It’s Alive! It’s Alive!
O fim-de-semana inicia na Comic Con Portugal com um ambiente arrebitado, em relação aos dias anteriores, e uma maior dificuldade em estabelecer distância entre o público. Os cuidados aumentam para manter o Altice Arena como um local seguro e a sua organização aperta na proteção, perante uma audiência, que aumenta consideravelmente. A atmosfera semi-infantil de Sexta-Feira, é substituída por uma complexidade de construção de cosplays avistados que destacam a alma deste evento.
Pela manhã, os ensaios da Lisbon Film Orchestra são suficiente para atrair uma concentrada atenção e revitalizar a convenção. Os temas musicais ultrapassam paredes, sendo presenciados até em diferentes níveis do recinto, distanciados do Golden Theatre, onde sucedeu o concerto Hollywood in Concert, apoiado pelo Canal Hollywood. Intensamente emocional, esta experiência rompe a escala e estabelece um novo parâmetro de qualidade a atingir, transportando a audiência pelas bandas sonoras icónicas do cinema, numa aventura profundamente comovente e impressionante, repleta de paixão sentida na orquestra inteira. É o pico da felicidade que recorda o amor que sentimos pela sétima arte, atingindo momentos marcadamente tocantes, inevitavelmente acompanhados por lágrimas a escorrer pela máscara. Na sua conclusão, a vontade estava em permanecer neste espaço musical até a noite chegar, pressionando as restantes atividades a superar esta atuação ou, simplesmente, persistir com idêntica afeção.
Dentro do Prime Theatre (finalmente aberto à imprensa) ocorreu o Painel “O Humor é Cringe?” com André Martins, Cristiano Rodrigues e LiliOnScreen, que exploraram a relação entre comédia e o constrangimento, numa conversa acerca do significado de cringe, o desconforto na piada e a essência da criação de humor, conforme o seu formato (stand up, sketch ou Youtube). A discussão surpreende pela naturalidade e conforto entre os três convidados que dialogam sobre as suas experiências, visões e pensamentos, evitando os clichês comuns destes cenários e, ocasionalmente, recriando momentos de humor divertidos e, ironicamente, também cringe.
Entretanto, o coração nerd pulsava musicalmente no peito da press, enquanto esta aguardava a presença do elenco da série da RTP1, Pôr do Sol (2021-), demonstrando o seu deleite pelo que está prestes a ser classificada como “A conferência de imprensa mais caótica de sempre, na Comic Con”. Uma afirmação expressa com convicção, entre gargalhadas, num dos momentos mais agradáveis e charmosos deste Sábado. Recebidos com a imprensa a cantar o genérico da série, o elenco aclima-se, apropriadamente, com tranquilidade neste espaço amigável, semelhante a uma noite de Natal, entre familiares. Durante a conferência de imprensa, a equipa revelou as suas reações ao sucesso inesperado desta paródia, os seus maiores desafios durante as filmagens, o esforço em encontrar o tom exato e essencial para a história funcionar e o processo de desenvolvimento da segunda temporada, que ainda permanece numa fase inicial, de exploração de conceitos. Este instante representou o poder positivo da comunidade geek, através da sua paixão por este meio e a robusta ligação entre artistas responsáveis por estas narrativas com a sua audiência. O elenco surge, mais tarde, no Golden Theatre, com similar entusiasmo.
Caminhar pela Artists’ Alley implica, nesta data, uma longa dança entre corpos em movimento. Ao percorrer o fim-de-semana, por este círculo, persiste uma dificuldade em pesquisar estas obras handmade, num ambiente caótico que se revela positivo, principalmente por evidenciar a existência de apoio a criadores independentes. No entanto, permanece uma decisão estranha de colocar estes artistas distantes do espaço com maior adesão, e das lojas populares.
Apesar da notável euforia deste dia contagiar-se entre o público da CCPT21, as consequências de criar um evento desta dimensão durante uma pandemia e da desnivelada partilha de horários entre diferentes secções, são sentidas durante o Painel da série Netflix, Glória (2021). O elenco e equipa técnica partilharam vídeos fascinantes das filmagens que comprovaram que o talento nacional existe, apenas está à espera do valor financeiro que merece. Uma conversa cativante sobre o lugar da história Portuguesa no cinema e na televisão, os desafios da criação de narrativas lusitanas com níveis de produção superiores e as adversidades de marketing que colocam o futuro artístico dependente de “word of mouth“. Uma das questões colocadas por um membro da plateia, refere a atual carência de atenção em relação a produções nacionais; as respostas do elenco são afogadas pelos gritos dos fãs de Noah Schnapp, que irrompem do outro lado da arena e a aderência neste painel, serve como uma natural conclusão à pergunta.
Sábado, a CCPT21 termina com a exibição da extraordinária curta-metragem de Filipe Melo, O Lobo Solitário (2021), seguido por uma Q&A com o realizador e os protagonistas; e com uma última visita à Área Cosplay, para testemunhar o criativo concurso Dio Walking Contest, onde os participantes procuram replicar os maneirismos exagerados e peculiares da caminhada, estilo passerelle, de um dos principais vilões do anime Jojo’s Bizarre Adventures (2012-).
Ao anoitecer, recorda-se um dia que superou as expetativas dececionantes de Sexta-Feira e que demonstrou uma movimentação carregada de energia, com espaços organizados e um programa diversificado, jovial e envolvente. Os recintos e as atividades exigem uma participação superior e um equilíbrio de audiências essencial na construção dos horários e dos espetáculos como alternativa para evitar salas maioritariamente vazias, ainda assim, nesta tarde, sentiu-se o espírito nerd ressuscitado pela totalidade do Altice Arena e vivenciou-se uma verdadeira Comic Con.