“As above, so below. As I believe the world to be, so it is.”
As Catacumbas de Paris, um ossuário subterrâneo com uma extensão de 400 quilómetros, não só são a casa para os ossos de mais de seis milhões de pessoas, como o cenário de As Above, So Below, do realizador por detrás de Quarantine (2008) e The Poughkeepsie Tapes (2007). John Erick Dowdle cria um filme com uma energia meio Indiana Jones e Lara Croft mas making it a horror, sendo este o primeiro filme a ter permissão do governo francês para gravar na chamada “La Zone Interdite” das catacumbas, ou seja, os 300 quilómetros de túneis que não estão abertos para visitas por serem demasiado escuros, estreitos, se poderem desmoronar, e pela facilidade em qualquer um se perder lá dentro.
As Above, So Below segue Scarlet (Perdita Weeks), uma arqueóloga extremamente inteligente em busca da Pedra Filosofal, que se acredita trazer riqueza infinita e uma vida eterna, que embarca nesta jornada com a ajuda do seu “mais que amigo” George (Ben Feldman), também entendido na área, o seu cameraman Benji (Edwin Hodge), e um chamado cataphile (ou seja, alguém que visita ilegalmente as Catacumbas de Paris) Papillon (Francois Civil). Juntos com os amigos de Papillon, Souxie e Zed (Marion Lambert e Ali Marhyaro), o grupo explora o ossuário francês à procura do tesouro escondido enquanto, agora entrando na parte sobrenatural “da coisa”, cada um é obrigado a enfrentar de alguma forma algo do seu passado de modo a seguir em frente, inevitavelmente deparando-se com o que poderão ou não ser as portas para o Inferno.
Apesar de ter sido gravado nas Catacumbas de Paris e ainda se mostrar como uma belíssima adaptação dos Nove Círculos do Inferno descritos em Inferno, a primeira parte do poema La Divina Commedia (1304 – 1321), de Dante Alighieri, é mesmo assim um filme surpreendentemente negligenciado de um modo geral pelo público e críticos, possivelmente pelo estereótipo de que filmes de terror found footage não são de grande qualidade. Para mim, e para a minoria, a fórmula deste género do terror concebida em As Above, So Below resulta extremamente bem tendo em conta o low budget e a absurdez do enredo. O filme destaca-se nos elementos de terror, pois não só toca em todos os pontos cruciais que fazem um bom found footage, mas sente-se uma forte ansiedade claustrofóbica induzida pelos túneis, além de não se debruçar em jumpscares pobres, mas sim criar uma atmosfera obscura e dar mais atenção a determinadas cenas que estão tão bem concebidas que inevitavelmente permanecem com uma pessoa, desde a parte do gore até à parte mais psicológica.
Além disso, As Above, So Below não é somente mais um cliché de terror com personagens ignorantes que cometem decisões terríveis constantemente e querem explorar sítios perigosos apenas porque é engraçado, mas sim com exploradores que de facto percebem o que estão a fazer e têm todo um propósito, sendo evidente que Scarlet (Perdita Weeks) não se preocupa com materialismos e sim em descobrir a verdade.
É ainda interessante e fascinante a atenção dada em elaborar o significado de “As Above, So Below” que consiste numa paráfrase moderna do segundo verso da Tábua de Esmeralda, um texto escrito por Hermes Trismegisto que deu origem à Alquimia, uma área de estudo com particular relevância neste filme. A sua conclusão está ligada a esta face espiritual da narrativa e faz bastante sentido no contexto, deixando o espectador a pensar efetivamente no significado desta ideologia. “This is As Above, So Below. That phrase is believed to be the key to all magic. It means that what is within me is outside of me. As it is on earth, so it is in heaven”.
Embora entenda que existam loopholes no filme, não creio que seja algo que comprometa a qualidade e coerência da história. As Above, So Below funciona e traz um take diferente e original em comparação a muitos filmes de terror que seguem sempre a mesma receita e ainda assim recebem mais reconhecimento e apreciação do que deviam. Enquanto audiência e apreciadores de filmes e de arte no geral, talvez seria interessante começarmos a aprofundarmo-nos mais na essência e escuridão por detrás das obras e tentar compreender o que não se vê logo à primeira vista.