na Wicked Witch), como de Glinda, que se apresenta como o total contraste de Elphaba. Glinda é uma pessoa que aparenta ser superficial, utilizando a sua aparência para ter aquilo que quer, enquanto Elphaba traz consigo uma bagagem de mau trato e bullying por ter crescido com um tom de pele fora do usual, poderes mágicos que não consegue controlar e um pai que a renegou desde o seu nascimento. O filme explora a dinâmica entre as duas e a forma como uma relação inicialmente áspera se pode tornar numa bonita amizade (pelo menos por enquanto).

É difícil falar deste filme, não só enquanto pessoa que respira musicais, mas enquanto crítica. Wicked faz parte dos clássicos modernos que trouxeram novas pessoas para a comunidade do teatro musical. As expectativas eram enormes antes sequer da sua estreia. Agora, esta adaptação traz consigo mais camadas de sentido e torna-se indicada para a fase em que estamos a viver há algumas décadas: de discriminação, de falsos atos de bondade, de limitações societárias para termos de nos encaixar na caixa “certa”. Wicked é uma experiência fascinante de início ao fim, especialmente se tivermos cientes da pouca quantidade de CGI utilizado e dos cenários luxuosos criados mesmo para o filme, desde a biblioteca da escola de Shiz, à vila dos Munchkins, à Emerald City; são visuais dignos de ficarmos vidrados ao ecrã, boquiabertos. A coreografia, os figurinos, todos os seus aspectos técnicos estão impecáveis, o que nos permite realmente entrar neste mundo tão vibrante como retratado em The Wizard of Oz.

A adaptação da música para o filme, com a sua grandiosa orquestra e as vozes espetaculares do elenco, do qual faz parte Ariana Grande no papel de Glinda, Cynthia Erivo no papel de Elphaba e Jonathan Bailey no papel de Fiyero, o interesse romântico neste triângulo amoroso, é a primeira coisa que nos puxa imediatamente para esta nova versão. As músicas levam-nos a um estado emocional fragilizado, onde algumas lágrimas são vertidas. Isto devido, principalmente, à performance das atrizes que no meio de todos estes cenários surreais e coreografias incríveis, são a cereja no topo do bolo.

Wicked mostra o impacto que uma boa adaptação de um musical icónico da Broadway consegue ter. O mesmo aconteceu com Chicago, um musical que teve a sua estreia em 1975 e a sua adaptação para o cinema em 2002. Na sua adaptação notou-se o respeito pela obra original e uma tentativa em também tornar a experiência de visionamento como se estivéssemos a ver o musical em palco. Nota-se, claramente, com Wicked que esta adaptação foi criada por uma equipa que aprecia e admira o musical original, de tal forma que não só trouxeram a peça para a grande tela como aproveitaram também as novas oportunidades criativas que advêm disso para engradecer e colorir ainda mais esta história e de, certa forma, homenageá-la.

É um filme que ajuda a sarar algumas feridas que têm voltado a estar expostas nestes tempos conturbados e relembra-nos a mantermos fiéis e verdadeiros a nós próprios, por mais sacríficos que tenhamos de fazer para o conseguir. Deixa-me bastante contente que 20 anos mais tarde tenhamos a oportunidade de experienciar um musical tão icónico numa sala de cinema. Por mais live actions e sequelas desnecessárias que estejam a sair, este tipo de adaptações traz-me esperança na magia que perdura em fazer e ver cinema.

4.5/5
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