Cruella (2021)

de Rúben Faria

Cruella on e Cruella off

Honestamente, é difícil saber por onde começar com este filme. É muito conflituoso, pois não é propriamente mau, mas acaba por ser frustrante e até aborrecido. Devo começar por dizer que não estou muito familiarizado com este mundo da Cruella de Vil, por isso mantive expetativas neutras perante o novo live-action da Disney. Qualquer filme de uma franquia previamente estabelecida deve conseguir agradar tanto a fãs devotos como a novos espetadores e, fazendo parte dos últimos, o agrado com o produto final ficou aquém. Cruella, como experiência em si, é muito genérico. É difícil sair investido em querer saber mais sobre a protagonista ou o seu mundo, e os níveis de entretenimento são tão instáveis que chamar-lhe “umas boas duas horas” torna-se complicado. Mas vamos por partes.

Há várias razões pelas quais este filme está on e off constantemente, sendo a história e as personagens o mais evidente e o mais importante. Ao ser um blockbuster comercial de Hollywood, nunca se espera grande inovação por parte de quem o criou, mas o nível de clichê que está presente por toda a sua narrativa é quase preocupante. Há certos clichês no cinema que funcionam muito bem, mas o truque está em saber como os usar e os trabalhar numa história. Há vários filmes comerciais de qualidade que estão cheios deles, mas que de certa forma os assumem de modo autoconsciente ou então conseguem fazer algo original ou divertido. Infelizmente, não se sente isso com este filme. 

O argumento tem grande parte desta culpa: é muito desinspirado, toda a sua estrutura é muito genérica e comete o enorme erro de não se dedicar a explorar um tema. Existe alguma coisa atrás deste enredo, algumas motivações para personagens, mas é tudo tão oco, tão banal, que acabou por não ter impacto emocional. Não existe uma maior mensagem por trás de tudo, um ensinamento para os mais novos (e quem sabe para os mais velhos) tirarem desta história, algo que é muito estranho para um filme da Disney. A protagonista é alguém com quem é difícil de empatizar, tal como a maioria das personagens secundárias, pois todas elas parecem mudar de ideias ao virar da esquina. Qualquer decisão ou posição que alguma personagem tome durante o filme é facilmente revertida em pouco tempo, sem grandes motivos ou explicações, como que se alguém estivesse a ligar e desligar um interruptor ao longo da história. Os diálogos são demasiado forçados e fictícios para um filme que, em certos pontos, se leva um pouco a sério de mais. É verdade que existem alguns momentos divertidos polvilhados pelo filme e uma ou outra personagem que entretém, mas a maioria das piadas que o guião tenta contar são básicas e quase sem esforço nenhum. É um filme que, apesar de ter uma premissa extravagante, não consegue usar isso a seu favor, especialmente neste campo.

Tecnicamente também mostra muita inconsistência. Existem alguns planos e movimentos de câmara interessantes e que vão ao encontro dessa excentricidade pedida pelo enredo, mas infelizmente o filme acaba sempre por escolher assentar em técnicas visuais genéricas que já vimos em oceanos de cinema comercial. É impossível ignorar o uso excessivo de movimentos frontais da câmara e a quantidade de montagens extensas de passagem de tempo. Nunca se sente, durante o filme inteiro, que existe um momento para respirar juntamente com as personagens. Por outro lado, a direção de arte está no ponto certo: guarda-roupa interessante, cenários bem conseguidos, paleta de cores pensada a fundo e uma maquilhagem muito bem trabalhada. É, sem sombra de dúvidas, a parte que melhor reflete a extravagância necessária.

Cruella apela a todas as diretrizes de um blockbuster moderno e uma das mais evidentes é o uso da típica banda sonora de músicas licenciadas para animar o filme na tentativa de lhe dar algum carisma, mas que acabam por ser mal usadas e muitas vezes não têm nada a ver com o momento. Artistas como Bee Gees, The Doors, Queen, Blondie, The Animals, Rolling Stones e muitos outros, estão presentes nesta banda sonora e basta pensarmos um bocadinho para facilmente nos vir um filme à cabeça que tenha usado uma música destes artistas, o que já se torna cansativo e nada original, mesmo sendo um filme passado nos anos ’70.

Em nota para os atores, que com certeza se divertiram bastante a representar personagens tão peculiares e excêntricas, Emma Stone é carismática como sempre e Emma Thompson tem um certo encanto maléfico no papel da vilã. O resto do elenco é aceitável, visto que o acting geral do filme não é mau, mas duvido que alguns destes papéis sejam os melhores da carreira destes atores.

Analisando o que foi escrito até agora, pode sentir-se alguma dureza com o filme. Talvez devesse ser mais brando com uma obra que serve apenas para nos entreter, ou talvez devesse ser ainda mais duro por ser uma produtora como a Disney que tem dinheiro que se farta e, por isso, a responsabilidade de nos dar conteúdo de melhor qualidade. Qualquer que seja o correto ou errado, este filme não é horrível, de todo, mas também não são as duas horas mais divertidas que temos por aí, mesmo para um domingo à tarde. É visível a vontade de querer entrar no comboio daquilo que mais vende comercialmente, o que é compreensível por parte de uma empresa como a Disney, mas todos esperamos melhores obras desta produtora que tantas memórias nos trouxe e tantas memórias nos poderia trazer com um pouco mais de esforço. 

2.5/5
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