Luàna Bajrami tinha apenas 18 anos quando o magnífico Portrait de la Jeune Fille en Feu (2019) estreou na 72ª edição do Festival de Cannes e já demonstrava um talento precoce para a interpretação, sendo nomeada ao Prémio César na categoria de Melhor Atriz Revelação pelo seu papel secundário no filme de Céline Sciamma. Aos 20 anos, Bajrami apresenta o seu primeiro projeto como realizadora, argumentista e produtora: La Colline Où Rugissent les Lionnes. O resultado é um impressionante domínio cinematográfico vindo de uma artista tão nova, mas com muitas questões que ainda precisam de amadurecimento.
É um filme, dentro do subgénero coming-of-age, que acompanha a rotina de três amigas adolescentes (interpretadas por Flaka Latifi, Urate Shabani e Era Balaj) à procura de um futuro grandioso além da pequena aldeia no Kosovo onde sempre viveram. Cada uma possui diferentes problemas familiares e dúvidas existenciais, mas encontram umas nas outras o apoio necessário para fugir do que foi imposto a elas pela sociedade. Após as três sofrerem pesadas desilusões, as raparigas criam uma nova ligação em vários actos de rebeldia e crimes que trarão consequências profundas para todas.
Luàna mostra uma condução firme da história no seu primeiro e segundo ato, explorando cada nuance da interpretação das três atrizes principais, que estão excelentes e naturais nas suas personagens. A realizadora revela com delicadeza a frustração de uma juventude fadada a ficar no mesmo lugar durante toda a vida, sem expectativas de realização profissional ou pessoal. O rugido das leoas do título, é o grito de desespero e, ao mesmo tempo, de libertação. A direção de fotografia de Hug Paturel é, também, uma óptima descoberta, captando imagens da aldeia cheias de profundidade narrativa, demonstrando que algo tão bonito pode estar carregado de melancolia e tédio.
É digno de nota a participação especial da realizadora na longa-metragem, que interpreta Lena, uma jovem que representa o oposto das três protagonistas. Enquanto as três amigas não suportam a ideia de passar o resto das suas vidas no mesmo espaço, Lena surge da agitada cidade de Paris, encontrando conforto e tranquilidade naquela pequena comunidade. Num diálogo, que rapidamente revela um confronto de ideias, Qe (Flaka Latifi) assume que não consegue ter uma amiga como Lena, pois a jovem tem demasiados traços de personalidade diferentes dela. Ao mesmo tempo, Qe revela estar completamente enganada nessa percepção. As duas compartilham um sentimento importante que move todas as suas ações e pensamentos: a insatisfação com o lugar onde vivem.
Porém, como foi dito no início da crítica, nem tudo são flores. O terceiro acto da história sofre uma mudança brusca de ritmo, onde quase se transforma num Spring Breakers (2013) só que sem a genialidade e sarcasmo de Harmony Korine em lidar com o caos. A vida criminosa das protagonistas é fracamente construída e o dinheiro que elas conseguem com pequenos furtos parece torná-las tão ricas quanto chefes da máfia italiana. É tudo tão apressado e mal desenvolvido que parece que a longa-metragem devia ter, pelo menos, mais uma hora de duração, culminando num desfecho extremamente anticlimático. É necessário registar também que a personagem de Urate Shabani não recebe tanta atenção e desenvolvimento como as duas outras actrizes, criando uma sensação que nunca a conhecemos completamente, no final do filme.
Colocando todos estes pontos na balança, o saldo do filme permanece positivo. O que Luàna Bajrami consegue fazer com poucos recursos e tão pouca experiência como realizadora é surpreendente. Os pontos baixos em relação ao argumento mostram que a artista está no caminho certo da sua carreira, mas que esse trilho ainda vai ser longo e cheio de aprendizagens. La Colline Où Rugissent les Lionnes é uma óptima surpresa cinematográfica e sua criadora é digna de atenção nos seus trabalhos futuros.