Entrevista | Directores Artísticos do MOTELX: Pedro Souto & João Monteiro

de Fio Condutor

O Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa, MOTELX, regressa para a sua 17ª edição, que decorre de 12 a 18 de Setembro. Um espaço onde o terror é servido com um sorriso aberto, esta edição promete sangue, sustos, introspecção e oportunidades artísticas para a própria audiência do Festival. Para celebrar este Festival, tivemos a oportunidade de reunir com os diretores artísticos do MOTELX, Pedro Souto e João Monteiro, para uma entrevista acerca desta edição do Festival, o futuro do cinema de terror nacional e como apresentar clássicos a um público demasiado familiar com os seus truques.

Além da seguinte transcrição, a entrevista está também disponível em formato áudio, através do nosso Podcast, FILA DO MEIO, no nosso canal de Youtube e no Spotify.

Fio Condutor: É talvez a pergunta mais óbvia, mas será para estabelecer (um bocadinho) como será o festival este ano. Quais são os principais destaques e novidades desta edição que querem mesmo já anunciar e revelar às audiências?

João Monteiro: A grande novidade à exceção, obviamente, da captação dos novos filmes, é uma espécie de encontro ou de embate entre dois festivais: o MOTELX, vai receber e acolher o Guiões que é o Festival do Roteiro da Língua Portuguesa, pela 9`ª edição, salvo erro. É um festival todo dedicado a argumentos em português, portanto, envolvendo Portugal, o Brasil e PALOPs. Esta edição é diferente porque vai ter a tendência mais para a escrita de terror em Portugal. E fez-nos criar um Prémio, que ainda não tínhamos, que é o Prémio para Melhor Guião. Temos estado a dar (atribuir) Prémios para Melhores Filmes, Melhores Curtas, Melhores Longas… desta vez vamos para o guião. Queremos mesmo consolidar a formação nestas áreas, que depois vão dar ao filme. Vamos trabalhar mais a questão do guião. O guião é um problema para o cinema português de terror. Não há assim tantos guiões e… que possam fazer sentido. Uma coisa é fazer um bom guião, outra coisa é fazer um guião que faça sentido para os meios de produção em Portugal e para o tipo de filmes que se faz em Portugal. E portanto, isso é uma coisa original, porque não só as pessoas vão poder ter uma noção do que se faz dentro deste campo e assistir ao que se quer fazer, que se quer produzir. E esperamos que isto, para além, obviamente, do prémio (que é um valor simbólico), que os cinco projetos que vão ser finalistas e que vão ser desenvolvidos, possam num futuro muito próximo estrear como longas do MOTELX. E nesse sentido, achamos que é um passo interessante para estimular a produção mesmo. Nós estimulamos a exibição, mas queremos mesmo era que se desenvolvessem mais filmes e o caso que queremos ao atingir este patamar é ter um filme como Semente do Mal, de Gabriel Abrantes, que é um caso já completamente assumido de amor ao género (terror). De querer brincar com essas convenções do género dentro do nosso cinema. Portanto, isso digamos que (é) o fator mais original desta edição. Ou a novidade diferente das anteriores. Fora isso temos imenso cinema português. Vamos ter uma sessão de cine concerto que faz 100 anos e que ninguém conhece, mas vai passar a conhecer, chamado Os Olhos da Alma (1923), um filme mudo vai ter uma banda sonora da SURMA – que a vai tocar ao vivo, no último dia do festival. Vamos ter micro curtas com o apoio do Youtube este ano, ou seja, já com prémio também, o que causou o aumento de submissões deste ano, portanto, o cinema português continua a ser o grande destaque, e continua a estar no centro de tudo o que nós fazemos. À parte disso, vamos receber algumas visitas interessantes, a principal, que já anunciamos é o Brandon Cronenberg. Um dos autores desta nova geração, do Robert Eggers e do Ari Aster do cinema norte americano de terror. E ele, ao contrário destes, não tem tido estreia nacional e os filmes têm andado (assim um bocadinho) perdidos. Portanto, achámos que era interessante juntá-los, também são só 3 (filmes), como fizemos anteriormente com outros autores semelhantes.  E portanto, vamos de certa forma apresenta-lo e apresentar a obra no conjunto. Para se ter um bocado a ideia do “toque autoral” dele. Depois também vai haver o Rodrigo Teixeira que é um grande produtor de cinema de terror, fora do Brasil, é brasileiro, mas principalmente fora do Brasil. Como ele é o produtor dos filmes de Robert Eggers, por exemplo, vem no âmbito do GUIÕES, mas também vai dar uma Masterclass consensual aos dois festivais e vai apresentar uma sessão especial do The VVitch (2015). Uma outra confirmação que tivemos agora recentemente é a vinda de um grande realizador indiano chamado Anurag Kashyap. e que não tem obviamente nada que ver com o cinema de Hollywood e pratica um cinema muito mais original que é Bombaim Noir que é cinema de gangsters, daquela tendência clássica do cinema noir, mas sempre passada em Bombaim. Ele até é chamado o Scorsese de Bombaim , pela forma como filma esta cidade, como Scorsese filmava Nova Iorque nos anos 70 e 80.

Pedro Souto: Bem, eu posso destacar mais algumas novidades da programação, nomeadamente, de algumas das secções que mostram longas-metragens. Começando pelo filme de abertura e pelo filme de encerramento. Para nós é uma novidade, porque vão ser dois filmes franceses. Não só é uma novidade a nível dos filmes de abertura e encerramento, é mais comum termos estes dois , se calhar, mais ligados à cinematografia norte americana, mas neste caso não só achei interessante, da nossa perspectiva, claro, que os filmes comunicam um pouco entre si, em termos de temática, embora em estilos e abordagens completamente diferentes. E estou a falar da temática do Eco Terror – o filme de abertura vai ser o Animal Kingdom (2023) e o filme de encerramento vai ser o Acide (2023). E portanto, estamos perante duas abordagens completamente diferentes, com esta temática sempre em pano de fundo. Às vezes, nem é em pano de fundo, já nem há subtileza, é mesmo “in your face”. No caso do Acide, nós sempre ouvimos falar das chuvas ácidas, uma vez ou outra vai aparecendo, esta é literalmente ácida. Portanto, é um ácido que desfaz qualquer superfície onde caia, portanto, é um pouco imaginar aqueles problemas que o pessoal que luta contra os aliens sente, mas vindo das nuvens, portanto, em todo o lado. O Animal Kingdom já nos remete para um universo de natureza, e de uma certa revolta da natureza contra o Homem, ou pelo menos uma adaptação. E são dois filmes que também, de certa maneira, e foi uma tendência que nós sentimos muito este ano, de um certo ressurgimento de um cinema de terror francês que se calhar já não víamos há tanto tempo, pelo menos em termos de quantidade e de propostas boas e entusiasmantes. E estes são apenas dois exemplos, nós vamos depois ter um filme chamado Vermin (2023) que também nos traz uma temática, de certa maneira também pode ser associada ao eco terror, que são as aranhas assassinas – que é também um tipo de monster movie que não temos visto muito recentemente, pelo menos com qualidades aceitáveis. Temos ainda mais um filme, que este está em competição, chamado Hood Witch (2023) que nos traz (aqui) o universo da bruxaria no mundo contemporâneo, mais propriamente nos subúrbios, na grande cidade que é Paris. E estes são alguns exemplos desse ressurgimento. Destaco ainda outro que para nós também não tem sido assim tão usual, que é o cinema de Hong Kong. Nós vamos, este ano, ter 3 filmes na programação do Serviço de Quarto (secção), filmes chamam-se: Mad Fate (2023), Detective vs Sleuths (2023) e ainda o Yum Investigation (2023). E portanto há também este ressurgimento do cinema de Hong Kong, que esperamos que possa ser também o inicio desse cinema de culto que tantos cinéfilos inspirou dos anos 90 e antes, claro. E portanto, estes são alguns dos destaques, não esquecendo também algumas presenças de, por exemplo, temos um filme de Marrocos, chamado Hounds (2023), que nos traz uma noite de desespero, com um corpo a ser transportado numa carrinha, portanto é uma noite de pesadelos. É também um filme bastante… inesperado. Portanto, temos aqui uma série de propostas que também vão caracterizar esta edição, com países que não temos tido e alguns que estamos a ter pela primeira vez.

Infinity Pool de Brandon Cronenberg

FC: O MOTELX continua a dar oportunidades à sua própria audiência, de mergulhar no cinema de terror como criadores, com os vossos vários prémios: o Prémio de Curtas de Terror Portuguesas, as Micro Curtas e agora este ano com o Prémio MOTELX Guiões – para Melhor Argumento de Terror Português. Voltando agora a este último prémio, como é que surgiu esta ideia de passar para os guiões? Não só para a parte dos filmes, mas também para os guiões.

JM: Já tinha acontecido antes. Já tínhamos feito Workshops de escrita Criativa ou de argumentos de Curtas. E quando surgiu este convite, ou este desafio, do GUIÕES, achámos que era o parceiro ideal para dar um passo mais a sério. E a questão do passo mais a sério tem sempre de envolver uma espécie de Prémio ou qualquer coisa do género. Foi o que aconteceu com as curtas-metragens. A partir do momento em que começámos a ter um prémio – e o Prémio é cada vez maior. Isso facilita o número de pessoas que concorre. E é obviamente uma motivação diferente. As pessoas precisam de dinheiro, para terem um emprego e criarem à parte e ainda escrever argumentos ou fazerem curtas-metragens, é mais fácil haver, de facto, e ajuda-nos a nós e as pessoas que concorrem. Mas a questão dos GUIÕES era exatamente, uma lacuna que nós achamos que existe. Não há propriamente uma escola de guionismo em Portugal. Há escolas de Cinema e há coisas muito especificas, da escrita de terror, que não é praticada aqui. Às vezes aparecem coisas mais ao menos de terror dentro de filmes que não são de terror. Mas também quisemos, de certa maneira perceber, porque nós sabemos o panorama das curtas, e perceber que tipo de longas é que poderão haver ou que é que as pessoas poderão tentar andar a fazer. E essa parte foi surpreendente porque recebemos bastantes, cerca de 50 submissões e ficámos obviamente com uma nova perspectiva, uma perspectiva otimista. E os cinco que nós escolhemos como finalistas, são todos diferentes entre si e têm todos em comum o facto de se passarem em Portugal e terem como tema, algo tipicamente português: seja questões sociais, seja questões históricas, seja saúde mental ou economia, seja o que for, está lá tudo refletido. E isto é um caminho que nós gostávamos de ver para o cinema Português. Agora o argumento, mas, em breve, vamos tentar explorar da mesma maneira outras fases criativas e outras artes dentro desta arte.

PS: Há outra questão que pode surgir e que nós esperamos que possa surgir noutro âmbito desta iniciativa, que é também desmitificar um pouco a ideia de que o realizador precisa de ser o chamado “autor”. Em que precisa de escrever e precisa de realizar. Com este foco, na escrita de terror para cinema, nós conseguimos também criar, incentivar e promover esses autores de escrita, portanto, esses argumentistas. E isso vai ser mais matéria-prima para, no futuro, existirem também outro tipo de dinâmicas a nível de produção de filmes. Portanto o realizador não precisa necessariamente de escrever o seu filme, pode perfeitamente, adaptar um argumento ou até fazer depois esse trabalho em conjunto, se essas parcerias se realizarem. É também essa a ideia do festival e sempre foi: é criar esses momentos e essa possibilidade, não só de convívio, mas também de trocas criativas entre os vários cineastas, os vários participantes de todas estas fases de um filme. Portanto, também pensamos que pode ser muito interessante, no futuro, ver que realizador é que vai pegar num certo argumento porque aquele argumento porque aquele argumento foi simplesmente escrito por um argumentista, que não é realizador e é mais uma hipótese e uma maneira do cinema de terror português continuar a afirmar-se. Além de que isso é essencial também para certos financiamentos – há certos projetos ou financiadores e investidores que não estão à procura de realizadores argumentistas, estão à procura de argumentos: já têm, se calhar, a sua carteira de realizadores, já têm também os projetos organizados de maneira a funcionarem com a compra de um argumento que depois é adaptado e portanto é uma fase muito importante que queremos explorar.

A Semente do Mal, de Gabriel Abrantes

FC: O ano passado tiveram o lançamento do livro “O Quarto Perdido do MOTELX”, um ano depois, sentem algumas evoluções ou diferença no cinema de terror nacional ou mesmo um maior entusiasmo por parte das plateias por este? Ao longo deste ano, após o lançamento do livro, o que sentem que mudou, se é sequer mudou alguma coisa acerca do cinema nacional de terror?

JM: Acho que a maior surpresa ou as reações mais comuns ao livro é de surpresa, não saberem que era possível pensar-se em cinema de terror na história do cinema português. Portanto, logo isso provoca uma mudança de perspectiva, de percepção. O livro não vem mudar nada, o livro é simplesmente o trabalho do “Quarto Perdido”, talvez esteja a surtir algum efeito porque há um maior interesse por cinema português, por aquilo que nós chamamos de cinema português de género. Portanto, há a necessidade de haver uma base, uma fonte de inspiração digamos assim. E agora (ela está a ser) vão à procura dela no cinema português. Porque as outras já lá estão. No cinema anglo-saxónico, no cinema norte-americano, no cinema japonês, está muito no léxico destes jovens criadores, e agora começamos a ver esse tipo de fusão, digamos assim, entre uma raiz portuguesa, seja tradicional, folclórica ou um problema urbano, uma característica típica dos portugueses, que antigamente não havia tanto isso. E como já vos disse também nos guiões isso já aparece na maior parte deles. Li coisas bastante interessantes. Podiam não estar bem escritas, mas havia ideias incríveis, todo o tipo de ideias. Infelizmente só tínhamos cinco, mas havia a possibilidade de termos escolhido mais. Portanto, não quero estar naquela posição em que digo “sim sim, isto mudou tudo” mas diria que nos últimos anos temos estado sempre a estrear filmes, temos tido sempre muitas curtas a concurso, e se isso sim é de facto uma consequência, então, bravo, boa!

PS: Existe uma de factos concretos e objetivos que é possível analisar e um deles, a titulo de exemplo, é esta obra do Gabriel Abrantes, A Semente do Mal. Já é um filme que vem no seguimento da sua obra, já não é a primeira metragem nem a segunda, e é um filme que foi feito dentro dos módulos tradicionais, portanto, com o apoio do ICA: houve concurso, recebeu o apoio e é um filme 100% terror. E isso é interessante de assistir porque temos, já destes últimos anos, algumas experiências, ou algumas tentativas, mas que no caso, por exemplo de produção e dos apoios, se calhar, só tiveram o apoio pós produção, ou o apoio à escrita (ou o que for), mas, de repente, já começamos a ter projetos que são apoiados pelo ICA, ficam numa boa classificação e são concretizados como aquilo que inicialmente foram idealizados e sendo 100% terror. E claro, sendo o Gabriel Abrantes, é mais uma maneira de se mostrar que se pode experimentar cinema de terror sem problemas, que tem cada vez mais hipóteses de ser financiado. Não quer dizer que o Gabriel Abrantes vá continuar a fazer cinema de terror, mas fez uma obra. E isto pode acontecer com outros realizadores. E temos já alguns concursos recentes do ICA que nos mostram também que esse paradigma está um pouco a mudar. E portanto, há já uma maior abertura do ICA neste caso dos júris do ICA para estes projetos existirem, e que tem sentido existirem e que também nós precisamos de dar essa variedade ao cinema português. Portanto, penso que isso é também uma mudança que estamos a assistir e que tem tudo para continuar.

Retrospectiva Brandon Cronenberg

FC: Brandon Cronenberg, como referiram, é a vossa primeira e mais sonante confirmação de presença no festival. Tendo em conta que as suas obras nunca estrearam nos cinemas, em Portugal, como é que o apresentariam a alguém que desconhece a sua filmografia?

JM: (risos) É filho do Cronenberg, está feito!

PS: Penso que o facto dele ser filho do Cronenberg tanto pode ser bom ou mau. E, se calhar, ele até pode ter sofrido um pouco com o peso desse apelido, mas ao mesmo tempo, é interessante pensar que também ouvimos muito dizer que ele seguiu as pisadas do pai, e é verdade, mas é incrível depois assistirmos aos filmes e percebermos que ele elevou uma série de ideias que nós já tínhamos assistido, de certa maneira, na cinematografia de David Cronenberg e levou-as a outro nível. Portanto, os filmes têm um impacto e um poder de nos impressionar bastante grande e isso não é nada fácil tendo em conta tudo o que nós já vimos e a quantidade de coisas que existem hoje em dia de diferentes perspetivas a nível de cinema de terror, e muito menos fazê-lo tão bem com esse peso em cima das costas, de uma avaliação muito criteriosa por parte dos fãs de David Cronenberg. Só por isso, e por ter encontrado a sua linguagem e de ter neste momento três filmes diferentes, e muito diferentes entre eles, com grande impacto e com ideias bastante originais, só por isso, merece este destaque.

FC: Infelizmente, este ano perdemos um dos maiores autores de sempre no cinema e o responsável por uma das maiores obras de terror de sempre, The Exorcist (1973). O MOTELX vai ter uma exibição do filme nesta edição, e acho que se abre uma conversa interessante acerca de introduzir obras revolucionárias a uma audiência nova que talvez não está tão familiarizada com a obra original. Consegue o filme que influenciou décadas de cópias manter o mesmo impacto com os jovens familiarizados com os truques e as ideias deste clássico presente em centenas de obras com exorcismos? Como apresentar uma obra original a uma audiência que já está demasiado habituada a tudo o que já foi feito?

JM: Tem de haver um certo contexto histórico que tens cuidado em apresentar é o que tu dizes: mostrar um filme que toda a gente já viu, por outras variações, é muito complicado que a pessoa perceba e o que é que (Aquilo) tem de especial. Mas isso passa-se um bocado com tudo, como é que tu explicas a alguém como que é que a cena do chuveiro de Psycho (1960), foi revolucionário, o que há de tão extraordinário? Tens, obviamente, de primeiro contextualizar a coisa, não havia telemóveis, não havia VHS, portanto, também tens de perceber o clima sócio político daquele momento, nomeadamente o poder da igreja católica, ainda, que é diferente de agora e acho que é curioso não só a morte de Friedkin como vir o seguimento das Jornadas Mundiais da Juventude aqui em Lisboa. Portanto, esse cuidado que nós queremos ter vai-se refletir no Warm-up em que incluímos uma sessão ao ar livre, que vai lugar no Campo dos Mártires da Pátria, em que vamos exibir o filme Leap of Faith (2019), que já exibimos há uns três ou quatro anos, que é um documentário todo sobre O Exorcista. Portanto, é uma masterclass do Friedkin sobre O Exorcista e eu espero que este Warm-up vá promover toda essa contextualização. Agora, não consigo obviamente prever o efeito que possa ter hoje em dia alguém com 20 anos… acho que só vi com 20 anos que os meus pais não me deixaram ver antes (risos). Mas hoje em dia, de facto, é diferente. Não sei o efeito que tem, mas acho que é uma ferramenta inteligente? E é também respeitamos intelectualmente o público.

PS: Há outro pormenor em certos típicos de clássicos como é O Exorcista, que é eles sobreviverem muito bem, pelo menos na parte artística e portanto, a realização de Friedkin – tudo o que envolveu visualmente o filme, todas as suas opções criativas e o argumento também – e nesse sentido, eu penso que não vai ser um filme que não vai deixar de impressionar, porque é um filme que, mesmo que alguns momentos de terror não resultem a 100%, talvez porque as pessoas já estão um pouco mais “insensíveis”, vai continuar a ter uma emoção, muito também por causa do argumento, vai resultar muito bem.

Leap of Faith: William Friedkin on The Exorcist, de Alexandre O. Philippe

FC: Dirigir um festival, como vocês já dirigem há muitas edições, é uma tarefa complicada e é um trabalho que termina um ano (uma edição) e começam logo a trabalhar na edição (seguinte) do próximo ano. A nossa pergunta é: podem falar de alguns maus momentos que aconteceram na organização que depois acabaram por ter um final feliz?

PS: O covid acabou por ter um final feliz. Mas foi essencialmente uma questão de sorte, por estar a acontecer durante setembro, como habitualmente, e termos apanhado esses momentos menos graves, pelo menos a nível de restrições. E aí a organização sofreu bastante como todas as outras de outros eventos e de outras áreas. Nos meses que antecederam o festival e pouca gente acreditava que não só conseguíssemos ter a energia necessária para fazer tudo à distância, sem nos encontrarmos, a saúde… e depois ter essa sorte que acabou por acontecer, portanto acabou por ser um final feliz no meio da tragédia.

JM: Foi muito complicado organizar um festival toda a ver os filmes que costumamos passar no grande ecrã “deste tamanho”. E não havendo festivais físicos, havia festivais online, onde nós víamos os filmes, mas é “um tiro no escuro”. Estamos a ver filmes sem reação do público, não sabes como vão reagir, não sabes se vão gostar, perdes a noção de qual é a melhor altura para os programar. E isso é daquelas coisas que foram feitas na corda bamba, mas que acabaram por correr bem. O festival foi feito, não houve nenhum acidente, ninguém da equipa apanhou covid. E fez-nos mudar um bocadinho a nossa maneira de pensar, e fazer ciclos temáticos, por exemplo, ou apostar mais em autores portugueses como convidados, coisa que já fazemos. Mas sim, este foi o maior (desafio). Depois há outras peripécias… Lembro-me de uma vez que o Roger Corman não pôde vir e cancelou à última hora, que é sempre chato… mas veio dois anos depois, no ano perfeito que foi quando Jodorowsky veio e foi um turbilhão e uma tempestade no São Jorge que acabou por correr bem, mas fora isso, temos tido bastante sorte. Acidentes há sempre, mas são coisas poucas, mas é mais essas coisas.Não conseguir determinados filmes que nós gostávamos, como o Possessor (2020), por exemplo, tentámos anos e anos e valeu a pena não passar porque agora vai ser apresentada na presença do seu realizador. São estas pequenas coisas.

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O Warm-Up do MOTELX arranca nos dias 7, 8 e 9 de Setembro, com sessões de cinema e diferentes eventos espalhados pela cidade de Lisboa. O Festival decorre entre os dias 12 e 18 de Setembro, no Cinema São Jorge, com destaque para a presença de Brandon Cronenberg e a exibição da sua filmografia completa, juntamente com uma Masterclass apresentada pelo cineasta.

Entrevista Realizada por João Iria e Pedro Ginja

Transcrito por Flora Lopes

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