Nos clássicos filmes slasher, seguimos normalmente um grupo de jovens adultos isolados num espaço remoto, como um acampamento, uma cabana ou uma casa de férias. Essas personagens formam um microcosmo feito de estereótipos facilmente reconhecíveis: o atleta confiante, a rapariga sensual, o introvertido, o palhaço do grupo e a rapariga responsável (que por norma se torna a final girl). Este isolamento transforma o espaço em terreno fértil para o caos, onde a ausência de regras e de figuras de autoridade permite que as tensões e os desejos reprimidos venham ao de cima.
A violência que se segue tende a assumir uma dimensão moralista, quase punitiva, como se o vilão castigasse qualquer manifestação de prazer ou rebeldia. A crítica destes filmes cai então no conservadorismo da sociedade, espelhada no assassino moralista. A questão que o realizador Chris Nash nos coloca é: e se assumissemos a perspetiva do assassino? Nos filmes do género, o vilão surge sempre no lugar certo à hora certa, como uma força invisível que se materializa para matar. Mas o que aconteceria se o seguíssemos no intervalo entre cada morte, observando o seu deslocamento lento, o tempo morto, o tédio e a banalidade que antecedem a violência?
In a Violent Nature dá-nos as respostas. O momento em que dois jovens retiram um medalhão do seu lugar no meio da floresta torna-se o catalisador para o renascimento do assassino, determinado a matar para recuperar o que lhe pertence. A partir desse instante, a câmara posiciona-se atrás do assassino, em terceira pessoa como num videojogo, e seguimos a sua caminhada pela floresta em busca dos trastes que lhe roubaram o medalhão. Entre os sons bucólicos, apenas se ouve o ritmo pesado dos passos de Johnny (Ry Barrett), um “whomp whomp” que acompanha o seu avanço implacável.
Também os diálogos das personagens são apresentados a partir da perspetiva de Johnny, alguns na totalidade, sobretudo quando o assassino está imóvel e próximo, e outros aos autênticos solavancos que refletem a distância e o ângulo da sua observação. É através desses fragmentos que somos gradualmente introduzidos ao passado de Johnny e percebemos que esta não é a primeira vez que regressa, o que faz de In a Violent Nature uma espécie de “sequela cronológica”, inserida num ciclo contínuo de morte e renascimento. Pelo contrário, nunca chegamos a conhecer a profundidade das personagens que ele vai assassinar.
As mortes são um dos pontos mais fortes do filme: originais, macabras, excessivas e cheias de sangue. Em muitas delas, assistimos ao processo do início ao fim com a câmara imóvel, o que acentua ainda mais a brutalidade e a frieza dos assassinatos. Apesar de não serem totalmente realistas, o seu tom over the top parece deliberado, servindo para enfatizar a brutalidade e o absurdo da violência, mantendo-nos sempre em antecipação pela próxima morte.
O vilão surge como uma manifestação de vingança pela destabilização da natureza, uma reação direta à violência humana. Esta leitura é reforçada pela serenidade transmitida nas sequências em que ele vagueia pela floresta, onde o som da natureza se impõe com precisão quase hipnótica e a câmara capta a beleza calma do ambiente que o rodeia. O trabalho sonoro é impecável e a cinematografia deslumbrante, especialmente nas transições entre o dia e a noite, que sublinham a dimensão cíclica e inevitável deste equilíbrio natural que o filme procura restabelecer sobre “quem tira mais do que deve”.
A forma de In a Violent Nature é subversiva e até revolucionária dentro do género de terror, sendo considerado um ambient slasher pela sua abordagem contemplativa, marcada por longos planos de Johnny a caminhar pela floresta em silêncio, num ritmo lento e repetitivo, pela distância emocional em relação às vítimas e ausência de empatia pelo seu sofrimento, bem como pelas influências do cinema experimental e minimalista, com destaque para Gus Van Sant e Terrence Malick, que o aproximam muito mais do slow cinema e do arthouse do que do típico filme de terror convencional.
O filme também tem momentos menos bons, mas são encobertos por tanta self-awareness que é difícil considerar como falhas. Nomeadamente no último ato, que brinca totalmente com as nossas expectativas. Chega ao ponto de lembrar Funny Games (1997)na forma mórbida como nos faz querer mais violência, mas a natureza, ao contrário do homem, apenas tira o que lhe pertence. In a Violent Nature é um filme divisivo, que não vai apelar a todos mas que dificilmente deixará alguém indiferente, muito pela sua quebra de conceitos tradicionais e inovação.
