Immaculate (2024)

de João Iria

Sydney Sweeney é atualmente das atrizes mais interessantes em Hollywood. Talvez seja mais apropriado referir Sweeney como uma das atrizes/produtoras mais intrigantes de acompanhar pelas colinas de Los Angeles. Foi responsável pelo surpreendente sucesso financeiro de Anyone But You (2023), entregando-se completamente ao seu marketing com uma mentalidade business-like impressionante, inédita presentemente na sétima arte, recordando os esquemas de clássicas distribuidoras e antigas estrelas do cinema – incluindo aderir (e incentivar) aos inevitáveis rumores de uma traição amorosa nas filmagens dessa romcom, conjugando a sua química ardente com Glen Powell durante diversos meses para atrair atenção à sua comédia romântica. Esta sua atitude ambiciosa foi expressa numa entrevista acerca do fracasso de Madame Web (2024), onde Sweeney admitiu que encarou essa película como uma mera oportunidade de estabelecer uma relação com a Sony Pictures, abrindo caminho para um futuro artístico garantido. Neon (a distribuidora americana desta sua nova longa-metragem) participa nesta criatividade apaixonante da atriz, elaborando numerosos vídeos imaginativos como a captura de reações de verdadeiras freiras à sua nova obra de horror ou como o simples, todavia divertido, clip da atriz a recitar passagens da bíblia, ironicamente implementando os pontos dramáticos de Immaculate – uma produção movida pela paixão da sua protagonista.

Inspirado pelo subgénero de nunsploitation e pelo cinema de terror europeu, dominado por artistas como Lucio Fulci, Roman Polanski e Mario Bava, Immaculate conta a história de Cecilia (Sydney Sweeney), uma jovem freira americana que recebe um convite de um padre, Sal Tedeschi (Álvaro Morte), para aderir a um convento em Itália, dedicado a assistir freiras envelhecidas na sua passagem para o paraíso. Apesar de não compreender a língua e desta decisão implicar reiniciar a sua vida distante da sua casa e família, Cecilia aceita, acreditando que Deus atribuiu um propósito para a sua pessoa. Uma crença validada por uma súbita gravidez inesperada, sobretudo para a inocente jovem que é imediatamente recebida como a próxima Virgem Maria. Apesar de finalmente encontrar o seu desígnio, com uma benção divina, Cecilia sente-se intensamente alienada perante o seu próprio corpo, uma sensação compreendida apenas pela sua única amiga neste convento, a freira Gwen (Benedetta Porcaroli). Esta alienação é enaltecida por suspiros pelas noites que sugerem segredos sombrios capazes de corromper este milagre neblinoso, reprimindo a vontade de Cecilia como um ser humano e subjugando o seu corpo ao seu “propósito”, aprisionando a jovem a uma dádiva isente do seu controlo.

Quando menciono “inspirado pelo subgénero de nunsploitation”, sinto a necessidade de apontar que essa influência surge futilmente como uma máscara de cera imediatamente derretida pelos abafados excessivos truques aborrecidos do terror comercial – jumpscare, cheio de graça, o susto é convosco, bendito é o fruto do vosso ventre. Michael Mohan, o realizador, exibe uma impaciência frustrante na sua direção e uma escassez de confiança emocional na sua história. É essencial, como cineasta, acreditar que o terror consegue nascer naturalmente através do seu drama narrativo. Immaculate nunca respira fundo pois Mohan não permite que a sua atmosfera consuma a audiência. Invés do medo pesar nos assentos como pesadelos a consumir a fisicalidade do público, o pavor flutua como uma frágil insegura pena pelo ambiente, facilmente afastado com um básico sopro. É um aspeto profundamente desapontante, pois os seus distintos visuais fugazes expressam sombras de angústia apropriadamente equipadas para atormentar os seus espectadores (imagens como os rostos de freiras ocultados por um tecido vermelho; a invasão de desconhecidas mãos no rosto da protagonista, um frame reminiscente da arte de Gustav Klimt ou uma prolongada cena onde Cecilia observa uma invulgar figura na porta do seu quarto, sucedem como genuinamente arrepiantes e envolventes) exceto que estes momentos são constantemente interrompidos por um design de som genericamente inusitado, equivalente a um papagaio fanático por terror, familiar apenas com ruídos de portas a ranger e rugidos súbitos.

Nunca alcança o louvor sinistro das histórias que, supostamente, inspiraram esta criação. Falta coragem; falta libertar a pura loucura que sentimos consistentemente restringida igual à sua protagonista. Aliás, é precisamente no seu terceiro ato e na sua sequência climática, quando finalmente presenciamos a sua demente grandiosidade, que Immaculate desencadeia uma sensação de autêntico terror, num aterrorizante plano único completamente dependente da performance da sua protagonista, com Sydney Sweeney praticamente a ser coroada como uma nova Scream Queen. Persiste uma impressão que esta narrativa está simplesmente à espera de poder usufruir desta insanidade final, sem construir um build-up atmosférico adequado para a sua conclusão. Ainda assim, o seu potente impacto permanece intacto, sendo um dos melhores epílogos cinemáticos deste ano.

Evidentemente, este é um projeto apaixonante para a sua atriz principal que partilhou a sua curiosa viagem pessoal nesta duradoura produção: participando entusiasticamente num casting em 2014 apenas para o argumento desvanecer num limbo de scripts desprovidos de orçamento. Quando Sydney atingiu fama suficiente para estabelecer a sua produtora, Fifty-Fifty Films, um dos seus principais objetivos residiu no despertar desta longa-metragem. É compreensível pois Immaculate explora temáticas fascinantes acerca do domínio religioso e a sua apropriação do corpo feminino, e o conceito de escolha como uma ilusão abstrata, visualizado em Gwen, uma mulher acolhida pela Igreja, sendo esta a sua única alternativa a uma vida de violência e sofrimento. O poder da escolha está sempre limitado à realidade individual de uma pessoa, particularmente num mundo reinado por vozes masculinas que pretendem apagar essa autonomia feminina. Estas ideias, relevantes para a nossa atualidade, são tenuemente conservadas na sua concepção cinemática e salientadas pelo seu impetuoso desfecho e pelo desempenho de Sydney Sweeney, elevando Immaculate a ultrapassar os seus gritos banais, resultando numa ressonante história sobre uma mulher a recuperar o controlo do seu corpo num filme destituído de domínio artístico sobre a sua visão.

Sinceramente, é possível que a sua explícita paixão pelo processo criativo influencie a minha percepção crítica da sua filmografia. É verdadeiramente inspirador. Como atriz, é irrefutável a sua presença, sendo sempre memorável nas suas performances. No entanto, acredito que esta futura estrela carece de uma equipa criativa destemida prontamente apta para lustrar o seu potencial e a sua perceptível dedicação. Sydney Sweeney merece devidamente uma posição neste céu iluminado pela poluição da fábrica dos sonhos americana. Fica a esperança que os seus futuros projetos sejam dignos da sua sublime paixão e esforço.

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