Death on the Nile (2022)

de Pedro Ginja

O que determina uma história de crime? As teorias escritas sobre o assunto são muitas e diversas desde investigação criminal à ficção com inúmeros livros, filmes e séries sobre o assunto. Quem as iniciou e quem as popularizou são questões bem diferentes. Arriscaria afirmar que a primeira história conhecida faz parte do livro árabe As Mil e Uma Noites, com o nome de “As três Maçãs” e em que já estavam presentes alguns dos clichês das histórias de crime moderno. Temos um corpo encontrado sem vida e um prazo para resolver o mistério, o mais rápido possível. Três dias é o limite, sob pena de morte, para encontrar o assassino e a razão para o sucedido. Neste caso, a investigação não acontece e o verdadeiro assassino confessa diretamente o crime, bem longe da história de crime moderno em que a investigação é a chave e, acima disso, o investigador é a “estrela” da trama.

Sobre quem popularizou o género as dúvidas já não são tão grandes, foi Sir Arthur Conan Doyle com a criação de Sherlock Holmes, o mais famoso detetive de sempre. Mas na história da ficção do crime moderno existe ainda outro interveniente, ou melhor dizendo uma interveniente. Agatha Christie é, de longe, a escritora que vendeu mais livros, de sempre, com vendas mundiais na ordem dos 4 biliões. Deve, no entanto, a criação da suas personagens mais famosas, Hercule Poirot e Miss Marple, ao arquétipo criado por Conan Doyle sobre o investigador perfeito, sempre um passo à frente dos criminosos deste mundo e sobre o qual nada escapa.

E a Hercule Poirot (Kenneth Branagh), assim como a Sherlock Holmes, nada escapa e é sobre ele que recaí este Death on the Nile. Adaptado do romance de Agatha Christie de 1937 com o mesmo nome, esta é já a segunda adaptação deste livro depois do filme de John Guilhermin em 1978, com um elenco absolutamente espectacular (Peter Ustinov, Jane Birkin, Bette Davis, Mia Farrow, David Niven, Maggie Smith, Angela Lansbury, entre outros). A qualidade do elenco neste novo remake é inquestionável de igual modo com os atores “da moda” de 2019 – altura das filmagens – e que com os atrasos devido ao COVID apenas vê a sua estreia em 2022. A história acompanha Linnet (Gal Gadot) uma jovem e rica herdeira prestes a iniciar a sua lua-de-mel no Egito com o seu marido, Simon Doyle (Armie Hammer), após o ter “roubado” à sua melhor amiga, Jacqueline de Bellefort (Emma Mackey). Enfurecida, segue-os para o Egito juntamente com um grande e diverso grupo de amigos e familiares, estes convidados para partilhar com eles este momento feliz. Em férias, Linnet pede a Hercule Poirot (Kenneth Branagh) para os acompanhar, com receio do que possa acontecer na viagem de barco no Karnak. Alguém é assassinado a meio da viagem. Conseguirá Poirot identificar o culpado antes do barco chegar ao seu destino?

A pista, para a sequela, tinha sido deixado à vista de todos, mesmo dos menos treinados, no final do último filme. E como é bom voltar a ver o Egito numa sala de cinema! Lindíssimos cenários, localização e toda a história antiga presente nesse maravilhoso país, transporta-nos para um ambiente de mistério, intriga e um passado atribulado. É, por isso tudo, o local ideal para este Death on the Nile após o competente Murder on the Orient Express (2017) mas formatado exatamente do mesmo modo (muda de um comboio para um barco, gente!!) aumentando a sensação de déjà-vu em grande medida. Mesmo os atores parecem tirados a papel químico no papel que interpretam na narrativa e não estou a falar nos repetentes Poirot (Branagh) e Bouc (Tom Bateman) mantendo o status quo e as personagens criadas no filme anterior. A sensação de segurança é total e com ela a sempre presente maldição da previsibilidade. Mas nem tudo é culpa do filme pois os próprios livros de Agatha Christie seguem uma fórmula pré-definida da qual não se pode escapar. 

Os valores de produção e de investimento no filme são grandes e isso é visível no ecrã com um trabalho de cenário e fotografia lindíssimos, assim como uma brilhante reconstrução de época. Destaco, sem dúvida, as imagens de pôr-do-sol no Nilo que nos deixam absolutamente arrebatados valendo, só por si, o preço de admissão. Temos a destacar, nem todos de igual modo, o elenco de grande qualidade com particular apreço por Emma Mackey que tem o tal “je ne sais quoi” que encontrei em Eiffel (2021) de Martin Bourboulon, bem expresso na intensidade em que revela as suas emoções, ou em Annette Bening pelas mesmas razões mas com um refinamento na criação de uma persona fria e maternal, por vezes na mesma cena. Surpresas há algumas com Russell Brand, num calmo e, pasme-se, contido Dr.Bessner e finalmente Sophie Okonedo com tão pouco tempo no ecrã mas a deixar a sua marca, quem sabe até para uma possível sequela? O tempo o dirá.

Como o próprio Poirot afirma ele é, provavelmente, o melhor detetive do mundo e nos detalhes encontra a solução, sempre com a precisão de um relógio suíço. Não importa quem matou mas sim a maneira como Poirot resolve mais um caso. E, provavelmente, haverá uma sequela para este Death on the Nile, outra inevitabilidade da qual o mundo não conseguirá escapar, e com isso ter entretenimento garantido para mais uma tarde de domingo. 

3/5
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A Haunting in Venice (2023) - Fio Condutor 13 de Setembro, 2023 - 22:03

[…] porém, as duas primeiras inclusões – Murder on the Orient Express (2017) e Death on the Nile (2022) – são deveras fracas relativamente à narrativa, e anémicas quando se trata de […]

Ju 31 de Março, 2022 - 13:39

Arthur Conan Doyle é para mim o Master nesta onda de escrita policial. Sobre o filme. É bom para entreter o público, especialmente para aqueles que nunca leram o livro. O scenery é realmente arrebatador!

Pedro Ginja 1 de Abril, 2022 - 18:31

Sem dúvida o cenário no Egipto é magnífico e vale, por si só, o preço de entrada. Neste caso na Disney+ é sem dúvida um excelente filme de domingo à tarde. Obrigado pelo comentário.

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