Natal banal que o Bruno leva a mal
Depois do merecido sucesso da sua primeira aventura na sétima arte, não é surpresa para ninguém que tenha sido criado mais um filme com Bruno Aleixo e amigos, capitalizando no sucesso nacional, e até além oceano, que este grupo tem recebido ao longo dos anos, e principalmente aquando da referida primeira estreia. A questão que fica é se desta vez a passagem é tão suave como foi no passado.
A premissa desta nova longa-metragem apresenta um Bruno em preparações natalícias e que se revela como um ávido não-apreciador desta festividade. No entanto, uns dias antes da mesma, sofre um acidente de viação, juntamente com o seu amigo, Homem do Bussaco, entrando em coma profundo. Desta forma, o enredo principal assenta-se nas tentativas de acordar Bruno deste estado inconsciente, revivendo as memórias de Natais passados do mesmo, em busca da razão por trás do ódio de estimação que ele tem por esta época.
É necessária uma constante referência ao anterior filme, para se perceber os pontos que levaram O Filme do Bruno Aleixo (2020) a funcionar tão bem e que poderiam ter ajudado a sua sequela a continuar essa boa energia. Não se pode deixar de louvar a abordagem que os realizadores, João Moreira e Pedro Santo, tiveram em relação à primeira longa-metragem: usaram o conceito de conceber uma ideia para um filme do Bruno Aleixo como o enredo principal do próprio filme, colocando as famosas personagens a resolver essa mesma questão, numa espécie de receita de meta-cinema simples e básico, que encaixa na perfeição com a origem de sketch comedy deste grupo disfuncional. Desta forma, o filme funciona como um todo na sua narrativa principal de procurar uma maneira de trazer Bruno e amigos ao grande ecrã, bem como em fragmentos, fazendo sketches que representam as ideias que os personagens atiram para cima da mesa e explorando assim vários géneros e cenários clássicos da sétima arte.
Contrariamente ao que o primeiro filme fez, O Natal do Bruno Aleixo acaba por não se suportar de forma tão segura pois falha em conseguir uma premissa principal que sustente todos os sketches apresentados de forma coesa e, principalmente, cativante. Passamos o tempo entre segmentos a regressar a um cenário de hospital com duas ou três personagens a conversar e simplesmente a preparar a próxima memória natalícia de Bruno a ser explorada como um sketch cómico. É uma abordagem que funciona perfeitamente num formato televisivo ao estilo das séries anteriores do mesmo protagonista, mas que não se sustenta numa narrativa fílmica de hora e meia.
A salvação, e até mesmo atração, deste filme é o reconhecível carisma de Aleixo e amigos, que brilham nas suas já naturais interações entre eles próprios e o mundo em que vivem. Este grupo é dotado de uma perspectiva rudimentar e quase retrógrada de cada um dos seus membros em relação a qualquer tema ou assunto apresentado. São, no entanto, pontos de vista que nunca sequer roçam o desconfortável, por isso deixam sempre espaço para que o espectador se possa rir destas personagens e das suas reações e decisões questionáveis, mas inofensivas. Aliás, muitas das possíveis gargalhadas ou pelo menos sorrisos que o filme possa trazer, vêm de um certo julgamento aos protagonistas e às situações em que se colocam, tudo de forma jovial e desprovida de culpa. O filme mantém-se interessante graças à curiosidade para saber o que Bruno e os seus amigos vão fazer ou dizer em relação a uma situação específica.
No mesmo seguimento, o facto de ser estruturado em segmentos, dá asas para que a equipa criativa do filme consiga experimentar com os vários tipos de animação que dão cor às memórias dos Natais passados do Bruno. Existe um pouco de tudo, desde estilos que remetem a desenhos animados clássicos, até animações que roçam um 3D computorizado, mas sem nunca perder uma espécie de aura rudimentar que anda de mão dada com a alma velha do Bruno. Esta decisão de apresentar as lembranças em forma de animação permite uma lufada de criatividade visual que se alimenta do guião e que peca apenas por involuntariamente apontar uma luz à falta dessa mesma criatividade na filmagem das cenas mais “live-action” do presente, que nada mais parecem do que enquadradas e iluminadas para um sketch show na televisão.
Este é um filme que consegue entreter e até fazer rir graças às suas personagens e à relação simbiótica que têm com os seus criadores, permitindo que tudo seja natural como se de pessoas vivas e autónomas se tratassem. É, também, um filme que mostra a força dos autores para escrever sketches que se mantém fiéis à sua estrutura, mesmo explorando diferentes conceitos, mas que também mostra as falhas que possuem em escrever para cinema, sem o apoio de uma ideia simples e genial, como a do primeiro filme, para suportar o peso de uma longa-metragem. Fica uma palavra de apreço ao Bruno, ao Homem do Bussaco, ao Busto e ao Renato, para que tenham Boas Festas e que regressem mais estranhos do que nunca.