Los Cronocrímenes (2007)

de Sara Ló

As viagens no tempo são um dos assuntos mais interessantes do universo da ficção científica. Desde a saga Back to the Future (1985-1990), 12 Monkeys (1995), The Butterfly Effect (2004), Predestination (2014), Primer (2004), ou até About Time (2013), existem time travels de todos os feitios e para todos os gostos, que apresentam diferentes regras para os seus saltos temporais, deixando o espectador escolher qual a teoria que acredita ser mais fidedigna de efectivamente acontecer. Apesar das suas diferenças nos detalhes, algo tipicamente comum neste género de filmes, e um dos conceitos mais confusos mas mais fascinantes quando bem explorado, é o próprio paradoxo temporal que ocorre nas ditas viagens. Simplificando, esta concepção de ciclos de eventos que decorreram no passado que moldam o futuro e/ou vice-versa, acaba muitas vezes por criar um verdadeiro nó na cabeça do público sem nunca o demover da curiosidade que tal conceito suscita. São estas teorias de correntes de interacção temporal e o paradoxismo das mesmas, que serviram de material-base para Los Cronocrímenes, longa-metragem de estreia do cineasta espanhol Nacho Vigalondo, previamente vencedor de um Óscar para Melhor Curta-Metragem Live Action com 7:35 de la Mañana (2003).

Héctor (Karra Elejalde), é um homem de meia-idade que acaba de se mudar para uma grande casa de campo com a sua esposa Clara (Candela Fernández). Enquanto relaxa no seu jardim, Héctor, num move à la Rear Window (1954), observa os arbustos ao longe com os seus binóculos, quando avista o que parece ser uma mulher nua entre as árvores. Movido pela tentativa de satisfazer a sua curiosidade, e pela conveniência da sua esposa ter ido às compras na vila, decide ir investigar de perto, mas já dizia a expressão “a curiosidade matou o gato”. Ao encontrar a mulher deitada no chão no meio da floresta, é rapidamente atacado por uma figura sinistra, com um grande casaco preto e com a cabeça enrolada por um excesso de ligaduras ensanguentadas, quase como uma múmia cor-de-rosa. Fugindo aterrorizado, Héctor acaba por se refugiar num laboratório no topo da colina, onde um jovem cientista (interpretado pelo próprio realizador e argumentista do filme) o persuade a esconder-se num peculiar tanque com um líquido duvidoso, emergindo momentos depois apenas para descobrir que viajou para o passado, sensivelmente uma hora atrás no tempo, desencadeando uma estranha série de eventos com consequências imprevisíveis, num esforço para se salvar do perigo iminente.

A partir deste ponto da narrativa, Vigalongo explora o mundo interminável do ciclo causa-efeito das viagens no tempo, construindo um envolvente loop temporal cheio de reviravoltas e pormenores cativantes. Não há grande espaço para o desenvolvimento das personagens, ao invés disso, decide apresentar-se como um estudo sobre o destino imóvel que, ironicamente, mais parece estar em constante movimento, pela progressiva imersão de Héctor neste time loop. Assim, Los Cronocrímenes alia um enredo semelhante ao de um B-movie, a uma escrita precisa e a um estilo visual extremamente realista. Junta-se um protagonista que é uma espécie de anti-herói propositadamente desleixado, que permanece imperturbável pela situação difícil em que se encontra, e o resultado acaba por ser memoravelmente inconvencional. A realização de Nacho Vigalongo faz com que tudo isto funcione como um psicodrama sombrio e demente, quase como se estivéssemos a espreitar um pesadelo de um estranho. Complexo e engenhoso, mas uma viagem alucinante e envolvente ao mesmo tempo, onde tudo parece irreversivelmente fatalista.

Um excelente quebra-cabeças para os fãs de thrillers, de suspense e de ficção científica. Todas as peças se encaixam de uma forma bem argumentada e é extremamente satisfatório no trato das questões paradoxais, acabando por ser daqueles filmes que merece uma segunda visualização, com certamente duas experiências muito diferentes, mas igualmente entusiasmantes. Uma produção minimalista, com um elenco composto apenas por quatro pessoas, gravações em apenas três localizações e um orçamento minúsculo, Los Cronocrímenes segue o mote “menos é mais”, conseguindo dar a volta a todas as suas limitações de forma eficaz e inteligente, repleto de momentos intrigantes e cenas bizarras que não desiludem, como um mindfuck bem executado deve fazer.

4/5
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