Aviso: Não contém spoilers. Apenas o que está no marketing.
“Let’s f****** go!”
Então, para quem tem problemas com o formato da Marvel, para quem não acha piada nenhuma a humor rude e ordinário (mas também não percebe que é um humor aguçado), e para quem tem problemas com mercenários de aspeto horrível que desculpam tudo ao quebrar a quarta parede: este filme não é para vocês. E também vão a um médico, isso pode ser crónico.
Para a terceira entrada na franchise Deadpool, e sendo a primeira dentro do universo cinematográfico da Marvel, temos Ryan Reynolds de regresso ao papel que tanto acarinhou, com Wade Wilson a ver-se deparado com o seu mundo prestes a ser destruído e a única forma que tem de o salvar é tentar trabalhar com um regressado Wolverine, interpretado por um também regressado Hugh Jackman, que se mostra difícil e indisponível. Isto é o que vos posso dizer. Mais que isto e ainda me cortam os dedos.
Já para começar, há que dizer que a alma deste filme está na química entre estas duas estrelas. A antecipação para os ver juntos, tanto como estas personagens como de qualquer outra forma, era enorme e a verdade é que valeu a pena a espera. Reynolds continua rei e senhor do papel de Wade Wilson e Deadpool, entregando o típico humor característico do anti-herói, bem como o seu próprio. Já Jackman regressa como se tivesse deixado o papel ontem, no seu absoluto melhor, mas trazendo umas novas camadas a uma personagem que já dá corpo há quase 25 anos, conseguindo assim um Logan diferente, mas muito familiar. Apesar de apresentarem uma dinâmica de “bate-cabeça” muito característica da relação destes dois, é-lhes permitido brincar à vontade, permitindo até a Jackman refletir a energia de Reynolds com a sua própria.
Para aqueles que acompanham as críticas que escrevi sobre os recentes filmes da Marvel, sabem que um dos problemas apontados está no abuso de humor pessimamente utilizado nos seus projetos. Parece contra producente estar a elogiar um filme repleto de humor, mas a verdade é que aqui é totalmente justificado e bem feito. Parabéns a Feige e todos os executivos por não recearem o R-Rating e não se esconderem tanto do humor crude como da violência extrema. E a questão é que não só o humor é infinitamente melhor escrito e entregue, como faz sentido a sua existência, por ter o protagonista que tem e por abordar este universo da forma que o faz.
A autoconsciência que é imagem de marca de Deadpool é o ponto principal que faz deste filme a lufada de ar fresco que a Marvel precisava. Usam-no para abordar o facto da empresa megalomaníaca (aqui referindo a Disney), estar num mau momento, atacando assim várias decisões que tomaram, bem como a pouquíssima subtil ideia de que Deadpool pode vir salvar tudo. Esta autoconsciência enraíza-se em tudo, desde o enredo do filme aos cameos espalhados pelas suas duas horas de duração. Essas surpresas valem a pena, a maioria tem razão de ser na história e todas elas são satisfatórias e têm um belo piscar de olhos aos fãs. O filme assume tudo o que faz com esta abordagem, o que pode até ser uma desculpa, mas acaba por funcionar porque existe um carinho enorme pelas personagens e um amor muito parecido ao que os fãs sentem. Há carinho pela história passada, não se esquece que este é um filme do Mercenário Desbocado, por isso não ignora os dois primeiros filmes, tal como não ignora o passado de Wolverine. Quando anunciaram o regresso de Jackman, disseram que iam respeitar o final que teve em Logan (2017), e fizeram isso mesmo. Respeitaram todos estes anos da personagem, respeitaram todo o percurso da FOX com estas personagens. Bem… respeitaram mas à típica maneira do Deadpool.
Deadpool & Wolverine usa e abusa disto tudo para gozar consigo próprio e tudo o que o rodeia (e acreditem que ninguém fica imune, nem mesmo fora do universo de super-heróis), mas também utiliza estes fatores como combustível emocional, conseguindo ser sólido nesse campo e entregar peso a ambos os protagonistas, bem como noutros pontos impossíveis de revelar aqui. Se o filme é genérico? Sim. Se é cliché? Bastante. Está ainda dentro da fórmula da Marvel, com problemas de guião: é forçado em muitos pontos do enredo e tem muita exposição verbal (que tenta desculpar ao gozar com isso, mas não deixa de existir). Todas estas falhas são evidentes e daqui a uns tempos vão, muito provavelmente, ser ainda mais berrantes (o redator a olhar intensamente para Spider-Man: No Way Home (2021)). Mas é um filme que não procura ser mais do que o que é, tanto emocionalmente como no espectro completo deste universo cinematográfico. É super divertido, entretenimento puro, que consegue pôr a sala de cinema inteira a rir à gargalhada, a sorrir pelas surpresas e em silêncio nos momentos mais emotivos. Faz o seu trabalho, e isso sim desculpa os seus erros.
Com um genérico inicial criativo (como já estamos habituados), cenas de ação incrivelmente divertidas e cheias de fan service (menção especial para uma luta entre os dois protagonistas que é muito criativa) e um CGI que FINALMENTE é digno de ser apresentado no cardápio desta magnata, Deadpool & Wolverine justifica a sua existência e mostra-se um dos poucos faróis luminosos neste mar inóspito que tem sido a Marvel, juntamente com Guardians of the Galaxy: Vol 3 (2023). É uma carta de amor às personagens, aos fãs, aos anos 2000 e a toda a história que, principalmente os mutantes, passaram. É uma carta bonita, muito engraçada, que nos deixa a esperar por mais cartas destas, mas com um certo sentimento de que, se for a última coisa escrita daqueles lados, não ficamos mal servidos.
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