Festa do Cinema Francês apresenta retrospectiva integral de Chris Marker na Cinemateca Portuguesa durante novembro e dezembro. Só no Cinema São Jorge, em Lisboa, a 25ª edição da Festa recebeu mais de 12.400 espectadores, o que representa um crescimento de 14%.
A Festa do Cinema Francês, cuja 25ª edição começou no dia 3 de outubro de 2024, recebeu no Cinema São Jorge, em Lisboa, mais de 12.431 espectadores, o que representa um crescimento de 14% de público em relação à edição do ano passado. A Festa, que está neste momento a decorrer no Porto, mas cuja programação já esteve em municípios como Coimbra, Oeiras, Almada, Setúbal, Leiria, S. Bartolomeu de Messines ou Faro, vai durante os meses de novembro e dezembro apresentar, em parceria com a Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema, a retrospectiva integral do cineasta Chris Marker num ciclo intitulado “A Memória das Imagens”.
Cineasta, fotógrafo, escritor, viajante e escritor, Chris Marker (1921-2012) criou, ao longo de seis décadas, uma obra multifacetada que atravessou vários campos, sem se fixar. No cinema, desenvolveu um trabalho de forte pendor ensaístico, inspirado por iluminados comentários de sua autoria, que contribuiu decisivamente para a renovação do documentário e tem influenciado sucessivas gerações. Viajante incessante, tal vertente materializou-se num cinema que atravessou mundo, que Marker concebeu individualmente, ou no contexto dos vários coletivos que integrou, mas também na autoria de uma coleção de guias de viagem, a que deu o nome de Petite Planète.
Entre os primeiros filmes que realizou, encontramos LES STATUES MEURENT AUSSI (1953), o resultado de uma frutuosa colaboração com Alain Resnais que, envolvendo uma crítica explícita ao colonialismo, foi censurado durante onze anos. Este sucedeu cronologicamente a OLYMPIA 52, a obra de estreia de Marker, que posteriormente a menosprezou e votou a um certo esquecimento. Voltaria a trabalhar novamente com Resnais em 1956, ao co-assinar a narração de TOUTE LA MÉMOIRE DU MONDE, documentário sobre a Biblioteca Nacional Francesa, que também será exibido neste programa. DIMANCHE À PÈKIN (1956) e LETTRE DE SIBÈRIE (1957) são as primeiras grandes obras que realizou a solo. Marker publicou o “comentário” destes e de outros filmes num par de livros cujo título é precisamente Commentaires, o que traduz como o seu cinema assenta de modo único na articulação das palavras e das imagens, sejam estas filmadas por si ou recicladas a partir de arquivos de origem diversa, que confluem em ensaios fílmicos atravessados por uma forte subjetividade.
LA JETÉE (1962), composto quase exclusivamente por imagens fotográficas, e uma das suas raras ficções, marcará definitivamente uma obra em que se manifesta a importância do tempo e da memória, na sua articulação com a História. Pouco depois, Marker realizou LE JOLI MAI (1963), crónica parisiense e um marco do cinema direto, sucedendo-lhe LE MYSTÈRE KOUMIKO (1965), filmado já no Japão, um país que terá um papel determinante na sua vida e obra, e SI J’AVAIS QUATRE DROMADAIRES (1966), que nos conduz numa volta ao mundo através de um conjunto de fotografias.
É com À BIENTÔT, J’ESPÈRE (1968) e LA SIXIÈME FACE DU PENTAGONE (1967) que se inaugura a vertente mais militante da obra do cineasta, que culmina em LE FOND DE L’AIR EST ROUGE (1977), um fresco sobre os movimentos revolucionários da década que o precedem, que exibiremos já em dezembro. Neste período, Marker esteve na origem de vários coletivos como a SLON ou os Grupos Medvedkine, movimentos operários que documentarão a sua própria luta em filmes como CLASSE DE LUTTE (1969). Juntando-se a Joris Ivens, William Klein, Claude Lelouch ou Jean-Luc Godard, participou ainda em LOIN DU VIETNAM (1967), e foi o autor de vários CINÉTRACTS (1968), curtíssimos filmes anónimos sobre os protestos estudantis de Maio de 1968, em França. São ainda desses anos LA BATAILLE DES DIX MILLIONS (1970), que assinalou um regresso a Cuba, ou vários episódios da série On Vous Parle (1969-1973). Prolongando a vertente mais explicitamente política da sua obra, a última sessão desta primeira parte do programa aponta para a profunda relação do cineasta com alguns dos seus grandes cúmplices, como Simone Signoret e Yves Montand, a quem dedica LA SOLITUDE DU CHANTEUR DE FOND (1974).
SANS SOLEIL (1982), que volta a ser mostrado em dezembro, representa simultaneamente o culminar de uma primeira fase da obra de Marker, mas também o início de uma outra, marcada por um maior impressionismo, que coincide com a realização de muitas obras em vídeo, algumas de curtíssima duração, e com incursões por novos meios. É deste período o CD-Rom a que deu o título de Immemory (1998), que nos permite viajar pelo universo criativo de Marker e pelas suas muitas obsessões. Nele, o protagonismo cabe a Guillaume, o gato que tantas vezes o substituiu, preenchendo o espaço criado pela sua voluntária invisibilidade. É assim entre mais de meia centena de curtas e longas-metragens, incluindo títulos realizados para televisão, que se desenha este ambicioso programa, que se prolonga em dezembro.
No dia 7 de dezembro haverá ainda uma conferência com o Bernard Eisenschitz.
Conhece a programação completa AQUI.