Peaky Blinders (2013-2022)

de Guilherme Teixeira

Após servir o exército inglês durante a Primeira Guerra Mundial, Tommy Shelby (Cillian Murphy) e os seus irmãos voltam a Birmingham, prontos para estabelecer o controlo na cidade, através do seu gangue Peaky Blinders. Porém, o império dos Shelby’s começa a crescer além das fronteiras de Birmingham, originando vários conflitos dentro da família e contra todos aqueles que pretendem ocupar o seu lugar tanto no mundo do crime, como no mundo da política.

Criado por Steven Knight, esta é uma série bastante estilizada, principalmente na fotografia e no design de produção. A paleta de cores, apesar de variar entre os gangues, nunca foge do tom fúnebre, com uma predominância no cinza e preto. O caos é constantemente representado na ambientação, como no barulho da maquinaria a trabalhar e no aspeto da cidade, que faz o final da queima das fitas parecer o lugar mais esterilizado do mundo. Estes aspetos criam um ótimo contraste com o guarda-roupa e os cabelos cuidados dos membros de Peaky Blinders.

Os visuais desta série seguem o tom negro dos episódios e o seu crescimento narrativo. As duas primeiras temporadas focam-se na dinâmica dentro da família Shelby e o seu amadurecimento no mundo do crime. A expansão dos Peaky Blinders atrai a atenção de dois chefes de famílias, Billy Kimber (Charlie Creed-Miles) e Darby Sabini (Noah Taylor), e de um inspetor, Campbell (Sam Neill), que procura investigar armas roubadas e, a cargo de Churchill, apagar os gangues, soldados do IRA (Exército Republicano Irlandês) e alguns comunistas.

Após estabelecer os elementos principais, a série ganha outro ímpeto nas seguintes temporadas, com a aparição de novos inimigos vingativos e com a viagem de Tommy como protagonista, cujas ambições conquistam novas dimensões e um novo significado. A criação de novas alianças políticas revelam os antagonistas mais perigosos desta série: Oswald Mosley (Sam Claflin) e Jack Nelson (James Frecheville), que apresentam um nível intelectual manipulador e ameaçador semelhante a Tommy. A interação entre estas personagens é verdadeiramente memorável, com diálogos afinados e atuações extraordinárias que conseguem levar a história avante.

O trabalho de escrita nas personagens eleva emocionalmente o seu argumento pois as ações destas repercutem-se pela família inteira. Por exemplo, Arthur Shelby (Paul Anderson), o irmão mais velho, é pintado, numa fase inicial, como um louco incontrolável, porém, a energia do louco foi sendo sugada com o passar do tempo, atribuindo um peso emocional enorme à série. Personagens como esta criam momentos bastante pesados, que são encaixados em pontos-chave na série, de forma a dar a ilusão que cada avanço representa um retrocesso.

Mesmo quando certas personagens acabam por não conseguir entregar o que prometiam, como o filho da matriarca da família Shelby, Michael (Finn Cole), a série consegue compensar nos seus diálogos enriquecedores. É precisamente isso que torna Peaky Blinders verdadeiramente especial; a forma como faz o público sentir a importância de todas as cenas e todas as palavras.

Como protagonista, Tommy é fascinante. A sua ambição começa como uma mera busca por poder e por considerar que o seu país nunca entregou aquilo que devia pelos seus anos em batalha. No progresso desta história, as suas perdas insuportáveis abrem feridas do passado, nomeadamente, o seu tempo em França, e arrefecem aquele projeto de ser humano que estava a ser recriado quando conheceu a sua paixão, Grace (Annabelle Wallis). Nesta guerra com a sua humanidade, personagens como Ada Shelby (Sophie Rundle) e Lizzie Stark (Natasha O’Keeffe) acabam por ganhar mais espaço na série, com um importante papel de relembrar a humanidade de Tommy e servir como apoio emocional para o protagonista, mesmo sofrendo com a frustração acumulada de saberem que aquela vida não parece ter fim. Eventualmente, o verdadeiro conflito para Tommy é encontrar um desafio que o derrote, enquanto tenta lucrar o suficiente para ocupar aquele buraco negro que foi acumulando. Uma pessoa com vontade de perder mas que não quer deixar de ganhar, Tommy Shelby é, sem dúvida, uma das personagens mais interessantes de acompanhar na tela. Durante seis temporadas, o público vai conhecendo este protagonista, de poucas palavras, através de olhares e do seu silêncio. Principalmente devido ao talento de Cillian Murphy, que consegue ser bastante expressivo com poucos movimentos.

Peaky Blinders é uma verdadeira lufada de ar fresco, neste género. Tem uma história cativante que envolve traições, buscas por poder, e arcos narrativos, com o tempo necessário para serem desenvolvidos, que enriquecem a história. Esta produção conseguiu, ao longo dos anos, deixar uma imagem de marca. Porém, a verdadeira força desta série reside na sua exploração das consequências mentais da guerra, da ganância; nos efeitos nefastos da ambição desmedida e nas consequências do luto, sobretudo, no vazio que é criado quando se perde alguém que foi fulcral em ajudar uma pessoa perdida a reencontrar-se.

5/5
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