Thelma (2024)

de Pedro Ginja

A evolução do tratamento médico permitiu que possamos viver por muito mais tempo quando comparado com o século passado. É por isso inevitável que com o passar dos anos a população mundial caminhe para um envelhecimento cada vez maior e, consequentemente, para um agravar das patologias relacionadas com a idade. Thelma, de Josh Margolin, pega num dos problemas associados com a idade, a dificuldade de lidar com tecnologia e o modo como indivíduos, desprovidos de moral, o podem explorar para benefício próprio, enganando os mais vulneráveis.

Thelma (June Squibb) é viúva e vive sozinha há cerca de 2 anos após a morte do seu marido. O neto, Daniel (Fred Hechinger), visita-a frequentemente por preocupação com o seu bem-estar e para combater a sua solidão. Um dia Thelma é contactada por Daniel a dizer que está preso e necessita de dinheiro de fiança para sair em liberdade. Thelma envia o dinheiro mas rapidamente percebe que foi alvo de uma burla telefónica. Ao perceber que nem as autoridades nem a sua própria família está disposta a recuperar o dinheiro, decide embarcar nesta missão de encontrar os culpados e reaver o que lhe pertença. Com tudo isto, a sua determinação vai ser posta à prova.

Como o próprio Josh Margolin afirmou repetidas vezes, June Squibb era a primeira e única solução possível para o papel de Thelma. Neste filme em específico, esse elogio à actriz reveste-se de uma verdade difícil de negar. Sempre longe do estrelato, e com uma carreira construída de papéis secundários a partir dos idos anos ’90, não é estranha ao anonimato e a passar despercebida, perfeita combinação para encarnar Thelma. Conseguir aos 94 anos o seu primeiro papel principal é, no entanto, uma vitória mais que merecida. Existe uma frescura, determinação e juventude na sua voz, difícil de negar desde os primeiros segundos da história, e que torna esta comédia de acção verdadeiramente encantadora e com muita mais piada que o esperado. Isto é, em grande parte, fruto do constante desafiar de expectativas do que um filme de acção deve ser e de não se levar muito a sério no processo.

O constante piscar de olhos à saga Mission: Impossible (1996 – ), seja através da banda sonora ou das sequências de acção elaboradas, mas adequadas a uma nonagenária, revelam uma inteligência na escrita de Margolin e uma visão refrescante do que a população mais idosa é capaz de fazer, para além do papel invisível a que muitas vezes são vetados. É impossível não torcer para que a viagem de Thelma seja bem sucedida, mas felizmente o foco da história está sempre nas personagens e na sua viagem, nunca no destino final. E ver Richard Roundtree, estrela de Shaft (1971), como Ben, o sidekick de Thelma, é o exemplo de casting perfeito e um perfeito encerramento da sua carreira como actor.

Numa aparente missão impossível no papel, Josh Margolin transforma June Squibb numa heroína de acção improvável mas real e próxima. Aliando a escrita inteligente ao imenso carisma e timing cómico impecável de June Squibb colocam este Thelma como uma das mais inesperadas surpresas vindas do panorama indie americano.

P.S.: Para quando o casting de June Squibb num futuro Mission: Impossible? Um caso a pensar, Sr. Cruise.

3.5/5
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