Last and First Men (2020)

de Rafael Félix
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Adaptado do romance de ficção-científica do mesmo nome de Olaf Stapledon, Last and First Men é a primeira – e será também a sua última – longa metragem do compositor islandês, Jóhann Jóhannsson, e pode dizer-se que é de uma ambição apenas a par da própria obra original. 

A narração de Tilda Swinton leva-nos através da evolução da humanidade, dois mil milhões de anos no futuro e dezoito espécies depois, numa civilização no anoitecer da sua existência.

Marcado pelo experimentalismo, a fotografia de Sturla Brandth Grøvlen em 16mm monocromáticos consiste apenas de imagens contemplativas de construções esquecidas da antiga Jugoslávia e é como que a representação visual da história narrada: familiar, mas ao mesmo tempo estranhamente alienígena. Os elementos mais fantasiosos sobre mutações genéticas e evoluções biológicas são de uma peculiaridade incómoda, mas é a poesia nas palavras de Tilda Swinton em momentos contemplativos da existência humana ao longo de milhões de anos que tornam o filme de Jóhannsson uma obra que transcende o mero sci-fi habitual.

É uma peça de estranha espiritualidade, com tanto de racional, objetivo e científico, como de místico, pensativo e acima de tudo, esperançoso. Há esperança na dicção fria de Tilda, a esperança vazia que tem tanto de aceitação por um fim inevitável como de um profundo conforto com o caminho percorrido pelo espírito humano até então. Não que este apaziguamento do espírito venha de um passado idílico, pelo contrário, o filme confronta muitas vezes a humanidade e a civilização com a usa própria insignificância no vasto plano do cosmos e que passou por inúmeras fases de avanço e retrocesso evolucional. No entanto, este olhar trágico, que é complementado pelas cordas guturais da música composta por Jóhannsson e Yair Elazar Glotman, é absorvido por momentos em que é descrita o encanto simples dessa irrelevância existencial ou na forma como o humano tem a estranha habilidade de se compreender mutuamente apenas através de pensamentos e sensações numa coexistência que parece transcendental, contudo está apenas limitado pela sua própria vontade de o fazer. 

E é este o encanto de Last and First Men. É um filme que olha o passado através dos olhos do futuro e contempla o potencial inerente à espécie humana, não para evoluir em termos práticos de adaptabilidade civilizacional e biológica, mas sim para ser melhor para si mesma e para se amar a si mesma, algo que todos devemos agradecer a Jóhann Jóhannsson por nos relembrar com uma obra tão peculiarmente bela. 

4/5
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