Terra sem luz, cinzenta e distópica. Essa terra é a Avalonia. Contudo, esta cidade reergue-se das cinzas com a descoberta da Pando, a energia verde cintilante que vem não só iluminar a vida dos seus habitantes ao retirá-los da solidão em que se encontravam, como também volve às suas vidas a funcionalidade de uma vida quotidiana banal. Não obstante, Strange World apresenta a possibilidade do inconcebível: e se a luz acaba? Eis o problema que as personagens irão tentar resolver ao longo do filme, embrenhadas em múltiplas peripécias repletas de cor e humor.
Searcher Clade (VO: Jake Gyllenhaal/VP: Gonçalo Carvalho) é um agricultor singelo que vive uma vida pacata na sua quinta, com a sua mulher, Meridian Clade (V.O. Gabrielle Union/V.P. Cláudia Soares), e o seu filho, Ethan Clade (V.O. Jaboukie Young-White/V.P. Tomás Garcez), a plantar Pando. No entanto, Callisto Mal (V.O. Lucy Liu/V.P. Cláudia Vieira) surge e afirma haver um problema com a planta que só será passível de ser resolvido com o contributo de Searcher. Com efeito, todos embarcam numa aventura cujo objetivo será o de salvar o elixir da Avalonia, mas não só… Don Hall adensa a narrativa ao trazer outros temas para cima da mesa neste filme de animação, tais como as quezílias familiares, a diversidade ambiental e as consequências da antropia; a importância da cooperação, e a aceitação natural da orientação sexual, incitando a uma reflexão sobre estes assuntos sem abdicar da comicidade.
As contendas na linhagem Clade, principalmente entre o patriarca da família, Jaeger Clade (V.O. Dennis Quaid/V.P. Rui Quintas), e o seu filho e, por sua vez, entre Ethan e o seu pai são a catapulta iminente à metamorfose sentimental que impactará todos sem exceção. A transmutação de caráter emocional visa a completude das personagens que é dupla: concernente à sua realização pessoal em concomitância e reciprocidade com a anuência da concretização individual dos seus familiares. No início do filme, Jaeger é extremamente tenaz, autocentrado e egocêntrico, mas sente que foi abandonado por quem mais amava, pois não o acompanharam na crença dos seus ideais mais queridos; Searcher sente-se realizado com a vida que tem, agora livre das amarras que o seu pai lhe tinha colocado, na medida em que queria que ele vivesse a vida à sua semelhança e, por fim, Ethan sente-se sozinho, irrealizado, pois não se revê no que o seu pai sonhou para ele, deseja explorar o mundo e transpor os limites da sua casa… Todos estes estados de espírito sofrem alterações determinantes ao longo do filme.
Aliás, saliento que o espírito explorador próprio, mas também inato de um adolescente, mesclado com a credulidade ingénua de Ethan, é o que considero mais pertinente na animação, dado que é através da personagem que acedemos a cenários e hipóteses inalcançáveis pelos olhos dos adultos graças à sua obcecação, talvez também congénita. A cosmovisão do jovem é oposta à mundividência dos adultos, nomeadamente à do seu pai e à do seu avô, que é sempre pautada por vilões, bichos, enfim, entes, a destruir e combater, ao passo que Ethan quer é observar e conviver com esses vilões, bichos e entes, almejando uma coexistência harmoniosa.
Todavia, o título do filme não faz jus à sua multiplicidade de temáticas, isto é, não pressupõe grande parte do que vai acontecer, o que até pode ser bom, mas neste caso não é, pois, o foco nas matérias que mencionei é manifesto e o título é redutor ao não ter este aspeto em consideração o que pode afastar o que seriam potenciais espectadores. Strange World remete para um cosmos de aventura, mas não para desfechos emocionais nas várias gerações dos Clade.
A luz volta? Ou a Avalonia voltará inelutavelmente ao isolamento? Isso não é o mais relevante, ainda que aparentemente seja apresentado como o problema principal do filme. Strange World abre portas para um universo policrómico em que os desenlaces emocionais entre Jaeger, Seacher e Ethan superam qualquer conquista material e somente pessoal.
1 comentário
[…] O grande destaque do segundo dia da convenção foi Alan Tudyk, ator veterano que já emprestou a sua voz a uma lista de personagens icónicas. O seu começo foi no teatro, onde acabou por ser descoberto pela Disney que lhe ofereceu um papel em Ice Age. A partir daí, as ofertas continuaram a surgir, resultando numa carreira extensa, ainda que inesperada, no mundo da animação, cujo mais recente projeto foi Strange World. […]