Navalny, documentário nomeado nessa mesma categoria pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas nos Oscars de 2023, acompanha a tentativa de assassinato do líder da oposição russo, Alexei Navalny, e a subsequente investigação durante o período em que o inimigo número um de Putin passou em Berlim para recuperar e assim poder voltar para casa.
Ironicamente, apesar de Navalny dar o nome ao documentário, pouco aprendemos sobre esta figura política, pelo menos num aspeto mais pessoal. O que acompanhamos é só e simplesmente a figura, andando muito em volta do carisma e daquilo que atrai o público para esta pessoa e as suas posições em relação a momentos chave da política interna e externa. O filme em momento algum deixa assim tão claro se quem vemos é a pessoa em si, ou apenas uma persona como tantas figuras políticas que se veem por aí.
Talvez isso tenha sido uma forma quase implícita de nos dizer que a cara corresponde com a careta, mas ficava mais bonito se tivessem explorado ou, pelo menos, aprofundado um pouco mais. Porém, fazendo agora de advogado do diabo, apesar do título sugerir o contrário, o filme não se propõe exatamente a explorar Navalny, mas sim através dele explorar os meandros do autoritarismo institucionalizado na Rússia e, assim, o perigo que qualquer opositor político enfrenta. Partindo daqui, percebe-se o porquê dessa falta de desenvolvimento, pois, mesmo concentrando-se numa só pessoa, focar-se unicamente nela e não nos acontecimentos ao redor, poderia dar um ar de algo pessoal, quando de facto não o é. Afinal, não é como se todos já não estivéssemos cientes dos problemas crónicos que os russos têm com escadas e janelas. Assim, o filme prefere focar-se naquilo que tem para dizer relativamente ao estado/Estado das coisas e deixar a audiência simpatizar ou não com a figura retratada.
O filme foge um pouco das críticas que se tem feito a Navalny, nomeadamente, da sua associação com grupos de extrema-direita, e, apesar do documentário ter um claro viés a seu favor, – o que não é necessariamente mau desde que sustentado, o que é o caso – trata desse assunto com alguma justeza. A justificação que Navalny dá é mais do que adequada, tendo em conta que quando se combate um Estado com um historial tão marcante como o visado, a regra do “inimigo do meu inimigo é meu amigo” não é apenas uma opção válida, mas quase uma necessidade.
A investigação é quase como uma peça de horror misturada com comédia. “Terrir”, como se diz na gíria popular, na medida em que é tenebroso o facto de já aqui ao lado termos alguém que manda assassinar opositores políticos, apenas porque têm opiniões dissidentes e que ameaçam o status quo e, ao mesmo tempo, dá vontade de rir ao ver-se a sonsice de Putin na forma como monta os seus esquemas de corrupção e na forma mais do que ultrapassada de eliminar os opositores políticos, sendo esta por envenenamento através de químicos produzidos em fábricas que são descaradamente de fachada, que custa a acreditar que é algo feito sobre o manto de uma das maiores potências a nível mundial. É uma sonsice de um tamanho tal, que só mesmo visto porque contado até parece uma piada de mau gosto.
Navalny é um documentário bastante assertivo e interessante, que investiga a corrupção e o autoritarismo enraizados no Estado Russo e o perigo que pessoas com opiniões dissidentes correm, independentemente da idade, popularidade e localização geográfica.