The Survivor (2022)

de Antony Sousa

Esta é a história de Harry Haft (Ben Foster), um judeu que sobreviveu aos campos de concentração de Auschwitz, e que após a guerra iniciou uma batalha consigo mesmo e com o mundo, no ringue de boxe, para ultrapassar os traumas desse passado que o atormenta, enquanto procurava um amor antigo que sente que ainda não morreu.

Ben Foster é um actor de excelência, apesar de ser dos mais discretos e menos falados dentro da sua geração, e do patamar do seu talento. Para The Survivor o actor norte-americano perdeu 30 quilos em 5 meses, e recuperou-os em 5 semanas para filmar as cenas pós-guerra do filme. Este comprometimento só foi levado ao extremo, porque houve o cuidado particular por se estar a representar uma história de vida real, que de facto existiu. Essa responsabilidade é colocada nos ombros do actor, que corresponde com natural mestria. Todo o restante elenco correspondente à exigência e está em sintonia com o peso da trama, com destaque para Danny DeVito, que tem uma pequena mas carismática participação.

Nos outros departamentos cinematográficos a longa-metragem é maioritariamente muito competente, quer na fotografia, que tem imagens bastante fortes, sobretudo do período passado no campo de concentração, quer na música, edição, ou realização. O argumento é sólido, no entanto nitidamente perde força na segunda metade, perdendo parte do fulgor ganho com as sequências de luta e de Auschwitz. Dá a ideia que não havia necessidade de prolongar o filme para lá das duas horas.

Um drama com esta carga emocional, com uma ligação directa com a segunda guerra mundial, não é fácil de dirigir no sentido do interesse do público pelo protagonista, e pelo seu desfecho. Porque a verdade é que já muito foi dito, escrito e realizado em relação a estas páginas horríveis da humanidade, é difícil surpreender de todo. O trunfo do The Survivor é o subtema presente desde o início, o stress pós-traumático, e o poder de se falar sobre o que nos assombra, ao invés de acumularmos dor e incompreensão por nós mesmos. É um assunto importante, pertinente nos dias de hoje também pelo facto de desconstruir a ideia de vulnerabilidade de um homem. A vulnerabilidade não é sinónimo de fraqueza, pode em muitos contextos ser um sinal de coragem e uma das formas mais eficazes de enfrentar os demónios do passado.

Podemos considerar que este drama oferece precisamente aquilo a que se propõe, sensibilizar-nos para as genuínas marcas que ficam gravadas na mente de quem conseguiu sobreviver no olho do furacão do desumano exército nazi, além de nos oferecer uma história de amor que mais do que romantizar o sentimento, expõe-no num estado realista, que requer trabalho, cuidado e dedicação para perdurar e florescer no tempo. Essa é uma lição sempre útil a retirar, e nesse aspecto variadas vezes não temos o cinema como aliado, já que por norma faz prevalecer o conceito de almas gémeas e destino. O que é certo é que não há relação nenhuma, de qualquer tipo, que sobreviva ao tempo se não for cultivada, e para que valha a pena não precisa de ter obrigatoriamente uma espécie de bênção divina a iluminar um caminho fácil e sem obstáculos. É preciso é que duas pessoas lutem pelo mesmo. E todos neste filme tentaram lutar pelo mesmo objectivo: fazer jus à história de Harry Haft.

3.5/5
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