All Quiet on the Western Front (2022)

de Guilherme Teixeira

Baseado no livro homónimo de 1929 escrito por Erich Maria Remarque, All Quiet on the Western Front foi realizado por Edward Berger e conta a história de Paul Bäumer (Felix Kammerer), um jovem de 17 anos que em 1917, aliciado por um discurso nacionalista, decide juntar-se ao exército alemão num dos momentos mais críticos da guerra para o seu país. O entusiasmo inicial rapidamente se torna num pesadelo quando Paul começa a testemunhar os horrores da guerra.

Sente-se um certo arrepio na espinha sempre que algum estúdio pensa em fazer um remake de um clássico, principalmente de uma obra tão icónica como a versão de 1930 deste mesmo título. E tenho a dizer que um crime contra a sétima arte foi cometido. Não se preocupem. O crime cometido nada tem a ver com a qualidade do filme. Aliás, até tem e acaba por ser o problema central, pois esta bela obra de arte teve lançamento limitado nos cinemas a um nível mundial e em Portugal foi distribuído somente para o serviço de streaming da Netflix, o que significa que não existe oportunidade de ver uma das melhores fotografias do ano nas grandes telas.

Esta nova versão destaca-se não só pelos óbvios aprimoramentos técnicos, mas também pela sua decisão de explorar a fundo os horrores da guerra das trincheiras, tentando conciliar esta com o drama do armistício. Em certos momentos esta escolha parece não encaixar muito bem, mas eventualmente percebemos que é uma questão de “Primeiro estranha-se. Depois, entranha-se”. Até existe uma cena do armistício que acaba por servir como uma espécie de foreshadowing para aquilo que aconteceria uns anos mais tarde, resultantes em parte do sentimento gerado pelas concessões a que a Alemanha foi submetida nos acordos de rendição. Apesar de parecer haver uma resistência em interiorizar esta narrativa, o filme acaba por convencer e justificar, de forma bastante eficaz, todo o processo na personagem de Matthias Erzberger (Daniel Brühl) que espelhou de forma crua a vontade do povo alemão naquele ponto da guerra.

A narrativa principal, focada primordialmente no dia-a-dia nas trincheiras, é um prato cheio para qualquer amante de uma boa história. Caos é o mote. O filme discute o valor da vida não só de uma forma literal, através da discussão entre as camadas hierárquicas superiores, como também de uma forma mais subtil, porém óbvia, uma vez que se trata do foco da narrativa, através da experiência do protagonista na guerra, das suas feridas corporais, mas acima de tudo das suas feridas mentais.

O realizador não demonstra qualquer piedade pelo público ao construir personagens secundários extremamente cativantes, o que faz com que a audiência tenha uma maior noção da dor do protagonista, intensificando lentamente a nossa imersão na história. Necessário felicitar Felix Kammerer pela sua interpretação de um protagonista que, apesar de não ser o mais dinâmico, consegue passar toda aquela energia e vivacidade que o seu personagem foi perdendo durante a guerra, culminando num final emocionante.

O trabalho de fotografia e de som estão impecáveis e é lindo ver como ambos conseguem casar com a narrativa para criar momentos de verdadeiro terror, tanto nas cenas mais caóticas como também nos instantes aparentemente mais calmos. Não admira que este filme tenha sido o escolhido para ser o representante alemão nos prémios da academia. Atualmente, ainda faltam algumas grandes estreias, mas se existe alguma justiça neste mundo esta longa-metragem deverá arrecadar algumas nomeações importantes e quiçá não sairá de mãos a abanar.  

All Quiet on the Western Front é um verdadeiro esforço de humanidade. Uma obra antiguerra que explora da forma mais crua os horrores que se passaram nas trincheiras e os sonhos que lá foram perdidos por alguns metros de terreno devido a meros caprichos de pessoas orgulhosas que viveram a guerra no conforto dos seus lares. É irónico o filme ter estreado num ano em que mais uma vez a guerra chegou à Europa. É questionável o poder que a arte realmente tem para mudar a mentalidade das pessoas, mas seria interessante ver o que iria acontecer se este filme chegasse ao outro lado da fronteira ucraniana.

5/5
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