Una Noche com Adela (2023)

de Pedro Ginja

Todos estamos a um passo da loucura. Para alguns bastaria um pequeno trigger, enquanto para outros seria necessário um acontecimento traumático massivo para despoletar esse evento catastrófico. Geralmente essa loucura, quando associada a um episódio de raiva, é sempre surpreendente para quem a vê de fora. Quantas vezes já não ouvimos nas notícias a frase “Mas era tão calmo e educado. Não estava nada à espera disto.”. Os sinais estão lá mas todos evitam olhar. E se, pensou Hugo Ruíz, estivéssemos lá quando está a acontecer? É essa a premissa deste filme.

Una Noche com Adela (Uma Noite com Adela), de Hugo Ruíz, acompanha Adela (Laura Galán), em tempo real, no dia em que algo quebra. Após o final do seu dia de trabalho duro, na limpeza das ruas de Madrid, um evento singular inicia uma noite de vingança violenta sobre todos os que lhe causaram mal. E ninguém está a salvo da sua raiva avassaladora, alimentada a drogas e a traumas do passado.

O principal cartão de visita deste filme é o uso constante de planos de sequência. Não é apenas um, durante os 105 minutos de duração, mas vários, repartidos em sequências específicas apenas por questões de logística. Isto demonstra, considerando o curto tempo de rodagem, um bom trabalho de realização e de produção, mas tem as suas consequências inevitáveis. As condições de luz são díspares o que torna a fotografia pouco perceptível, principalmente em exteriores. A repetição das mesmas soluções, em cada um dos planos sequências, também não ajuda e acaba por se tornar cansativo. Como é óbvio as implicações na edição são também óbvias porque limitam o que é possível fazer para maximizar a tensão que o argumento sempre procura. A linguagem visual é, aliás, o seu ponto mais fraco sem qualquer identidade ou momento marcante em termos de fotografia.

Laura Galán e a sua interpretação de Adela é, a espaços, brilhante, principalmente quando está sozinha com os seus pensamentos, e em outras ocasiões demasiado exagerada nos trejeitos e expressões usados para revelar a sua loucura. Sabemos do que é capaz, principalmente no seu papel em Cerdita (Porquinha, 2022), em que os momentos de contenção e de explosão demonstram equilíbrio, e que tornou muito fácil torcer pela sua personagem. Em Una Noche com Adela, o espectador vê-se a braços com uma relação de amor-ódio com Adela e não há nada ou ninguém para aliviar essa pressão, pois o filme está totalmente dependente de Laura Galán.

É no argumento e no sentimento de incerteza que cultiva que está a sua maior virtude. É fácil perceber que Adela tem uma raiva borbulhante à flor da pele, mas nunca é claro para onde a vai canalizar. As três grandes sequências do filme estabelecem, sem margens para dúvidas, quem é Adela, mas nada nos prepara para o factor de choque e para os vários twists durante o acto final. Aliás, é esse desafiar constante das nossas expectativas e do destino final reservado para Adela que o salva da mediocridade.

Hugo Ruíz mostra talento na escrita e ambição no que pretende oferecer ao espectador, mas acaba por dar um passo maior que a perna e não consegue transpor, para o que os olhos veem, o mesmo cuidado que teve com a palavra escrita. Assim, temos apenas um filme sofrível e demasiado obcecado com a boa execução técnica do plano sequência e carente dos pormenores e detalhes que o poderiam levar a um patamar mais elevado.

2.5/5
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