Adam McKay deu o salto nos últimos anos das comédias puras como Anchorman (2004), para a utilização de humor em temáticas sérias como The Big Short (2015), que abordava o colapso financeiro que ocorreu em 2008. Don’t Look Up é um filme que tenta tocar nos dois lados da mesma moeda, funcionando como uma sátira de uma realidade muito actual e global, tanto no comportamento humano como nas consequências do mesmo para o planeta.
Kate Dibiasky (Jennifer Lawrence), estudante de astronomia, descobre um cometa de grandes dimensões. Dr. Randall (Leonardo DiCaprio) o seu professor, realiza os cálculos que determinam que esse mesmo cometa se dirige para o planeta Terra com ameaça de extinção da humanidade. Segue-se uma odisseia para tentar fazer entender o mundo que a sua existência está em perigo, algo que se verifica complicado numa sociedade tão inconsciente que não vê o que está mesmo em frente ao seu nariz.
A ideia é clara, uma sátira mais realista do que gostaríamos de admitir à passividade dos líderes mundiais e, no geral, das pessoas com poder, perante o aquecimento global, acumulando outros temas satirizados como fake news, negacionismo, no fundo a crescente superficialidade do ser humano. A intenção resulta em vários momentos, percebemos sem grande dificuldade as analogias, e algumas delas provocam indiscutivelmente a gargalhada. Sendo isto verdade, este não é um filme de intervenção que pretenda mudar mentalidades, simplesmente se entretém e procura fazer entreter com a estupidez do Homem. O que acaba por ser sempre um tópico adjacente aos filmes do realizador Adam McKay, o ego, e de uma maneira mais ou menos séria (normalmente menos) o estado da cama na qual se deitam aqueles que se levam demasiado a sério e vivem com uma inconsciência social.
Leonardo DiCaprio é extraordinário, mais uma vez, noutra realidade e contexto, com destaque especial para os seus famosos breakdowns épicos. A oitava nomeação ao Óscar poderá muito bem estar a caminho, apesar da “concorrência” este ano ser forte. Jennifer Lawrence e Meryl Streep, os outros nomes gigantes do elenco, como esperado não desiludem, mas também não deslumbram, ao contrário de Mark Rylance que criou um Peter Isherwell multimilionário fascinante no seu maléfico contido egocentrismo. Cate Blanchett, Timothée Chalamet, e até Ariana Grande ajudam a colorir a tela cómica dentro das personagens secundárias, mas é Jonah Hill que rouba a maior parte das cenas em que entra com a personagem mais excêntrica, definida e assumida como caricatura, o que encaixa bem neste universo de McKay.
O elenco dificilmente deixaria de cumprir atendendo à excelência dos nomes em questão, no entanto a realização e mesmo a edição não são tão arrojados como The Big Short ou Vice (2018). Representa um risco menor, uma utilização do estatuto conquistado pelo realizador e argumentista algo preguiçosa, com uma premissa que chama a atenção por si só, apesar de ser já bastante usada (o fim do mundo) mesmo em formato comédia, como This is the End (2013) ou Seeking a Friend to the End of the World (2012), e mesmo que não desse nas vistas por essa via, os nomes no cartaz fariam esse trabalho. Associando-a aos problemas mais prementes da actualidade sem mergulhar a 100% no absurdo como com Anchorman, nem se servindo do humor para fazer um filme que tornou um tema aparentemente aborrecido em 2 horas de entretenimento e aprendizagem como com The Big Short (por esta altura se ainda não viste o filme depois de 3 referências já está na hora de o fazer, o filme está disponível na Netflix também, enjoy), ou com Vice.
Em conclusão, Don’t Look Up é uma comédia que se for vista sem expectativas será agradável e terá cenas que terão lugar no top “cenas do ano”, apesar de ser excessivamente longo, mas se for colocado em perspectiva com os meios disponíveis, tanto humanos como financeiros, fica um pouco aquém do seu potencial. Tem um final que provavelmente não será do agrado de todos mas será também provavelmente o final que merecemos. Ainda assim vale a pena ver os créditos para um docinho de despedida.