A história tem tendência a repetir-se. O Homem continua a cometer os mesmos erros vezes e vezes sem conta. Como se não evitasse o falhanço mesmo sabendo qual o resultado final das suas decisões. É algo surreal, pensar nisto, mas é inevitável os “nossos filhos” seguirem as nossas pisadas. Como o próprio Sokurov diz “Procuro criar um filme quando não compreendo algo no mundo” e é com este propósito que este Skazka (ou Fairytale – Sombras do Velho Mundo) surge, de trazer significado ao carácter humano, nos tempos incertos que vivemos.
Fairytale – Sombras do Velho Mundo é o manifesto social e artístico dos que determinaram o destino do planeta, no final da segunda grande guerra: Stalin, Churchill, Mussolini e Hitler pelos olhos de um dos grandes mestres vivos do cinema russo actual – Aleksandr Sokurov.
A primeira impressão a entrar neste “mundo” de Sokurov é de deslumbramento com o que surge perante os nossos olhos. Com o uso de imagens de arquivo e animação combinadas, de maneira nunca vista, Sokurov apresenta novas possibilidades à maneira de ver cinema. O filme surge como um “sonho” disfarçado de pesadelo em que deambulam os fantasmas de um passado, que queremos esquecer. Hitler, Mussolini, Churchill ou Stalin “renascem” perante os nossos olhos, mais humanos que os livros de história nos ensinaram, mas também satirizados ao ponto do ridículo nas suas fixações e alheados da realidade que os rodeia.
O próprio pormenor das vozes, nas línguas originais de cada um, permite uma total imersão neste “universo fictício” de Sokurov e de aparentar, ao espectador, estar numa conversa de café da qual só queríamos fugir. O trabalho de som é usado como intensificador de sensações de desconforto e tem um papel importante em criar o ambiente onírico prevalente nas imagens reveladoras das consequências trazidas pelos “Quatro cavaleiros do apocalipse” (todos os 4, mesmo Churchill, farinha do mesmo saco – segundo Sokurov).
Não é inocente esta referência ao fim dos tempos, sempre uma sensação presente no imaginário humano e do qual não conseguimos fugir, independentemente das inúmeras lições da história. Alguns cameos de personagens históricas (que não importa revelar) confirmam também esta posição de Sokurov, prevalente em toda a narrativa. A repetição dos mesmos trejeitos narrativos acaba por esticar o filme para além do que seria desejado (mesmo com apenas 78 minutos). Arrisca-se dizer que isto teria sido uma excelente curta-metragem, mas que se torna demasiado extenuante devido ao constante bombardeamento de referências históricas, tão preciosas para Sokurov – a obsessão tem destas coisas, infelizmente.
Sokurov é igual a si próprio, subversivo e inovador com a arte de fazer cinema ao criar esta fábula em que não há inocentes ou culpados e onde é juiz, júri e carrasco da incapacidade humana para aprender com os erros. Acaba, no entanto, por perder o espectador na sua ânsia de repetir, ad aeternum, este ponto de vista.