Seres humanos a querer investir em inteligência artificial e subir na carreira à custa de robôs que se apercebem do seu potencial e assumem-se como um risco à nossa segurança mais cedo ou mais tarde. Onde é que já vimos isto? Em muitos filmes. Há algumas nuances diferentes em M3gan, mas não altera assim tanto a fórmula IA cinematográfica.
Quando Gemma (Allison Williams) se torna na encarregada de educação de Cady (Violet McGraw), a sua sobrinha, tudo muda. Habituada a ter o trabalho como prioridade, terá agora que encontrar o equilíbrio entre a paixão pela sua profissão, e a responsabilidade de educar uma criança. Na tentativa de juntar o útil ao agradável, cria uma boneca que aparentemente resolve todas as dificuldades parentais, e ao mesmo tempo a transporta para um patamar de enorme sucesso profissionalmente. Só que M3gan (Amie Donald) tem uma palavra a dizer quanto aos planos de Gemma.
Uma história de James Wan costuma agregar razões suficientes de interesse para qualquer amante do género de terror, e M3gan inclui um crédito para Wan no que respeita à história original, sendo o argumento assinado por Akela Cooper. Esta parceria já resultou no louco Malignant (2021), e agora procuraram transmitir o mesmo arrojo neste filme, porém não se pode dizer que tenham ido tão longe sob a realização de Gerard Johnstone.
Todos nos lembramos de Chucky, personagem icónica no terror televisivo e cinematográfico. Um boneco maléfico e à primeira vista inofensivo, que inferniza a vida das pessoas que têm a infelicidade de cruzarem o seu caminho. M3gan tem nitidamente influências do clássico boneco, no humor que procuram explorar em algumas cenas, e nas expressões da boneca. Mas acabam aí as semelhanças. M3gan é uma boneca de inteligência artificial que não recebe monitorização suficiente para entender a barreira entre o certo e o errado, e não vê razões para hesitar nos meios que usa para atingir os fins para os quais foi programada. Gemma acumula a responsabilidade pela pequena Cady com a responsabilidade pelo crescimento na autonomia desgovernada da personagem interpretada Amie Donald.
Há questões que o filme coloca que são bastante pertinentes: para onde caminhamos na educação que damos às crianças de hoje? Até que ponto pode ser prejudicial para o crescimento de uma criança o uso excessivo de tecnologia? Estaremos a alimentar muito cedo a semente do vício através de brinquedos virtuais? As novas gerações serão demasiado protegidas física e emocionalmente? E até se não estaremos demasiado dependentes de tecnologia no nosso dia a dia. É possível pensar em tudo isto ao longo do enredo, mesmo num cenário de previsibilidade e até banalidade na maioria dos momentos com intenção de assustar ou de nos fazer esconder todos os bonecos que tenham um ar mais ameaçador nas nossas casas. E essa é uma força de qualquer história de qualquer género, deixar questões no ar depois do seu final.
Esqueçam a parte de terror, jumpscares e unhas roídas. Não esperem gore porque está classificado como PG-13, e não ameaça ser mais do que isso. Não tem nenhum twist memorável, nem nos introduz para uma personagem que tenha vindo para ficar. E também não tem nenhuma performance especialmente inspirada, além de não ter nenhuma personagem secundária que se desenvolva minimamente até ao fim.
Allison Williams deixa sempre um carimbo de qualidade, mas neste caso ninguém brilha particularmente, nem mesmo a relação tia-sobrinha, que nunca convence verdadeiramente. Mas M3gan tem o mérito de tocar em assuntos de primeira importância na actualidade e de nos fazer olhar para as nossas próprias prioridades. Deixa um sentimento agridoce.
1 comentário
Concordo inteiramente!