The Power of The Dog (2021)

de Rafael Félix

É bom ter o cinema de Jane Campion de volta. Mesmo que nem todos os filmes da realizadora neozelandesa sejam um sucesso absoluto – como o delicado mas demasiado melodramático Bright Star (2009) – os seus trabalhos são sempre plenos de emoções capazes de preencher um espectro inteiro e oferecer coisas distintas em cada visualização.

The Power of the Dog vê Jane Campion a regressar a territórios similares a The Piano (1993), ao utilizar as paisagens mais fotogénicas da Nova Zelândia (a fazer de conta que é Montana) como templo do seu novo drama situado junto à fronteira americana, centrado na vida de dois irmãos rancheiros e como a sua relação se transforma após o casamento de George (Jesse Plemons) e a introdução de Rose (Kirsten Dunst) , a esposa, e o seu filho adolescente, Peter (Kodi Smit McPhee), na dinâmica diária deste rancho, especialmente em Phil (Benedict Cumberbatch), o mais velho (e difícil).

À semelhança de outras obras de Jane Campion, é complicado resumir ou fazer uma sinopse de The Power of the Dog porque, apesar do pano-de-fundo sujo, empoeirado e rude, tem uma abordagem muito mais subtil e sensorial que brilha quando deixa a câmara fazer o trabalho em vez da página de guião, que pontualmente parece cair em diálogos demasiado familiares neste tipo de period dramas.

Quando é a câmara de Ari Wegner – também responsável pela beleza de In Fabric (2018) de Peter Strickland e do mais recente Zola (2020) de Janicza Bravo – , e a música de Jonny Greenwood a criar a atmosfera perfeita para exercer toda a intensidade e sensualidade que Jane Campion atribui ao seu cinema, The Power of the Dog distingue-se como um drama sobre repressão sexual (e emocional) e auto-descoberta que se desenvolve num sentido tão cheio de ambiguidades que nos deixa presos ao seu feitiço, ganhando novas formas e sensações quando a nossa memória se demarca dos seus elementos mais comuns e deixa permanecer os momentos mais visualmente tocantes e complexos a nível narrativo.

É um filme que vai buscar a Days of Heaven (1978) alguma inspiração cénica e podem ser tecidas algumas comparações com Brokeback Mountain (2005) – que não lhe fazem a mínima justiça – mas esta longa-metragem de Jane Campion é refrescante e desafiante na forma como aborda as suas temáticas, colocando a brutalidade e sexualidade das suas personagens em primeiro plano e tornando aquilo que podia parecer uma história típica sobre amor proibido em algo muito mais difícil de definir e certamente menos consensual na forma como as suas figuras expressam o seu desejo e crises identitárias.

Assim, depois de 12 anos, Campion regressa triunfantemente com um dos melhores trabalhos de Cumberbatch e Dunst num drama fronteiriço com a sua sensualidade singular e ambiguidade quase mágica que eleva a sua filmografia que parece desafiar constantemente expectativas.

O filme tem distribuição na Netflix, com data de estreia prevista para 1 de Dezembro de 2021.

4/5
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1 comentário

Ju 12 de Setembro, 2021 - 07:04

Bem agora fiquei curiosa. Assim mesmo muito!! Adorei a crítica!

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