O universo cinemático de Joanna Hogg cresce para novas alturas com o seu novo projeto, The Eternal Daughter, onde a realizadora, essencialmente continua a exploração da sua relação com o ato criativo, desta vez centrando a sua mãe.
Tilda Swinton regressa no papel de Rosalind – a mãe de Julie, nos dois filmes da dupla The Souvenir (2019) e The Souvenir: Part II (2021), mas, desta vez, assume também o papel da própria Julie numa versão mais adulta, substituindo a sua filha Honor Swinton Byrne. Toda esta intertextualidade dentro da trilogia não-oficial de Hogg, baseada tanto nas personagens repetidas, como na escolha do elenco, e na camada meta da relação mãe e filha das duas atrizes principais, vem imbuir The Eternal Daughter dum significado que transcende os seus limites enquanto filme isolado.
Ainda que o cenário ideal para ver este filme seja dentro do contexto dos dois que o precedem, a boa notícia é que a ordem de visionamento não parece ser de todo relevante para o universo que Hogg pretende criar. The Eternal Daughter sobrevive, e inclusive triunfa, na sua forma isolada enquanto um drama familiar elevado por uma aura deslumbrante de mistério e terror Hitchcockiano.
Swinton desdobra-se em mãe e filha, criando duas personagens intrinsecamente conectadas (e não só porque são interpretadas pela mesma atriz), mas ao mesmo tempo perfeitamente distintas. Enquanto espectadores, apenas são precisos alguns minutos para ultrapassar a surpresa que o aparato de ver uma mulher contracenar consigo mesma automaticamente suscita em nós. Depois, o talento vigoroso de Swinton faz o resto do trabalho, instalando a maravilha da ilusão cinemática que nos permite acompanhar Julie e Rosalind na sua viagem melancólica e nostálgica sem questionar o processo que a cria.
Viagem essa que tem como cenário o fictício hotel Moel Famau no País de Gales – em si, uma personagem quase tão importante para o filme como as suas duas protagonistas. As suas vigas, pisos e janelas comunicam com Julie, e as suas salas guardam segredos do passado que só elas realmente conhecem.
A estética visual expressionista de The Eternal Daughter, assim como a sua banda sonora, transformam um filme incrivelmente moderno – Lynchiano nas suas técnicas narrativas – num artefacto atemporal, colhido de uma década qualquer, ou de todas elas ao mesmo tempo. A sua temática tem um caráter igualmente universal, analisando tópicos que já nos afetaram a todos a dada altura, desde a índole tão específica da nossa relação com as nossas mães, a sentimentos como a frustração artística, a perda, e o isolamento.
No meio de todos estes gigantes compromissos e exercícios autorreflexivos, há um cachorro chamado Louis que fez até esta escritora, conhecida pela sua aversão à ideia de ter animais dentro de casa, querer arranjar um cão.