Se há cada vez mais cinema claramente feito com o lucro em mente, desprovido de qualquer paixão ou força motivadora genuína, pelo menos há também filmes como Theater Camp para equilibrar a balança.
É evidente o carinho, as boas intenções, e o amor intenso pelo mundo do teatro nesta co-estreia de Molly Gordon (atriz de Shiva Baby (2020) e The Bear (2023)) e Nick Lieberman nas cadeiras de realizadores. O casal junta-se aos amigos de longa data Ben Platt e Noah Galvin (co-argumentistas e parte do elenco) para criar um projeto de paixão que homenageia as suas experiências pessoais nas escolas de teatro das suas infâncias.
Gordon e Platt interpretam Rebecca-Diane e Amos, os alunos-tornados-professores de música e representação no campo de férias de teatro AdirondACTS, enquanto Galvin é Glenn, o chefe da equipa técnica com o sonho de subir ao palco. Quando Joan (Amy Sedaris), a fundadora e diretora do campo, tem uma convulsão e fica em coma por tempo indefinido, o seu filho Troy (Jimmy Tatro), um daqueles influenciadores financeiros da web que acha que percebe de empreendedorismo, fica encarregue de salvar a empresa da banca rota. Entretanto, os professores começam a preparar a produção musical anual que será inspirada na história de vida de Joan.
Esta combinação de fatores fornece o pano de fundo cómico para uma auto sátira inteligente que, através do humor e da caricatura, acaba por produzir uma carta de amor aos campos de teatro enquanto espaços de expressão livre e aceitação máxima. Um princípio, meio e fim bem discernidos desde o princípio da história servem como um playground em que cada ator, miúdo ou graúdo, pode dar asas à sua criatividade. O resultado é uma sucessão de episódios hilariantes que nunca se tornam despropositados ou inúteis graças a um bom trabalho de edição e uma base narrativa forte o suficiente para aguentar tanto improviso.
Menos inovador é o formato adotado por Gordon e Lieberman para enquadrar a história, já que Theater Camp é filmado como um mockumentary, um documentário falso no estilo de The Office (2005-2013), I, Tonya (2017), entre muitos outros exemplos. Ainda que repetidamente utilizado dentro da comédia, o mockumentary acaba por encaixar bem, ampliando o caráter insólito e auto irónico do filme. Por ser este o processo criativo adotado, e por reunir pessoas que já trabalham juntas há décadas, Theater Camp tem tanto de genuíno como de encenado, numa mescla perfeitamente adequada ao tópico central (teatro) e ao tom (sátira) do filme.
Claro que Theater Camp foi feito com uma audiência específica em mente. Theater Camp é feito por e para amantes das artes performativas e não apresenta, portanto, uma comédia universal. As referências ao mundo do teatro musical e às personagens (i.e. pessoas-tipo) que o habitam são constantes, obrigando a um conhecimento prévio para que a maioria das piadas tenham impacto. É uma celebração das crianças artísticas, com todos os seus caprichos e pretensões. E como consequência, é também um filme altamente queer, dada a interceção entre o mundo das artes performativas e a comunidade LGBTQIA+.
Ainda assim, qualquer pessoa poderá apreciar a jovialidade deTheater Camp, especialmente porque, apesar da irreverência da sua escrita, acaba por se reger pelos moldes narrativos clássicos de Hollywood, como as boas histórias de redenção, uma satisfatória trajetória de herói, e um apelo à conexão humana e ao trabalho de equipa em prol de um objetivo que nos transcende.
Theater Camp não pretende mudar o mundo ou o meio do cinema, nem muito menos conquistar as bilheteiras ou os Oscars. É apenas um filme (bem) feito por amigos sobre as suas próprias excentricidades e aquilo que mais os move – o teatro.