King of Clones (2023)

de Sofia Alexandra Gomes

King of Clones retrata a história de Hwang Woo-suk, o cientista mais famoso da Coreia. O documentário apresenta o percurso profissional de Hwang, que começou como médico veterinário. Neste campo, ele acabou por tornar-se famoso graças às múltiplas clonagens de animais que fez, de forma bem sucedida, em cães, camelos, porcos, etc. Aliás, foi o pioneiro desta prática. O seu derradeiro objetivo era conseguir avançar para a clonagem humana, de modo a salvar as pessoas de enfermidades graves. Contudo, Hwang acabou por estar envolvido num enorme escândalo: práticas de clonagem humana realizadas em conjunto com a fertilização in vitro levantaram inúmeras questões éticas na biomedicina, sendo que o cientista utilizou os ovos das suas alunas sem o seu consentimento, bem como do mercado negro. Com efeito, passou do “Orgulho da Coreia”, como era chamado, para ultraje nacional.

Este documentário destaca-se pelo seu enredo fascinante, dado que revela os pormenores de uma situação verídica ímpar que ainda não foi suficientemente explorada e cuja pertinência científico-social é inegável. Não obstante, o potencial da história fica aquém na realização documental: o pacing do filme é extremamente lento, chega a ser monótono, o que dificulta a fixação do espectador ao ecrã… O suspense deveria ser o ponto-chave guia deste documentário, mas a sua existência é praticamente nula.

Esta produção da Netflix fixa-se demasiado na explanação de informação técnico-científica sobre a clonagem animal e humana em detrimento da exploração do impacto social que esta polémica trouxe. Claro que para entender o documentário é necessário perceber um pouco da clonagem animal e humana que estava em causa para, por sua vez, compreender os problemas éticos que estavam a ser levantados, mas King of Clones leva esse entendimento a uma profundidade desnecessária: o enfoque deveria estar nas pessoas que foram afetadas por Hwang, mas os seus testemunhos, contrariamente aos detalhes de escopo científico, são fracamente explorados. A atenção dada aos depoimentos não é de todo a suficiente, mas são estes que formam a essência do escândalo que afetou o cientista sul-coreano.

Além disso, o documentário inicia uma discussão sobre a extinção de algumas espécies, razão que motiva a clonagem de animais segundo o filme, mas não a aprofunda. Debates sobre os limites da ciência e a vontade do Homem em superar Deus, na medida em que avança com criações científicas que clonam uma existência outrora morta também são começados, mas, tal como o anterior, não se desenvolvem.

O espectador acaba este documentário confundido porque o encandeamento da história é desordenado, tornando-se ambíguo. Deixa-nos com imensas dúvidas acerca de como todo o escândalo se procedeu: os testemunhos apresentados não estão articulados devidamente e acabamos por não perceber a ordem cronológica dos acontecimentos nem a proporção das polémicas, pois o tom monocórdico do documentário não tolera sobressaltos.

King of Clones é demasiado superficial para a temática que aborda, isto é, não faz jus à importância da história que escolhe explorar, visto que ao renegar-se a pormenores científicos pouco pertinentes para o espectador – e até para o entendimento da própria história per si – acaba por menosprezar o papel que a investigação de Hwang teve na Coreia e no mundo, quer nas suas consequências positivas, quer nas suas consequências negativas.

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