Filme integrado na programação da 11ª edição do Olhares do Mediterrâneo – Women’s Film Festival na secção “Olhares da Palestina”. A sessão terá lugar dia 7 de Novembro, quinta-feira, às 21h30 na Cinemateca Portuguesa.
Indicado pela Jordânia como o seu representante ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, em 2017, 3000 Nights (3000 Layla), da cineasta palestiniana Mai Masri, oferece um vislumbre sensível e marcante da resiliência feminina, contextualizada no longo conflito israelo-palestino.
Layal (Maisa Abd Elhadi), uma jovem professora palestiniana, está prestes a partir para o Canadá com o seu marido, com o intuito de começar uma nova vida, quando é falsamente acusada de ajudar um terrorista. Após recusar-se a incriminar o suspeito, a fim de garantir a sua própria liberdade, Layal é sentenciada a oito anos numa prisão militar israelita. Pouco depois, a jovem descobre que está grávida e vê-se forçada a dar à luz e criar o seu filho dentro das implacáveis paredes desta prisão. Assim, de uma indiferença inicial à causa palestiniana, a história de Layal revela-se politicamente consciente, seguindo a sua luta interna, na qual as crenças políticas e o seu papel de mãe por vezes chocam.
Num ambiente caracterizado pela brutalidade e discriminação, Layal encontra uma inesperada rede de apoio e resistência entre as suas companheiras, que empreendem uma incessante luta pela sua dignidade e identidade, num meio repressor. Assim, é traçado um retrato poderoso e profundamente humano da resiliência face às adversidades, ao expor a realidade dos conflitos entre prisioneiros e a pressão das autoridades em cooperarem com o regime.
3000 Nights é uma narrativa envolvente sobre altruísmo e sacrifício, que ressoa com o poderoso tema da liberdade. A realizadora e argumentista Masri mobilizou relatos de eventos vivenciados por prisioneiras, de forma a desenvolver um guião que explora num registo realista, tanto a opressão como a força; a solidariedade e a esperança que emergem em contextos extremos, como este em que a injustiça gera hostilidade e a hostilidade gera violência. As reclusas palestinianas – muitas vezes tratadas injustamente como meras extensões de um conflito maior – convivem diariamente com prisioneiras israelenses, criando uma tensão que expõe a crueldade do sistema. Masri aborda essas complexidades com uma sensibilidade que foge de qualquer simplificação, permitindo que cada personagem (mesmo os evidentes antagonistas) tenha a sua própria narrativa e desenvolvimento.
A cinematografia é notável, não obstante o seu modesto orçamento. Os planos, cuidadosamente capturados, conseguem refletir o sentimento de claustrofobia da prisão e a tristeza que permeiam a vida das prisioneiras, ainda que com algumas visíveis limitações de produção. Adicionalmente, a luz e a sombra são por diferentes vezes usadas para refletir o estado emocional das personagens, bem como a passagem do tempo. Através da protagonista, é ainda abordado o significado da maternidade, do amor e da traição neste contexto, destacando a imaginação, a criatividade e a solidariedade entre as prisioneiras – elementos que as fortalecem na luta diária pela sobrevivência. A prisão surge também como uma metáfora poderosa da condição do povo palestino, especialmente das mulheres.
Embora o filme de Masri seja bem-sucedido em contar sua história sem recorrer a um tom excessivamente emocional, poderia ter ocasionalmente beneficiado de mais sensibilidade e de um comentário social mais profundo – características destacadas nos seus documentários anteriores. Contudo, consegue ser uma narrativa tocante e reflexiva, com uma história difícil, mas infelizmente comum em tempos de guerra.
3000 Nights é uma narrativa sobre a resiliência silenciosa e as mulheres forçadas a reinventarem-se e a resistirem num meio que visa silenciá-las, exclusivamente. É assim um testemunho da obstinação palestiniana na preservação da sua história, mesmo sob condições de opressão inimagináveis. É uma obra que merece ser vista e revisitada, não apenas pela sua narrativa poderosa, mas também pela importância de se dar voz a histórias frequentemente ignoradas e esquecidas.