O Queer Lisboa apresenta um extenso programa de cinema queer organizado em blocos temáticos, assim como debates e lançamento de livros, na ilha açoriana.
Queer Terceira
16 de maio a 15 de junho de 2025
Auditório do Ramo Grande
Centro Cultural e de Congressos
Recreio dos Artistas
Lar Doce Livro
Numa iniciativa financiada pela União Europeia e pela Startup Europe Regions Network, no âmbito do programa Youth 4 Outermost Regions, o Queer Lisboa foi convidado a organizar um programa de cinema queer, a ter lugar em Angra do Heroísmo e na Praia da Vitória, que se estende por três momentos nos meses de maio e junho, culminando nas datas da celebração do Azores Pride e envolvendo várias instituições culturais da ilha e agentes sociais. O primeiro momento acontece de 16 a 18 de maio no Auditório do Ramo Grande na Praia da Vitória; o segundo, no Centro Cultural e de Congressos de Angra do Heroísmo e na Recreio dos Artistas, de 30 de maio a 1 de junho; e o terceiro e último momento tem lugar de 13 a 15 de junho, na Recreio dos Artistas e na livraria Lar Doce Livro, também em Angra. Todas as sessões e atividades do programa são de entrada gratuita.

Pedágio, de Carolina Markowicz
O programa, todo falado em língua portuguesa e composto de 14 filmes, entre longas e curtas-metragens, documentais e de ficção, de produção portuguesa e brasileira, foi construído segundo a lógica de momentos temáticos, que procuram ir ao encontro de um conjunto de temas pertinentes no panorama político e social atual e do seu impacte nas pessoas e comunidades queer. Com um foco especial na juventude e nas suas problemáticas específicas, o Queer Terceira, evento idealizado e produzido por João Pedro Costa, designer de comunicação e agente cultural terceirense, acontece no contexto de um projeto de itinerância e descentralização que o Festival de Cinema Queer Lisboa tem desenvolvido desde 2021, procurando levar alguns dos títulos mais recentes e relevantes do cinema queer a locais de Portugal Continental e ilhas onde o acesso a este mesmo cinema, em sala, é ainda muito restrito, promovendo-se assim a experiência do cinema e o espírito de comunidade nessa partilha.
1º momento – 16 a 18 de maio, Auditório do Ramo Grande, Praia da Vitória
Tema: juventude, religião e família
Lugar de descoberta e riscos, mas também de dúvidas e angústias, a adolescência e entrada na idade adulta são momentos centrais na construção das nossas identidades, de perceber quem somos. Em parte construção solitária, este salto para o mundo depende também da nossa relação com o outro, das redes de afeto e de cuidado. As nossas identidades são resultado desses confrontos, do abraçar referências e criar heróis, mas também dos medos e dos embates com o que nos é hostil. Neste primeiro momento do programa, é proposto um olhar sobre a nossa relação individual com esses lugares de pertença e de crescimento – o bairro e a escola, a família e a religião -, e da não rara necessidade de rompimento com esses lugares, para construir aqueles outros, onde somos mais seguros e mais felizes: as nossas comunidades tornadas família alternativa. Três filmes ajudam nesta reflexão. Lobo e Cão, de Claúdia Varejão, rodado em São Miguel, onde a esta procura de comunidade se alia a questão da periferia, num duplo esforço de pertença; Pedágio, de Carolina Markowicz, que foca na família e religião e no muito pertinente assunto das terapias de conversão; e Intransitivo: um Documentário sobre Narrativas Trans, assinado pelo coletivo Intransitivo, um fazer cinema a partir da ideia de pertença e de dar voz a uma polifonia marginalizada que tanto tem para dizer e ensinar.

Lobo e Cão, de Claúdia Varejão
2º momento – 30 de maio a 1 de junho, Centro Cultural e de Congressos e Recreio dos Artistas, Angra do Heroísmo
Tema: saúde sexual e saúde mental nas pessoas queer
Não só no cinema, mas também no teatro, na performance, na literatura ou nas artes plásticas, a epidemia da sida faz com que, a partir da década de 80, seja repensado o papel do corpo na arte, particularmente na cultura queer. A epidemia e a nova relação com a morte que ela transporta, trouxeram à luz novas preocupações com as questões da memória, enquanto preservação de um passado e legado de uma cultura. É sobre essa memória que Joaquim Pinto fala no seu documentário autobiográfico E Agora? Lembra-me, preenchendo magistralmente uma enorme lacuna no cinema português, que historicamente sempre receou abordar tais temáticas. E se a epidemia da sida abriu caminho para uma maior atenção para que se falasse de saúde sexual nas pessoas queer, também a saúde mental tem merecido especial atenção, em particular nos anos mais recentes. Ficção brasileira, assinada por Flávio Botelho, A Metade de Nós é de uma sensibilidade rara na abordagem desta temática. É um filme sobre a saúde mental e o limite, e sobre aqueles que a experimentam enquanto observadores carregados de afeto e desespero. E no contexto destas duas exibições a terem lugar no Centro Cultural e de Congressos de Angra do Heroísmo, a seguir à projeção do A Metade de Nós, tem lugar um debate com a presença da psiquiatra e sexóloga clínica, Mariana Bettencourt, do Hospital da Horta e Hospital do Divino Espírito Santo, de Ponta Delgada, e de Vanessa Barcelos, especialista em Medicina Interna, com pós-graduação em VIH/sida, com moderação de Constança Carvalho Homem, programadora do Queer Lisboa.

E Agora? Lembra-me, de Joaquim Pinto
Ainda neste 2º momento do Queer Terceira, em sessão especial em parceria com a companhia Cães do Mar, a ter lugar na Recreio dos Artistas, é apresentado O Carnaval é um Palco, a Ilha uma Festa, de Rui Mourão. Apresentado uma única vez na Ilha Terceira, enquanto vídeo-instalação, no Museu de Angra do Heroísmo, em 2012, existe agora a oportunidade para ver (ou rever), na sua versão de ecrã duplo para sala de cinema, este documentário do artista visual Rui Mourão que propõe um olhar às Danças de Carnaval da Terceira sob o prisma das questões de identidade sexual e de género.
3º momento – 13 a 15 de junho, Recreio dos Artistas e Lar Doce Livro, Angra do Heroísmo
Tema: ativismo e vozes queer
A eclosão a nível internacional de um chamado cinema queer, que se autoafirma deste modo a partir da década de 80, não foi acompanhado pelo cinema nacional onde, durante largos anos, foi fraca a expressão na representação queer no cinema, com a exceção do cinema de Joaquim Pinto ou João Pedro Rodrigues, e de alguns exemplos de cariz mais comercial, no cinema e na televisão. Faltavam vozes queer, na primeira pessoa, a contar as suas histórias e aquelas outras que lhes importavam. Faltavam as pessoas queer, em todo o seu enorme espectro identitário e vivencial, à frente e atrás das câmaras, e afirmando-se enquanto tal. Colmatando esses largos anos de sub-representação, o nosso cinema foi progressivamente habitado por uma polifonia de vozes queer, carregadas de urgência, ávidas em recuperar o tempo perdido, focadas em dar a ver as suas histórias, sem esquecer os nossos passados, nem em imaginar utopias de futuro. Este momento final do programa, em parceria com o Cineclube da Ilha Terceira, é o palco desta diversidade. A par do documentário As Fado Bicha, que nos dá a conhecer um dos projetos mais relevantes do panorama musical e do ativismo queer atuais, este fim-de-semana é dedicado a um conjunto de curtas-metragens recentes dessas outras vozes de Paula Tomás Marques, Ary Zara, Sérgio Galvão Roxo, Joana de Sousa, Ricardo Branco, André Godinho, e David Pinheiro Vicente, realizador natural da Ilha Terceira.

As Fado Bicha, de Justine Lemahieu
Nos últimos meses assistimos à edição de um conjunto de livros que nos ajudam a traçar uma muito necessária história da cultura queer em Portugal e que evocam vidas, umas mais mediáticas, outras mais anónimas, que além de referências, são motivo de reflexão sobre o passado, presente e futuro das nossas comunidades. Para nos ajudar nesta reflexão, um debate na livraria Lar Doce Livro, com a presença de Jó Bernardo, proprietária da Esquina Cor de Rosa, a primeira livraria LGBTQI+ a abrir portas em Lisboa, e que este ano editou “Quem?”, autobiografia de Rute Bianca; António Fernando Cascais, docente na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e autor de inúmeras publicações desde os anos 90, e que recentemente lançou as obras “Estar Além – A Persona Queer de António Variações”, “Masculinidades debaixo de fogo: Homossocialidade e homossexualidade na guerra colonial” e “Dissidências e Resistências Homossexuais no Século XX Português”; e Isabel Rodrigues, vice-presidente da direção da associação Amplos e uma das autoras de “Dar e Receber Amor em Todas as Suas Formas”. O debate é moderado por João Ferreira, diretor artístico do Queer Lisboa.
Consulta o programa completo em queerlisboa.pt