Aconteceu nos passados dias 18 e 19 de outubro de 2024, em Lisboa, a primeira edição do Tribeca Festival Lisboa, que trouxe, desde o famoso bairro de Nova Iorque até ao Beato, os maiores nomes do talento norte-americano para conversas inéditas e estreias exclusivas de cinema e televisão. Uma segunda edição já está assegurada, confirmou o CEO do Grupo Impresa, Francisco Pedro Balsemão, durante o evento.
Ao longo de dois dias, os visitantes do festival puderam usufruir de estruturas e redes de talentos “emprestadas” do festival original, que nasceu nos Estados Unidos em 2002, no rescaldo do 11 de setembro, pelas mãos e mentes de Robert De Niro, Jane Rosenthal e Craig Hatkoff. O lendário ator e a prolífica produtora também marcaram presença em Lisboa, juntamente com “amigos” do festival, como o produtor Jon Kilik (Bronx Tale, The Hunger Games) e os atores Whoopi Goldberg, Chazz Palminteri, e Griffin Dunne.
A programação cinemática, que incluiu mais de 20 horas de filmes e séries, combinou antestreias nacionais com títulos que passaram pelo Tribeca “original” em junho, bem como por outros festivais internacionais de renome. Destaque para Anora de Sean Baker, vencedor do Palme d’Or em Cannes e um dos filmes mais falados de 2024, mas também para Griffin in Summer de Nicholas Colia, Group Therapy de Neil Berkeley, Ezra de Tony Goldwyn e Jazzy de Morrisa Maltz.
No panorama doméstico, quem passou pelo Beato Innovation District pôde presenciar os primeiros visionamentos da série da OPTO de Pedro Varela, Azul, e Silence de Francisco Froes com Sara Sampaio e Rafael Morais, ou revisitar produções que já passaram pelas salas de cinema do país como Podia Ter Esperado Por Agosto e Chuva de Verão.
Durante estas sessões, juntaram-se, em múltiplos palcos, líderes da indústria do audiovisual para conversas, podcasts ao vivo e debates, tanto sobre os temas mais pertinentes da atualidade, como os mais intemporais, desde a representação aos desafios na distribuição na era do streaming. As duplas e grupos improváveis, mas bem escolhidos, incluíram Whoopi Goldberg com Ricardo Araújo Pereira ou Dino D’Santiago, Joaquim de Almeida com Francisco Froes, e Patty Jenkins (Monster, Wonder Woman) com Diogo Brito e Jon Kilik. Houve ainda tempo para terminar o dia com música ao vivo de grandes artistas portugueses.
No recinto, viveu-se um ambiente particular que ocupou um lugar ambíguo entre a cinefilia típica de festivais de cinema, o empreendedorismo e a preocupação com as trends de eventos estilo WebSummit, e a paixão e dedicação próprias de convenções de fãs como a Comic Con.
Seguindo a tendência começada pelo festival “pai” que, em 2021, numa viragem para o mundo do entretenimento e dos multimédia, retirou a palavra “film” do seu nome, a SIC e a OPTO optaram por um formato híbrido com o intuito de vender as qualidades da cidade de Lisboa enquanto centro de criatividade e inovação, passando muito pela promoção do trabalho e do talento nacionais – uma abertura que permitirá, certamente, continuar a apontar os holofotes de Hollywood e do mundo sobre a capital portuguesa. Ainda assim, é importante que o Tribeca Festival Lisboa procure refinar a sua missão e as suas intenções, mantendo sempre o foco no crescimento da indústria audiovisual nacional através da mais-valia que é a possibilidade de coproduções internacionais proporcionada pela relação única com o Tribeca de Nova Iorque, não perdendo, no entanto, as preocupações que teve este ano, como a Interpretação de Língua Gestual nas apresentações ao longo do festival.
Ainda que grande parte das conversas e palestras tenham tocado em tópicos relacionados com o cinema, a experiência de assistir cinema em si, considerada sagrada pelo tipo de público que se esperava que o Tribeca privilegiasse, foi, em tudo, um “after thought” neste festival. Começando pela escolha de recinto que não contava com uma única sala de cinema, optando antes por colocar filas limitadas de cadeiras dobráveis em salas ora desconfortavelmente abafadas, ora com pouco isolamento sonoro. Para Ezra, o único filme do festival que contava com Robert De Niro no elenco e no Q&A pós-filme, formaram-se filas de pessoas de vários metros que foram, eventualmente, sentadas em cadeiras nas laterais, no chão ou até convidadas a ficar de pé, com uma visão atrapalhada por colunas e cabeças.
Quem tiver planos de participar no Tribeca Festival Lisboa em 2025 não espere um festival (só) de cinema, até porque o festival nova iorquino que lhe deu nome também há alguns anos deixou de o ser. Ainda assim, a combinação entre formatos e a aproximação das realidades completamente distintas que são a americana e a portuguesa, não deixaram de ser atraentes para quem se interessa pelo mundo do entretenimento, de uma forma mais geral. Já a oferta cinemática, ainda que reduzida e projetada de forma pouco satisfatória, não deixou de exibir o selo de qualidade de uma marca tão reconhecida como o Tribeca, tendo sido, a todo o momento, acompanhada por um programa rico e incrivelmente preenchido de produções nacionais e painéis que dificilmente se repetirão.
Foi uma produção ambiciosa dentro do panorama nacional que teria beneficiado de melhores condições e de uma visão mais clara sobre os seus objetivos e público-alvo. Um ano será, esperamos, suficiente para repensar o âmbito do evento e relembrar a importância do cinema na sua origem e sucesso. Francisco Pedro Balsemão não avançou, ainda, datas ou localização previstas para a segunda ronda de Tribeca Festival Lisboa, mas a antecipação já é muita.