Clickbait – Minissérie (2021)

de Pedro Ginja

Vivemos num mundo digital. Cada vez mais nos domina a vida. A primeira coisa a fazer depois de acordar é ver as notificações. Todos nós visitamos, pelo menos, uma vez por dia uma das muitas redes sociais. Nos mais jovens, o tempo despendido aumenta exponencialmente. Em média, 40% dos jovens passam mais de duas horas por dia nas mesmas. É a nova forma de ganhar status, reputação. De ser alguém neste mundo. Mas também facilmente a ruína surge. Um comentário maldoso. Um boato que se forma. Um mal-entendido e de repente estamos sobre ataque. Ninguém está a salvo do poder brutal da internet, da turba pronta a julgar sem provas. Do “diz que disse”. Bring on the pitchforks!

Clickbait é uma série da Netflix que aborda esse tema. Uma crucificação em “praça pública” na maior arena de combate da atualidade: a internet.

A série acompanha a família Brewer. O pai, Nick Brewer (Adrian Grenier), é alvo de um rapto. É ameaçado de morte e acusado de maltratar e abusar de mulheres. O vídeo dos raptores mostra cartazes com frases incriminatórias e indica que ao atingir os 5 milhões de visualizações, Brewer será assassinado. Tornando-se viral, rapidamente os números aumentam. Começa uma corrida contra o tempo para o encontrar antes que o seu tempo termine e que seja executado sem julgamento. Mas esse começa mal acontece a publicação do vídeo. A dúvida instala-se no seio da família. Será Nick a pessoa que eles pensam? Terá ele uma vida secreta? Será ele um abusador de mulheres? Será Nick Brewer culpado do que o acusam?

A história acompanha a investigação da polícia e da sua família. A sua irmã, Pia (Zoe Kazan) é a sua principal defensora, e partilha com Roshan (Phoenix Raei) – o detetive que acompanha o caso – o protagonismo da série. Pia é a clássica “ovelha negra” da família: miúda irresponsável, sempre em festas e a fazer o que lhe apetece. Diz tudo o que pensa mesmo que magoe quem a ouve, só pensa no seu umbigo. Roshan é um detetive em início de carreira, que acha ter todos contra ele, pensando que a razão seja o facto de ser muçulmano. Nick é o pretty boy perfeito desejado por todos mas apenas com olhos para uma mulher – Sofie (Betty Gabriel) é o seu nome, mãe dos seus dois filhos. Um casamento de sonho daqueles em que completam as frases um do outro, partilham ideias e valores. E logo na primeira cena, existe uma discussão entre Nick e Pia. Uma grande discussão. E mesmo aqui, tudo normal: as famílias discutem, por vezes por coisas ridículas. Os clichés estão estabelecidos. Cada uma das personagens principais com o seu papel a cumprir. Mesmo o da matriarca da família, Andrea (Liz Alexander) como a avó pacificadora das brigas familiares e com um grande coração.

A série opta por centrar cada episódio numa personagem da história. Nem sempre da família Brewer. O que ao início é a família perfeita, começa, episódio a episódio, a ser desconstruída. Da perfeição à ruína. A pressão de encontrar Nick e as informações sem filtro da internet, começam a contaminar a harmonia familiar. A pôr a nu as limitações humanas de cada um dos seus membros. E não só. A verdade deixou de ter valor. Reputações criam-se ou caem com um comentário, nascem boatos e juízos de opinião. Na internet todos somos juízes e carrascos. Enganei-me? Ou enganaram-se? Era mentira? Não interessa. O comentário na internet é, ainda, livre de consequências. É alguém lá longe, nem conhecemos. Não nos afeta. E amanhã escolhe-se a nova vítima. 

Clickbait fica pelos clichés das séries modernas. Sedenta de criar um cliffhanger que transporte o espectador ou neste caso, o mantenha colado ao sofá. “Vou ver só mais um”, dizemos. Manipulado, portanto, a seguir uma mentira ou a ilusão da mesma. E senti prazer a vê-la, não há como negar. É um carrossel de emoções. A incerteza do que é verdade ou mentira a ser constantemente atualizada, retirando-lhe valor. É preciso um fim e a resolução, apesar de totalmente inesperada, não satisfaz. Remendos e pequenos flashbacks tornam esta “mentira” real. E, na minha opinião, comete um erro crasso: dedica um episódio ao inimigo. Aos jornalistas de tablóides. Uma janela aberta para o mundo de cão onde habitam, mas criando uma aura de glamour no que denunciam sem provas. Dedo acusador apontado e… evapora-se sem deixar rasto na série. O mesmo se repete com outras personagens. Todos “inocentes” portanto. Uma oportunidade perdida da série em discutir um tema real e importante. No final apenas – “Nick Brewer culpado ou Inocente?” 

“O que faço eu para inverter este novo mundo de impunidade nas redes sociais?”
vs.
“É apenas uma série. Relaxa.”


Ótimo tópico para discutir nos comentários.

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