Hot Milk (2025)

de Rafael Félix

Primeira aventura na cadeira de realização de Rebecca Lenkiewicz após ver os seus guiões adaptados por artistas como Sebastián Lelio, Maria Schrader e Pawel Pawlikowski. Passado maioritariamente nas praias de Almería, Rose (Fiona Shaw), paralisada há anos por uma condição médica não diagnosticada, é trazida pela filha, Sofia (Emma Mackey) para tentarem um tratamento mais esotérico para esta doença. Nestas praias, conhece Ingrid (Vicky Krieps), dona de uma loja de roupa local, de lenço na cabeça, em câmara lenta, montada a cavalo, e fica imediatamente hipnotizada pelo seu espírito. Não há memória da última vez que um filme apresentou uma manic pixie girl de forma tão descarada.

O facto de ser competentemente montado, ter uma belíssima banda sonora de Matthew Herbert e duas performances centrais sólidas em Shaw e Mackey, não conseguem remotamente salvar um guião tão mal concebido como é o de Hot Milk. Aqui e ali, a relação de mãe e filha, de Sofia, uma cuidadora dedicada mal-amada e esgotada pelos caprichos da mãe, e Rose, com os traumas e abandonos que marcaram a sua vida, consegue trabalhar algumas ideias interessantes sobre o peso de ser o cuidador sempre disponível e o quanto de nós é nosso e o quanto de nós provém dos outros. Identidade pessoal, o que sou e o que é o outro. Estes momentos são escaços e estão mais presentes nas primeiras investidas do filme, porque a partir do momento que Vicky Krieps entra em cena, tudo vem por aí abaixo. A sua personagem é de tal forma um arquétipo tão pisado que fica difícil de perceber se o problema está na performance ou naquilo que está na página.

Enquanto Ingrid e Sofia partilham noites em cabanas, mal românticas e mal iluminadas, a proferir os diálogos mais pobres numa relação que pouco ou nada convence, Rose está a ter colapsos psicológicos junto ao seu terapeuta e que no fim dão muito pouco ao que quer que Hot Milk está a tentar dizer. De forma atabalhoada, todas estas personagens são apresentadas como pessoas com profunda falta de amor na sua vida, seja ele próprio ou aquele que esperam daqueles que os rodeiam, procurando no sexo, nas relações vagas e mesmo na doença, algum propósito para garantir a sua sobrevivência perante o quotidiano.

Pena que estas ideias estejam contidas num filme que faz lembrar quinhentos outros em que personagens de classe-média vão para um local semi-paradísico procurar uma cura para as suas crises existenciais (The Lost Daughter (2022) e Sundown (2022) vêm à memória), e com um final tão irritantemente idiota que deixa um gosto demasiado amargo para um filme que na grande parte do seu tempo não é interessante o suficiente para causar algum tipo de sensação além de ligeiro aborrecimento.

2/5
1 comentário
1

Related News

1 comentário

Deixa Um Comentário