Inside Out 2 (2024)

de Mercês Castelo-Branco

“This film is dedicated to our kids. We love you just the way you are.”

É com esta frase que termina Inside Out 2, realizado por Kelsey Mann, que nos traz numa jornada emocional tão ou mais atribulada e emotiva como do primeiro filme de 2015, Inside Out, realizado por Pete Docter.

Existe sempre aquela percepção de que “um filme que é feito para crianças não pode ser assim tão profundo”, aliás, o meu próprio entusiasmo e intriga nesta sequela era constantemente respondido com este argumento. Esses dois sentimentos díspares estavam consistentemente presentes, antes do meu visionamento, pelo receio do quanto eu me poderia rever nesta sequela (e o quão emotivo isso poderia ser). Já foi comentado anteriormente o quanto filmes e séries de animação que têm como público alvo as crianças, também são feitos para os adultos, que na realidade são crianças que cresceram. O facto de assim o ser torna os visionamentos destes conteúdos sempre algo agridoce, porque nos revemos naquilo que está a ser expresso de forma tão clara que não seria possível expressar verbalmente. Isto torna, por isso, o momento algo emotivo e por vezes triggering, dado que há sentimentos e memórias que precisam desta ajuda externa que os filmes trazem, para nos permitir sarar e avançar com mais tranquilidade.

Em Inside Out 2, seguimos a vida de Riley (Kensington Tallman) mais uma vez, mas agora com 13 anos e a passar pela fase tão constrangedora que é a puberdade. Com ela chegam mais emoções à torre de controlo: temos a Ansiedade (Maya Hawke), a Vergonha (Paul Walter Hauser), a Inveja (Ayo Edebiri) e o Tédio (Adèle Exarchopoulos) que segue pelo nome de Ennui no filme. Há uma grande vontade por parte destas novas emoções em tomar controlo total da cabeça de Riley, pelo que é aqui que a jornada emotiva começa. No primeiro filme aprendemos sobre o quão tóxica a Felicidade pode ser se não deixarmos entrar a Tristeza e as outras emoções das quais nos ajudam a processar eventos do dia a dia, afinal não somos seres unidimensionais. Apesar de inicialmente haver um receio de voltarmos à mesma narrativa e incidentes desencadeadores do primeiro filme, aquilo que torna a viagem diferente e na mesma intrigante é o que leva as personagens/emoções a passarem por estas dificuldades. O que é que mudou na vida de Riley para levar as suas emoções nesta jornada?

Com o crescimento vem o desenvolvimento do pensamento crítico e as questões existenciais de: quem sou eu? O que é que estou aqui a fazer? Que pessoa quero eu ser e que impacto quero fazer? Todas elas começam a assoberbar a cabeça também de Riley que inicialmente começa por se sentir confiante na pessoa que é e na identidade que assume, mas rapidamente vai tudo por água abaixo, com ajuda, claro, da ansiedade.

A ansiedade toma um grande papel neste filme e é muito reconfortante ver de que forma já desde cedo os filmes que têm como público alvo também as crianças, têm como objetivo abordar estas emoções que muitas vezes já são sentidas antes da puberdade, mas são difíceis de denominar pela sua complexidade e podem-se tornar assoberbantes se as deixarmos no controlo total. A Pixar é genial na forma como aborda momentos difíceis e o facto de Riley estar à procura da sua identidade, do questionar quem realmente quer ser, pensando já num futuro que assombra as decisões que toma no presente, reflete uma história incrivelmente realista e pessoal.

Durante o filme dei por mim a ficar extremamente emocionada e a reparar que as pessoas à minha volta estavam também elas a fungar e a tentar conter essa emoção. A verdade é que o filme articula e explora de forma tão interessante este conceito da identidade, que não há maneira de escapar à forma tão intensa que nos puxa, provocando uma lágrimazita ou outra (ou se for como no meu caso, uma cascata). Nós encontramo-nos e desencontramo-nos dentro da história e saímos da sala de cinema com a cara inchada de chorar, mas a sentirmo-nos acolhidos por um abraço aconchegante. O filme é, sem dúvida, terapêutico.

Isto é principalmente possível pelo argumento, que conta com Meg LeFauve (que fez parte da equipa de argumentistas do primeiro filme) e Dave Holstein (que marca aqui a sua estreia na Pixar), como também pelo trabalho dos atores. A própria dobragem, na versão original, continua a contar com Amy Poehler (que dá voz à Alegria), Phyllis Smith (que dá voz à Tristeza), entre outros nomes icónicos. O papel destes atores, juntamente com as novas vozes, é crucial não só para a criação das personagens como para o nosso envolvimento no filme (as más dobragens têm o mesmo efeito de repudia pela nossa parte, cortando a ligação emocional com a história).

Aplaudo mais uma vez a equipa criativa da Pixar pela capacidade que tem em criar filmes pertinentes e pelo facto de conseguirem pegar em temas tão profundos e complexos e em desconstruí-los de forma mais simples para todas as idades conseguirem compreender (o nível de compreensão é que, claro, já vai depender da fase de vida em que cada espectador se encontrar). Nota-se sempre um nível de atenção, por parte do estúdio, por essa criança que eventualmente vai crescer e aprender com os seus filmes.

Acredito que um segundo visionamento seja ainda mais espetacular, pois vai permitir uma leitura ainda mais cuidada das metáforas visuais utilizadas e sem dúvida dar uma maior vontade para escrever e comentar mais sobre as suas ideias.

Só tenho a dizer (e perdoem-me o estrangeirismo): “Well Done, Pixar, you’ve done it again”.

4.5/5
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