Em pleno verão, sem alguma razão aparente, dois seguranças do distrito de Lausanne (Suíça) têm como objetivo principal fazer com que nenhum habitante chegue ao rio. Neste filme, realizado por Tizian Büchi, acompanhamos Ammar, novo no trabalho, e Daniel, um veterano daquelas andanças. Durante as rondas e encontros com os habitantes, o público tem a oportunidade de ver laços a serem criados, histórias eternas de emigrantes e relatos daqueles mais velhos que respiram de alívio por nada ter mudado.
Este filme possui um charme muito próprio. Começa como um assumido documentário que aos poucos vai deixando a ficção tomar conta da história. Porém, o ponto interessante deste projeto é que apesar do seu ritmo bastante lento, e de no início fazer questionar a necessidade de um passo tão desacelerado, em momento algum o filme perde a atenção do espectador. É exatamente o ritmo que dita a força da história, pois faz com que a audiência se sinta obrigada a ouvir com outros ouvidos os relatos de um povo que escolheu viver neste “buraco”.
Tizian brinca bastante com as ironias que as memórias e as diferentes percepções podem ter na construção de uma história. Há um certo misticismo que o filme constrói em volta desta localidade que cria uma sensação que todos os habitantes estão um tanto ou quanto seduzidos por este lugar, o que justifica a decisão narrativa de termos como protagonistas alguém que já se adaptou aos costumes deste espaço e uma pessoa que ainda se está a habituar.
O filme começa com crianças a partilharem histórias deste local, relatando raids policiais. Contos perigosos que não parecem abalar os habitantes, que se sentem contentes apesar de tudo. Mais adiante, reformados glorificam o facto desta vila nunca mudar, para momentos depois alguns migrantes contarem as suas histórias de origem neste espaço. Todos estes momentos colocam várias questões: será que nada mudou mesmo? O que quer dizer mudar? Afinal, as pessoas mudam, mas quando pensamos nestas histórias percebemos que são as mesmas de tantos outros migrantes. Desde a clássica: ”era para ficar um bocadinho e acabei por não ir embora”, até àqueles que procuravam melhores condições de vida. Por um certo ponto de vista, a senhora que dizia que nada mudou até tinha razão, tendo em conta a obsessão que recai sobre os dois seguranças designados para impedir que as pessoas acedam a algo que está constantemente a avançar – o rio. É uma localidade que se conformou com o passado.
L’ilôt é um documentário que brinca com a ficção. Uma reflexão sobre o lado positivo da nostalgia e também dos perigos sedutores deste sentimento que leva, por vezes, a tomar decisões irracionais. Apesar de por vezes parecer que nada está a acontecer, é um filme que se aproveita cena a cena, e no final o público certamente não se sente traído.