Num futuro ao virar da esquina, o mundo abraçou a inteligência artificial e encara aspectos outrora naturais da humanidade, como uma mulher engravidar, ou ter um psicólogo humano, ou ir até uma zona verde para estar em contacto com a natureza, coisas ultrapassadas e até obsoletas. Inseridos nesta realidade estão Rachel (Emilia Clarke) e Alvy (Chiwetel Ejiofor), um jovem casal que está a pensar dar o próximo grande passo de ter um filho. A forma como o vão fazer é que não reúne consenso.
Parece uma premissa curiosa, se bem que em contrapartida com pouca margem para aguentar o nosso interesse durante quase duas horas. E por vezes o que parece… é. Desperta a nossa atenção quando é retratada uma possível projecção da nossa sociedade no futuro, sobretudo sendo essa projecção sustentada em bases firmes do presente. Gradualmente vamos assistindo a uma digitalização das nossas vidas, quanto mais nos for facilitada a vida para nos focarmos em produzir, melhor. É uma chatice ter de tratar da roupa, uma seca tratar das refeições para a semana, frustrante não conseguirmos fazer 4 coisas ao mesmo tempo, tempo esse que é aqui mencionado como figura mística, porque sentimo-lo a passar, mas parece que nunca o temos nem vemos. Em breve fazer o nosso café, mesmo com máquinas que praticamente só nos obrigam a carregar num botão, será antiquado, limpar a casa só para masoquistas e em última instância, residindo aí o cerne da trama do filme, carregar um bebé na própria barriga durante 9 meses e lidar com tudo o que isso acarreta física e mentalmente será encarado como uma perda de… lá está, tempo. Não sabemos se será assim o espelho da nossa evolução enquanto espécie neste planeta, mas The Pod Generation seguramente tem uma opinião clara sobre essa possibilidade.
Assuntos que provocam pensamento e discussão são bem-vindos no mundo das artes, as questões são colocadas e não precisam necessariamente de ser respondidas, cada um pode formular a sua resposta pessoal consoante as suas crenças, influências e princípios. Dito isto, The Pod Generation lança o dilema e finca que a sua opinião consiste em mais do que criticar inteligência artificial, criticar o ser humano por se ter desapegado da Natureza. Em cada cena foi encontrada e procurada a oportunidade para apontar o dedo à desumanização do nosso quotidiano, usando os dois protagonistas como portadores de uma sapiência antiga, apesar das divergências entre si reveladas inicialmente. Os absurdos aparentes de algumas situações podem ser interpretados como um aviso para o que arriscamos a ter como banal dentro de umas décadas. Só assim há verdadeiro sentido para a existência desta história, porque juntando todos os capítulos não podemos propriamente dizer que acontece o suficiente no filme para justificar a sua hora e cinquenta minutos de duração.
Emilia Clarke e Chiwetel Ejiofor, sem surpresas, cumprem na perfeição na dinâmica enquanto casal e no ponto de interrogação virtual que lemos nas suas expressões quando confrontados com a nova robotização na forma de pensar da maior parte das pessoas à sua volta, como que avós a sentir que no seu tempo é que era, as pessoas eram mais sérias e íntegras. Fizeram o possível com o que lhes foi dado, não querendo dizer que o argumento sofre de uma ausência total de momentos divertidos e com substância para os actores desfrutarem. Contudo, foi escasso para o que seria desejável com temas tão fortes e controversos.
Vale pela provocação e análise ao presente tentando antecipar o futuro, pois há profundidade no tópico da incremente falta de empatia e, de certa forma, respeito pela nossa essência, pelas nossas origens. Porém, a falta de ambição de Sophie Barthes (realizadora e argumentista) acaba por retirar impacto numa lição de moral que, porventura dada de forma mais arrojada e subtil, tinha potencial para pôr muita gente a abraçar a primeira árvore que encontrasse e a apreciar as pequenas coisas da vida. É difícil alcançar o equilíbrio perfeito entre o que a tecnologia nos pode oferecer para termos melhor qualidade de vida e o que nos pode subtrair em proactividade, criatividade e, em última instância, humanidade. Talvez não seja o ideal termos uma solução atirada para o colo por uma voz neutra a cada problema que surja no horizonte, ainda assim poderá ser extremista presumir, já que inevitavelmente mais tecnologia significará maior distância com quem somos. No final de contas, dependerá sempre do que estabelecemos como prioritário para nós e de quem nos rodeamos. Ou isso, ou em breve podem consultar um profissional de saúde AI que vos dirá o que fazer. Concluo com uma nota positiva para o departamento de arte do filme, que criou com eficácia cenários futuristas credíveis e sem exageros.